EUGENIA E A BIOPOLÍTICA DO PRESTÍGIO: REDES LUSO-BRASILEIRAS (1918–1930)

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DOI:

https://doi.org/10.5380/nep.v11i2.101370

Resumo

Este artigo examina a rede luso-brasileira de eugenia entre 1918 e 1930, tomando como eixo as cartas, os impressos e os congressos que ligaram Renato Kehl e António Mendes Correia. Argumenta-se que tais intercâmbios não se limitam à circulação de ideias, mas constituíram tecnologias simbólicas de consagração, onde prestígio e autoridade funcionaram como capital científico. As cartas revelaram estratégias de reconhecimento recíproco, os periódicos e livros materializaram hierarquias de legitimidade e os congressos projetaram divergências como parte de uma política comum de regeneração. A noção de biopolítica do prestígio é mobilizada para mostrar que a ciência operava como linguagem de poder, em que o reconhecimento era tão decisivo quanto o argumento. Longe de simples decalque de modelos centrais, a rede transatlântica articulou filtros católicos, memórias coloniais e ansiedades em torno da mestiçagem. Conclui-se que, nesse processo, Brasil e Portugal construíram formas próprias de inscrição eugênica, cuja herança permanece como advertência crítica.

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Publicado

2025-12-16

Como Citar

Giesbrecht, D. (2025). EUGENIA E A BIOPOLÍTICA DO PRESTÍGIO: REDES LUSO-BRASILEIRAS (1918–1930). Revista NEP - Núcleo De Estudos Paranaenses Da UFPR, 11(2), 118–138. https://doi.org/10.5380/nep.v11i2.101370