DESCOLONIZAR A ALTERIDADE PRETÉRITA? A APORIA DA HISTÓRIA CANIBAL

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5380/his.v72i2.95103

Palavras-chave:

Alteridade, Antropofagia, História canibal

Resumo

Desde os primórdios dos tempos modernos, a imagem do canibal foi reproduzida em vários relatos de viagem, atlas cartográficos etc. Se a antropofagia já se encontrava na literatura viática sobre o Oriente, com a “descoberta” do Novo Mundo, o canibalismo se torna um tropos do discurso colonial. Para a primeira parte deste artigo, dar-se-á ênfase às imagens dos canibais do livro de Hans Staden (1557) e aos desenhos feitos pelo artista brasileiro Candido Portinari, em 1941, para um projeto editorial do livro do aventureiro alemão. Com esses dois exemplos, pretende-se mostrar como a imagem do canibal representou uma imagem antitética do colonial. Na segunda parte, retoma-se a metáfora a partir de uma exposição intitulada O Museu Canibal (2002/2003). A última parte deste artigo propõe uma síntese dessas representações da antropofagia para discutir a aporia de uma história canibal.   

Biografia do Autor

Silvio Marcus de Souza Correa, UFSC

Professor do departamento de história da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Referências

ALMEIDA, Maria Cândida Ferreira de. Tornar-se outro. O topos canibal na literatura brasileira. São Paulo: Annablume, 2002.

ANDRADE, Oswald de. O manifesto antropófago (1928). In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda européia e modernismo brasileiro: apresentação e cri ́tica dos principais manifestos vanguardistas. 3a ed. Petrópolis: Vozes; Brasília: INL, 1976.

ANTELO, Raúl. Canibalismo e diferença. Nuevo Texto Crítico, v. 12, n. 1 (1999): 129-140. Disponi ́vel em: Project MUSE, doi:10.1353/ntc.1999.0007.

ARAÚJO, Olívio Tavares. Pequeno ensaio pró-Portinari. In: PARIS, Mary Lou; OHTAKE, Ricardo (organizadores). Portinari devora Hans Staden. São Paulo: Editora Terceiro Nome, 1998, p.124-142.

BASS, Alan. A história de um erro de tradução e o movimento psicanalítico In: OTTONI, Paulo (org.) Tradução. A prática da diferença. Campinas: Editora Unicamp, 2 ed., 2005, p.59-96.

BENJAMIN, Walter. Die Aufgabe des Ü bersetzers. In: Castello Branco, Lucia (org.) A tarefa do tradutor, de Walter Benjamin. Belo Horizonte: Fale/UFMS, 2008, p.9-24.

BOËCHAT, Melissa G. Antropofagia [cultural] na América Latina Colonial - um relato de viagem, Tempos Gerais - Revista de Ciências Sociais e História – UFSJ, Número 5 – 2014, p.32-41.

BREMER, Georg. Unter Kannibalen. Die unerhörten Abenteuer der deutschen Konquistadoren Hans Staden und Ulrich Scmidel. Zürich: Schweizer Verlag, 1996.

CABRAL, João de Pina. Galvão na Terra dos Canibais. A constituição emocional do poder colonial. Novos Estudos, CEBRAP, São Paulo, n. 57 (2000): 124-140.

CALLIGARIS, Contardo. A psicanálise e o sujeito colonial. in SOUSA, Edson L. A. (org.) Psicanálise e Colonização. Leituras do Sintoma Social no Brasil. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999, p.11-23.

CÉSAIRE, Aimé. Une tempête (d’après La Tempête de Shakespeare) Adaptation pour un théâtre nègre, Paris: Présence africaine, 1968.

CHICANGANA-BAYONA, Yobenj A. (2008). El nacimiento del Caníbal: un debate conceptual. Historia Crítica, 1(36), 150-173. https://doi.org/10.7440/histcrit36.2008.08

COCOTLE, Brenda C. Nós prometemos descolonizar o museu: uma re-visão crítica da política museal contemporânea. São Paulo: MASP/Afterall, 2019. Disponível em: https://assets.masp.org.br/uploads/temp/temp-X87a1s0ahKuQghS3VJ4D.pdf

CORREA, Sílvio M. de S. A antropofagia no interior da África equatorial: etnohistória e a realidade do(s) discurso(s) sobre o real. Afro-Ásia (FFCH/UFBA), Salvador, n. 37, 2008, p. 09-42.

CORREA, Sílvio M. de S. Antropofagia e exotismo. Métis, Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul, 2004, p. 83-98.

CORREA, Sílvio M. de S. “Evidências de história nos relatos de viajantes sobre a África pré-colonial”, EIDOS, Revista do Corpo Discente do Programa de Pós- Graduação em História da UFRGS, 2008.

FABRIS, Annateresa. “Canibais censurados”. Nossa América, Memorial da América Latina, São Paulo, nov./dez., 1991, p.14-23.

FANON, Frantz. Les damnés de la terre. Paris: Maspero, 1961.

FEDERICI, Silvia; FORTUNATI, Leopoldina. Il Grande Calibano. Storia del corpo sociale ribelle nella prima fase del capitale. Milano: Franco Angeli Editore, 1984.

FEDERICI, Silvia. Calibã e a Bruxa. Mulheres, corpo e acumulação primitiva. São Paulo: Elefante, 2017.

FRANÇA, Susani Silveira Lemos (organização e tradução). Viagens de Jean de Mandeville, Bauru, EDUSC, 2007.

FRANK, E., “Sie fressen Menschen, wie ihr scheussliches Aussehen beweist... Kritische Ü berlegungen zu Zeugen und Quellen der

Menschenfresserei”, in Hans- Peter Duerr (org.), Authentizität und Betrug in der Ethnologie. Frankfurt: Suhrkamp, 1987, pp. 199-224.

FREUD, Sigmund. Das Unheimliche [1919] In: Psychologische Schriften. Frankfurt: Fischer Taschenbuch Verlag (Limitierte Sonderausgabe), 2000.

GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006.

GALVÃO, Henrique. Antropófagos. Porto (editado pelo Jornal de Notícias), 1947.

GILROY, Paul. O Atlântico Negro, Modernidade e dupla consciência, São Paulo, Rio de Janeiro, 34/Universidade Cândido Mendes, 2001.

LESTRINGANT, Frank. Le Cannibale. Grandeur et décadance. Paris: Perrin, 1994.

LEVI-STRAUSS, Claude. Nous sommes tous des cannibales. Paris: Seuil, 2013.

LOBATO, Monteiro. As aventuras de Hans Staden. Rio de Janeiro: Cia Editora Nacional, 1927.

LOO, H. van der; REIJEN, W. van. Modernisierung. Projekt und Paradox. München: DTV. 1997.

MACY, George. Carta a Candido Portinari, 17/02/1942. Acervo do Projeto Portinari. http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/9121 MACY, George. Carta a Candido Portinari, 28/11/1941. Acervo do Projeto

Portinari http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/9116

MACY, George. Carta a Candido Portinari, 18 de novembro de 1941. Acervo do Projeto Portinari. http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/17768

MACY, George. Carta a Candido Portinari, 13/11/1941. Acervo do Projeto Portinari. http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/9115

MACY, George. Carta a Candido Portinari, 26/09/1941. Acervo do Projeto Portinari http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/9112

MACY, George. Carta a Candido Portinari, 10/06/1941. Acervo do Projeto Portinari http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/9111

MACY, George. Carta a Candido Portinari, 12/11/1940. Acervo do Projeto Portinari.http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/9118

MACY, George. Carta a Candido Portinari, 26/09/1940. Acervo do Projeto Portinari http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/9117

MONTAIGNE, Michel de. Essais (1580). Paris: Bordas, 1985.

NUNES, Zita (2024). A democracia canibal. São Paulo: Fosforo, 2024.

OBERMEIER, Franz. Bilder von Kannibalen, Kannibalismus im Bild. Brasilianische Indios in Bildern und Texten des 16. Jahrhunderts. Jahrbuch für Geschichte Lateinamerikas, 38, Bö hlau Verlag, Köln/Weimar/Wien, 2001, p. 49- 72.

OTTONI, Paulo. A Prática da Diferença. In: OTTONI, Paulo (org.) Tradução. A prática da diferença. Campinas: Editora Unicamp, 2 ed., 2005, p.11-19.

PARIS, Mary Lou; OHTAKE, Ricardo (organizadores). Portinari devora Hans Staden. São Paulo: Editora Terceiro Nome, 1998.

PORTINARI, Candido. Carta a George Macy, (s/d) [1941]. Acervo do Projeto Portinari. http://www.portinari.org.br/#/acervo/documento/93

RETAMAR, Roberto Fernández. “Caliban ante la antropofagia”. Nuevo Texto Crítico, v.12, n.23/24, 1999, p. 203-212.

SANZ, José Manuel Querol. La democracia caníbal. El Leviatán y la amenaza fascista en el siglo XXI. Gijon: Ediciones Trea, 2019.

SAVOY, Bénédicte. Le long combat de l’Afrique pour son art - Histoire d’une défaite postcoloniale. Paris : Seuil, 2023.

SOUZA, Laura de Mello. Inferno Atlântico: demonologia e colonização, Séculos XVI-XVIII. Sã o Paulo: Companhia das Letras, (1.a reimpressão) 2001.

VERGÈS, Françoise. Programme de désordre absolu. Décoloniser le musée. Paris : La fabrique, 2023.

ZIEBEL, Zinka. Terra de canibais. Porto Alegre: Editora da Universidade/ UFRGS, 2002.

Downloads

Publicado

2025-05-29

Como Citar

de Souza Correa, S. M. (2025). DESCOLONIZAR A ALTERIDADE PRETÉRITA? A APORIA DA HISTÓRIA CANIBAL. História: Questões & Debates, 72(2). https://doi.org/10.5380/his.v72i2.95103