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Campesinato e sementes crioulas: indícios de decolonialidade

Luciene da Costa Rodrigues, Roberto José Covaia Kosop, José Edmilson Souza-Lima, Valter Roberto Schaffrath

Resumo


Os agricultores defendem constantemente uma identidade campesina e tradicional, em contraposição à modernização capitalista. Nesse sentido, há necessidade de apresentar um respaldo teórico para o campo, bem como efetivar o resgate sociocultural dos camponeses. Toma-se, portanto, como objetivo, verificar em que medida as sementes crioulas podem ou não ser caracterizadas como uma manifestação decolonial com intuito de conservar a identidade sociocultural regional, bem como contribuir com o campesinato na construção de um desenvolvimento rural ancorado em princípios agroecológicos. Realizou-se uma revisão bibliográfica de cunho interdisciplinar, a fim de contribuir com a sociobiodiversidade, assim como algumas reflexões teóricas voltadas para as práticas decoloniais, visando à necessidade de conservar as sementes crioulas. A prática de uso e conservação das sementes, por meio do campesinato, é de suma importância para a manutenção da diversidade cultural e de saberes. São sementes que não apresentam modificações genéticas e não utilizam insumos químicos, práticas estas que desempenham importantes funções ambientais e para a saúde humana. Portanto, a conservação das sementes crioulas é um processo de autonomia do sujeito camponês e, consequentemente, está em prol da mantença dos saberes tradicionais ligados às técnicas de produção das heranças regionais brasileiras, ou seja, é um modo de desenvolvimento e aplicação de saberes distintos do padrão dominante de racionalidade.


Palavras-chave


Sociobiodiversidade. Agroecossistema. Decolonialidade. Ecocentrismo

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DOI: http://dx.doi.org/10.5380/guaju.v5i1.63829

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