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Criminologia midiática e a campanha “Crack, nem pensar”: refletindo sobre a falta de pensamento

Guilherme Michelotto Böes, Augusto Jobim do Amaral

Resumo


Qualquer abordagem criminológica que pretenda refletir sobre a mídia deve ter, entre as suas preocupações centrais, os processos que capitalizam tais meios mediante as imagens que propagam na elaboração das suas construções sociais. Neste aspecto, talvez o campo da política criminal de drogas seja um dos mais privilegiados, em especial desde a análise da montagem das figuras associadas aos usuários de certas drogas tornadas ilícitas, bem como em relação aos mecanismos de controle seletivo que neles recaem. Para tanto, nesta linha, buscamos compreender a campanha chamada “Crack, nem pensar”, veiculada pelo Grupo RBS em 2009, como representante da enorme força simbólica e do impacto que tais plataformas podem trazer diante das demandas proibicionistas. Apresentando os desdobramentos desta dinâmica publicitária, constatam-se os efeitos de exclusão social e demonização de determinados grupos sociais dispostos como alvos da peça, numa franca cruzada moral de guerra às drogas, a despeito dos estudos científicos mais apurados sobre a falência de tal política.


Palavras-chave


Criminologia. Política criminal. Drogas. Mídia.

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DOI: http://dx.doi.org/10.5380/rfdufpr.v64i1.62382