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LICENCIAMENTO AMBIENTAL DE EMPREENDIMENTOS DE INFRAESTRUTURA E A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA NO LITORAL DO PARANÁ: ACORDOS E INVISIBILIDADES NO CASO DA FERROVIA LAPA-PARANAGUÁ

Liz Meira Góes, Cristina Frutuoso Teixeira, Luiz Francisco Ditzel Faraco, Carina Catiana Foppa

Resumo


O artigo analisa a participação de diferentes atores na formulação do licenciamento ambiental da ferrovia projetada para ligar o interior do estado do Paraná ao Porto de Paranaguá. No contexto da instalação de grandes empreendimentos de infraestrutura portuária que impactam a sociobiodiversidade do litoral do Paraná, a conservação da natureza e a sobrevivência de povos e comunidades tradicionais são questões obrigatórias no licenciamento de obras nesta região marcada por conflitos socioambientais. Para compreender a efetividade da participação e a influência de diferentes atores nas deliberações sobre o traçado da ferrovia, foi analisado o processo de discussão do Estudo de Viabilidade Técnica e Ambiental (EVTEA) da ferrovia Lapa-Paranaguá, uma das etapas iniciais do processo de licenciamento ambiental, buscando identificar assimetrias de poder entre os protagonistas do estudo (empreendedores, pesquisadores, ambientalistas e gestores públicos) e a forma como influenciaram nas decisões, assim como a não participação de atores potencialmente afetados pelo empreendimento. Por meio de análise documental, entrevistas com atores-chave e observação de reuniões e debates sobre o traçado da ferrovia, foi possível identificar assimetrias de poder entre os protagonistas do Estudo, assim como interesses conflitantes em torno de soluções para impedir ou mitigar os impactos ambientais da obra. Do processo de elaboração do EVTEA, que contou com a participação de instituições ambientais de governo e da sociedade civil organizada, resultou o atendimento de algumas demandas relativas às unidades de conservação. Contudo, com relação aos povos e comunidades tradicionais, embora considerados sujeitos da conservação e decerto serão afetados pelo empreendimento, eles não participaram do Estudo e foram invisibilizados nas decisões sobre o traçado da ferrovia.


Palavras-chave


Participação. Comunidades Tradicionais. Unidades De Conservação. Licenciamento Ambiental. Conflitos Socioambientais.

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DOI: http://dx.doi.org/10.5380/guaju.v7i1.77351

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