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Contratempos de infância e morte

Rosana Kohl Bines

Resumo


O ensaio investiga conexões temporais entre as ações de traduzir e esconder, a partir das considerações de Maria Filomena Molder sobre dois textos de Walter Benjamin: "A tarefa do tradutor" e "Criança Escondida". Discute-se a temporalidade contrapontística do jogo mimético, que envolve tradutor e criança escondida. Assim como a criança atrás da porta busca adotar as propriedades do esconderijo, permanecendo ereta como um sólido inanimado para não ser descoberta, o tradutor se alojaria no texto a traduzir, incorporando as propriedades da  língua estrangeira na língua própria. Este intercâmbio produziria  uma dinâmica temporal intermitente, em que as formas são e deixam de ser, num vai-e-vem entre a afirmação e a negação da vida. Explora-se esta hipótese na leitura de Song for Night (2007) do escritor nigeriano Chris Abani. A novela confecciona uma voz infantil liminar, oscilando entre vida e morte, para contar experiências-limite de vulnerabilidade à violência. Narrada por um menino-soldado escondido na floresta, que tem suas cordas vocais arrancadas na guerra, a obra é o monólogo interior de um narrador emudecido que se comunica com o exterior por língua de sinais. O livro é escrito em inglês, mas a história simula desenrolar-se num dialeto africano inacessível. A tradução se torna assim imperativa, atuando como princípio construtivo da obra, operador de leitura e dispositivo temporal. Além de marcar o ritmo da experiência oscilante do narrador entre ser e não ser mais, produz demora e dificulta a entrada do leitor na obra, estimulando simultaneamente uma atenção crítica aos seus procedimentos e efeitos. 


Palavras-chave


tradução; infância; morte

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DOI: http://dx.doi.org/10.5380/rel.v95i0.48719