Open Journal Systems

Caracterização de fitólitos de plantas e assembleias modernas de solo da caatinga como referência para reconstituições paleoambientais

Heloisa Helena Gomes Coe, Sarah Fricks Ricardo, Leandro de Oliveira Furtado de Sousa, Raphaella Rodrigues Dias

Resumo


A Caatinga, quarto domínio fitogeográfico brasileiro em número de espécies de angiospermas, é composta por um mosaico de florestas secas e vegetação arbustiva, com enclaves de florestas úmidas montanas e cerrados. Entretanto, é o segundo bioma brasileiro com menos áreas protegidas e com poucos estudos paleoambientais. Buscando contribuir para a discussão sobre a evolução deste bioma durante o Quaternário, foram escolhidos como indicadores os fitólitos. Por ser um trabalho pioneiro com esse tipo de proxy na região, foi necessário investigar primeiro se as plantas da Caatinga produzem bastante fitólitos e se os mesmos se preservam nos solos. Foram coletadas na Depressão Sertaneja Setentrional amostras de 33 plantas de 16 famílias e 5 amostras superficiais de solo (Assembleias Modernas) sob diferentes formações vegetais (AM1 Caatinga Arbustiva Aberta, AM 2 Floresta de Caatinga Média, AM3 Floresta de Caatinga Alta, AM4 Floresta Ciliar e AM5 Caatinga Arbustiva Densa), para servir de referência para futuros trabalhos com assembleias fósseis. Constatamos que as plantas da Caatinga produzem uma grande quantidade e variedade de fitólitos, predominando os traqueídeos, poliédricos, globular granulate e tricomas. Foi encontrado um bom grau de preservação dos fitólitos, variando nos tipos e na quantidade de acordo com a vegetação sobrejacente e a granulometria do solo. A assembleia com maior quantidade de fitólitos classificáveis foi AM3 e a com menor porcentagem foi a AM1. Os maiores estoques de fitólitos foram encontrados nas AM 3, 2 e 5, e os menores nas 1 e 4. Os morfotipos fitolíticos predominantes foram o globular granulate, globular echinate e elongate, o que é esperado nesse tipo de vegetação. Os índices fitolíticos D/P (0,6 a 15), Bi (50 a 78%), Iph (53 a 87%) e Pa/P (0,1 a 8,9) são compatíveis com os tipos de formação vegetal analisados. Os fitólitos se mostraram ferramentas promissoras para o melhor conhecimento da vegetação da região, bem como para estudos paleoambientais no bioma.

Palavras-chave


fitólitos; semiárido; Depressão Sertaneja Setentrional

Texto completo:

PDF

Referências


Ab’Sáber A.N. 1974. O domínio morfoclimático semi-árido das caatingas brasileiras. Geomorfologia, 43: 1-26.

Albuquerque S.G., Bandeira, R.L. 1995. Effect of thinning and slashing on forage phytomass from a caatinga of Petrolina. Pernambuco. Brazil Pesquisa Agropecuária Brasileira. 30(6): 885-891.

Alexandre A., Meunier J.D, Lézine A.M, Vincens A., Schwartz D. 1997. Phytoliths: indicators of grassland dynamics during the late Holocene in intertropical Africa. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, 136 (1-4): 213-229.

Alexandre A., Meunier J.D., Mariotti A., Soubies F. 1999. Late Holocene Phytolith and Carbon-Isotope Record from a Latosol at Salitre, South-Central Brazil. Quaternary Research, 1 (2): 187-194.

Andrade-Lima D. 1966 Estudo crítico da nomenclatura fitogeográfica LatinoAmericana. Revista Geográfica, Rio de Janeiro, 63: 109-116.

Andrade-Lima D. 1981. The caatingas dominium. Revista Brasileira de Botânica, São Paulo, 4: 149-53.

Augustin C.H.H.R.R., Coe H.H.G., Chueng K.F., Gomes J.G. 2014. Analysis of geomorphic dynamics in ancient quartzite landscape using phytolith and carbon isotopes, Espinhaço Mountain Range, Minas Gerais, Brazil. Géomorphologie: relief, processus, environnement, 3: 355-376.

Barboni D., Bonnefille R., Alexandre A., Meunier J.D. 1999. Phytoliths as paleoenvironmental indicators, West Side Middle Awash Valley, Ethiopia. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, 152: 87–100.

Barboni D., Bremond L., Bonnefille R. 2007. Comparative study of modern phytolith assemblages from inter-tropical Africa. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology 246, 454-470.

Barros L.F.P., Coe H.H.G., Seixas A.P., Magalhães A.P., Macario K.D. 2016. Paleobiogeoclimatic scenarios of the Late Quaternary inferred from fluvial deposits of the Quadrilátero Ferrífero (Southeastern Brazil). Journal of South American Earth Sciences, 67: 71 - 88.

Bremond L. 2003. Calibration des fonctions de transfert entre assemblages phytolithiques, structures des végétations et variables bioclimatiques actuelles, pour l'intégration de la dynamique des biomes herbacés dans les modèles de végétation. Thèse de Doctorat en Géosciences de l'environnement, direction J. GUIOT. Université Aix-Marseille III.

Bremond L., Alexandre A., Hély C., Guiot J. 2005a. A phytolith index as a proxy of tree cover density in tropical areas: calibration with Leaf Area Index along a forest-savanna transect in southeastern Cameroon. Global and Planetary Change 45, 277-293.

Bremond L., Alexandre A., Peyron O., Guiot J. 2005b. Grass water stress estimated from phytoliths in West Africa. Journal of Biogeography 32, 311-327.

Bremond L., Alexandre A., Wooller M.J., Hély C., Schäfer P.A., Majule A., Guiot J. 2008. Phytolith indices as proxies of grass subfamilies on East African tropical mountains. Global and Planetary Change 61, 209–224.

Calegari M.R., Madella M., Buso Jr. A.A., Osterrieth M.L., Lorente F.L., Pessenda L.C.R. 2015. Holocene Vegetation and Climate inferences from Phytoliths and Pollen from Lagoa do Macuco, North Coast of Espírito Santo State (Brazil). Quaternary and Environmental Geosciences, 06(1): 01-10.

Chueng K.F. 2012. Inferência da Cobertura Vegetal e das Condições Climáticas no Espinhaço Meridional, MG, durante o Quaternário, através dos Indicadores Fitólitos e Isótopos de Carbono. Monografia (Licenciatura em Geografia) - Faculdade de Formação de Professores, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, São Gonçalo, 115f.

Coe H.H.G. 2009. Fitólitos como indicadores de mudanças na vegetação xeromórfica da região de Búzios / Cabo Frio, RJ, durante o Quaternário. Geologia Marinha. PhD. Thesis, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 300 p.

Coe H.H G., Alexandre A., Carvalho C.N., Santos G.M., Silva A.S., Sousa L.O.F., Lepsch I.F. 2012a. Changes in Holocene tree cover density in Cabo Frio (Rio de Janeiro, Brazil): evidence from soil phytolith assemblages. Quaternary International, 2: 1-10.

Coe H.H.G., Chueng K., Gomes J.G. 2012b. Mudanças possivelmente antrópicas na cobertura vegetal na região de Búzios, Rio de Janeiro, identificadas através de análises de fitólitos. Revista Tamoios (Online), AnoVII: 60 - 76.

Coe H.H.G., Gomes J.G., Chueng K. 2013. Exemplos de reconstituições da vegetação e inferências de paleoclimas no Estado do Rio de Janeiro através da utilização de biomineralizações de sílica (fitólitos) e isótopos de carbono. Revista Tamoios (Online), v.9: 1 - 21.

Coe H.H.G.; Sousa L.O.F. 2014a. The Brazilian "Caatinga": Ecology and Vegetal Biodiversity of a Semiarid Region. In: GREER, F. E. (Ed.). Dry Forests: Ecology, Species Diversity and Sustainable Management. 1. New York: Nova Science, p. 81-103.

Coe H.H.G., Macario K., Gomes J.G., Chueng K. F., Oliveira F., Gomes P.R.S., Carvalho C., Linares R., Alves E., Santos G.M. 2014b. Understanding Holocene variations in the vegetation of Sao Joao River basin, southeastern coast of Brazil, using phytolith and carbon isotopic analyses. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, v. 415: 59 - 68.

Coe H.H.G., Ramos Y.B.M., Santos C.P., Silva A.L.C., Silvestre C.P., Borrelli, N.; Sousa, L.O.F. 2015. Dynamics of production and accumulation of phytolith assemblages in the resting of Maricá, Rio de Janeiro, Brasil. Quaternary International, 1: 1-12.

Epstein E. 2001. Silicon in plants: Facts vs. Concepts. In: Datnoff L.E., Snyder, G.H., Korndörfer G.H. (Ed.). Silicon in Agriculture. Elsevier, Amsterdan, p. 1-15.

Fredlund G.G., Tieszen L.L. 1994. Modern phytolith assemblages from the North American Great Plains. Journal of Biogeography 21, 321e335.

Giulietti A. M., Harley R.M., Queiroz L.P., Barbosa M.R.V., Bocage Neta A.L., Figueiredo M.A. 2002. Plantas endêmicas da caatinga. In: Sampaio E.V.S.B., Giulietti A.M., Virgínio J., Gamarra-Rojas C.F.L. (ed.). Vegetação e flora das caatingas. APNE / CNIP, Recife, PE, p.103-115.

Gomes J.G., Coe, H.H.G., Macario K.D. 2014. Uso do bioindicador fitólitos na compreensão da gênese de solos na Bacia do Rio São João, Rio de Janeiro, Brasil. Revista Tamoios (Online), 10: 128 - 150.

Kondo R., Childs C., Atkinson I. 1994. Opal Phytoliths of New Zealand. Manaaki Whenua Press, 85p.

Leal I.R., Tabarelli M., Silva, J.M.C. 2003. Ecologia e conservação da caatinga. Ed. Universitária da UFPE, Recife.

Lorente F.L., Pessenda L.C.R. Calegari M.R., Cohen M.C.L., Rossetti D., Giannini P.C.F., Buso Jr. A.A., Castro D.F., França M.C., Bendassolli J.A., Macario K. 2015. Phytoliths as indicators of environmental changes during the Holocene in the northern coast of the Espirito Santo State (Brazil). Quaternary and Environmental Geosciences, 06(1): 01-15.

Madella M., Alexandre A., Ball T. 2005. International Code for Phytolith Nomenclature 1.0. Annals of Botany, 96: 253-260.

Mercader J., Bennett T., Esselmont C., Simpson S., Walde D. 2009. Phytoliths in woody plants from the Miombo woodlands of Mozambique. Annals of Botany 104: 91-113.

MMA – Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal. 2002. Avaliação e ações prioritárias para a conservação da biodiversidade da Caatinga. Universidade Federal de Pernambuco, Conservation International do Brasil e Fundação Biodiversitas, Brasília.

Mulholland S.C. 1989. Phytolith shape frequencies in North Dakota grasses: a comparison to general patterns. Journal of Archaeological Science, 16: 489-511.

Nimer E. 1972. Climatologia da região Nordeste do Brasil – Introdução à climatologia dinâmica. Ver. Brás. Geogr., 34:3-51.

Parolin M., Monteiro M.R., Coe H.H.G., Colavite, A. P. 2017. Considerações Paleoambientais do Holoceno Médio por Meio de Fitólitos na Serra do Cadeado, Paraná. Revista do Departamento de Geografia (USP), SBGFA: 96 - 103.

Piperno D.R. 1988. Phytoliths Analysis: an archaelogical and geological perspective. San Diego, Academic Press, 280p.

Prado D. 2003. As caatingas da América do Sul. In: Leal I.R., Tabarelli M., Silva J.M.C. (eds.). Ecologia e conservação da Caatinga. Recife: Editora Universitária, Universidade Federal de Pernambuco, p. 3-73.

Reis A.C. 1976. Clima da caatinga. Anais da Academia Brasileira de Ciências, 48: 325-335.

Sampaio E.V.S.B. 1995. Overview of the Brazilian Caatinga. In: Bullock S.H., Mooney H.A., Medina E. (eds.). Seasonally Dry Tropical Forests. Cambridge University Press, Cambridge, p 35-63.

Stromberg C.A.E. 2004. Using phytolith assemblages to reconstruct the origin and spread of grass-dominated habitats in the great plains of North America during the late Eocene to early Miocene. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, 207: 239-275.

Tabarelli M., Silva J.M.C. 2003. Áreas e ações prioritária para a conservação da biodiversidade da Caatinga. In: Leal I.R., Tabarelli M., Silva J.M.C. (Eds.). Ecologia e conservação da caatinga. Ed. Universitária da UFPE, Recife, p. 777-796.

Thinkstock. 2017. Mapa de América do Sul. Disponível em http://www.thinkstockphotos.com.pt/image/ilustraci%C3%B3n-de-stock-south-america-map-outline-vector-with/507525606

Tricart J. 1961. As zonas morfoclimáticas do nordeste brasileiro. Notícia Geomorfológica, 3: 17-25.

Twiss C. 1969. Dust deposition and opal phytoliths in the Great Plains. Transactions of the Nebraska Academy of Sciences XI, special issue: 73-82.

Twiss C. 1992. Predicted world distribution of C3 and C4 grass phytoliths. In: Rapp Jr. G., Mulholand S.C. (Eds.). Phytolith Systematics. Plenum Press, New York, p 113-128.




DOI: http://dx.doi.org/10.5380/abequa.v8i2.52868