Uniformização, coletivização e estruturação processual da tutela da saúde sob o enfoque da análise econômica do direito
DOI:
https://doi.org/10.5380/rfdufpr.v65i3.69142Palavras-chave:
Saúde pública. Acesso à justiça. Ações coletivas. Processo estrutural. Análise econômica do Direito.Resumo
O objetivo geral deste artigo é demonstrar que os processos adjudicatórios de conflitos relativos à prestação de políticas públicas de saúde devem ser norteados pela racionalização e equidade da proteção dos direitos fundamentais. Para fundamentar essa posição, parte-se metodologicamente da análise de precedentes vinculantes dos tribunais superiores a respeito dos critérios a serem observados por ocasião de julgamentos envolvendo pretensões de tutela da saúde. Sustenta-se que o sistema de justiça não pode prescindir da utilização de técnicas de uniformização, coletivização e estruturação procedimental, sem as quais o modelo de admissão de demandas individuais – que impulsiona fortemente o fenômeno da “judicialização da saúde” – resulta numa espécie de apropriação privada da política pública. Valendo-se de revisão bibliográfica pautada na escola da análise econômica do Direito, objetiva-se especificamente indagar até que ponto seria desejável ou viável a adoção de racionalidades econômicas no campo da tutela jurisdicional dos direitos fundamentais, bem como se isso poderia de fato implicar uma maior eficiência a um menor custo para o sistema de saúde. Em seguida, expõe-se como resultado que, paradoxalmente, a tolerância ou o incentivo ao ajuizamento de ações individuais em matéria de saúde pública contraria princípios constitucionais que lhe são inerentes, relativos à universalidade, isonomia e preventividade. Por fim, a partir de pesquisa aplicada, propõe-se que as ações individuais pelas quais se persegue a implementação de políticas públicas sejam coletivizadas, no intuito de possível irradiação de eficácia erga omnes da tutela jurisdicional, em benefício de todos.
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