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Aprendizagem de conceitos geométricos pelo futuro professor das séries iniciais do Ensino Fundamental e as novas tecnologias

Geometric concepts learning by the future primary grades teacher in primary education and new technologies

Resumos

Com o movimento da Matemática Moderna, a partir de 1950, o ensino da matemática passou a enfatizar o simbolismo e a exigir dos alunos grandes abstrações, distanciando a matemática da vida real. O que se percebe é que o aluno formado por este currículo aprendeu muito pouco de geometria e não consegue perceber a relação deste conteúdo com sua realidade. Por outro lado, o professor que não conhece geometria não consegue perceber a beleza e a importância que a mesma possui para a formação do cidadão. A geometria estimula a criança a observar, perceber semelhanças, diferenças e a identificar regularidades. O objetivo deste trabalho é identificar o nível de conhecimento dos alunos do Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento ao Magistério (CEFAM), futuros professores da 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental do Estado de São Paulo, quanto aos conceitos de ponto, reta, plano, ângulos, polígonos e circunferências e também verificar as contribuições do computador para a construção de conceitos geométricos. Para atingir esses objetivos, foi desenvolvida uma pesquisa com 30 alunos do CEFAM de Presidente Prudente-SP, na qual, com base no diagnóstico das dificuldades de aprendizagem, organizaram e desenvolveram-se os momentos de formação, que utilizaram o computador como ferramenta de aprendizagem e projetos de trabalho tendo como aporte teórico a abordagem construcionista. O futuro professor que não dominar a geometria e não perceber sua relação com a natureza não conseguirá contribuir para o desenvolvimento do pensamento geométrico da criança. Esse pensamento é que permite a criança observar, compreender, descrever e representar, de forma organizada, o mundo em que vive.

formação de professores; informática na educação; aprendizagem em geometria


The Modern Mathematics revolution, in 1950, introduced a new way of teaching Mathematics, which empathizes the symbolism and demands on students a great amount of abstractions, leaving Mathematics out of the real life. As a result, the student who learned through this curriculum did not learn enough about Geometry and is not able to realize the relationship about this content and the reality. On the other hand, the teacher who does not know Geometry is not able to notice the beauty and the importance of this subject to the individual development. Geometry instigates the child to observe and notice similarities, differences; as well as to identify irregularities. The aim of this paper is to identify the knowledge level of the students from Specific Center of Teachers' Formation and Improvement (CEFAM), who are future primary grades teachers of São Paulo State, about the concepts of point, straight line, plain, angles, polygons and circumferences; and to verify the contributions of computer for building these geometric concepts. Thus, we have leaded a research with 30 students of CEFAM from Presidente Prudente-SP. Based on the identification of learning difficulties we organized and developed the intervention - formation schema, using the computer as a learning instrument and work projects that were supported by the Constructionist approach. The future teacher who does not understand Geometry will not be able to contribute for the development of the geometric notion of a child. This notion is the one that able the child to observe, understand, describe and represent, in organized way, the world where we live.

teachers' formation; computing in education; geometry learning


ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

Aprendizagem de conceitos geométricos pelo futuro professor das séries iniciais do Ensino Fundamental e as novas tecnologias

Geometric concepts learning by the future primary grades teacher in primary education and new technologies

Maria Raquel Miotto MorelattiI; Luís Henrique Gazeta de SouzaII

IMestre em Matemática – UFSCar e Doutora em Educação (Currículo) pela PUC/SP. Programa de Pós-Graduação em Educação e Depto. de Matemática, Estatística e Computação da FCT/Unesp

IIMestrando em Engenharia Mecânica – FEIS/Unesp

RESUMO

Com o movimento da Matemática Moderna, a partir de 1950, o ensino da matemática passou a enfatizar o simbolismo e a exigir dos alunos grandes abstrações, distanciando a matemática da vida real. O que se percebe é que o aluno formado por este currículo aprendeu muito pouco de geometria e não consegue perceber a relação deste conteúdo com sua realidade. Por outro lado, o professor que não conhece geometria não consegue perceber a beleza e a importância que a mesma possui para a formação do cidadão. A geometria estimula a criança a observar, perceber semelhanças, diferenças e a identificar regularidades. O objetivo deste trabalho é identificar o nível de conhecimento dos alunos do Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento ao Magistério (CEFAM), futuros professores da 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental do Estado de São Paulo, quanto aos conceitos de ponto, reta, plano, ângulos, polígonos e circunferências e também verificar as contribuições do computador para a construção de conceitos geométricos. Para atingir esses objetivos, foi desenvolvida uma pesquisa com 30 alunos do CEFAM de Presidente Prudente-SP, na qual, com base no diagnóstico das dificuldades de aprendizagem, organizaram e desenvolveram-se os momentos de formação, que utilizaram o computador como ferramenta de aprendizagem e projetos de trabalho tendo como aporte teórico a abordagem construcionista. O futuro professor que não dominar a geometria e não perceber sua relação com a natureza não conseguirá contribuir para o desenvolvimento do pensamento geométrico da criança. Esse pensamento é que permite a criança observar, compreender, descrever e representar, de forma organizada, o mundo em que vive.

Palavras-chave: formação de professores; informática na educação; aprendizagem em geometria.

ABSTRACT

The Modern Mathematics revolution, in 1950, introduced a new way of teaching Mathematics, which empathizes the symbolism and demands on students a great amount of abstractions, leaving Mathematics out of the real life. As a result, the student who learned through this curriculum did not learn enough about Geometry and is not able to realize the relationship about this content and the reality. On the other hand, the teacher who does not know Geometry is not able to notice the beauty and the importance of this subject to the individual development. Geometry instigates the child to observe and notice similarities, differences; as well as to identify irregularities. The aim of this paper is to identify the knowledge level of the students from Specific Center of Teachers' Formation and Improvement (CEFAM), who are future primary grades teachers of São Paulo State, about the concepts of point, straight line, plain, angles, polygons and circumferences; and to verify the contributions of computer for building these geometric concepts. Thus, we have leaded a research with 30 students of CEFAM from Presidente Prudente-SP. Based on the identification of learning difficulties we organized and developed the intervention - formation schema, using the computer as a learning instrument and work projects that were supported by the Constructionist approach. The future teacher who does not understand Geometry will not be able to contribute for the development of the geometric notion of a child. This notion is the one that able the child to observe, understand, describe and represent, in organized way, the world where we live.

Key words: teachers' formation; computing in education; geometry learning.

Introdução

A discussão e a crítica ao ensino da Matemática tiveram início a partir de 1950 e culminaram com uma proposta de reestruturação do currículo, denominada de movimento da Matemática Moderna. Enquanto o ensino tradicional baseava-se na aritmética, álgebra, geometria euclidiana e trigonometria, a base do currículo da Matemática Moderna passou a ser a teoria dos conjuntos, álgebra abstrata, topologia, estudos das congruências, teoria dos números, ficando longe da relação com o mundo real. Para Fucks (1970), a Matemática Moderna praticamente excluiu o ensino de geometria, enfatizando o simbolismo e uma terminologia excessiva.

Percebemos isto, ainda hoje, em muitos livros didáticos. O conteúdo de geometria vem quase sempre ao final dos mesmos e, muitas vezes, o professor usa o argumento de que não tem "tempo" de trabalhá-lo. Em outros casos a geometria vem diluída entre o conteúdo de álgebra e é possível observar ainda que o professor "pula" o capítulo. O que se percebe é que o aluno, ao se formar, na maioria das vezes não aprendeu geometria e não consegue perceber a relação deste conteúdo com a realidade vivida.

Ressaltamos que, ao trabalhar com geometria, o aluno desenvolve um tipo especial de pensamento que lhe permite compreender, descrever e representar, de forma organizada, o mundo em que vive. Valem então as indagações: quais os conhecimentos geométricos dos alunos do 3º ano do Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento ao Magistério (CEFAM), futuros formadores de conceitos geométricos? Quais as dificuldades em relação à aprendizagem deste conteúdo? E, ainda, quais as contribuições do computador para potencializar a aprendizagem de conceitos geométricos?

Analisamos neste trabalho as dificuldades de aprendizagem dos conceitos de geometria dos alunos do CEFAM, assim como discutimos quais as contribuições do computador para favorecer sua aprendizagem.

Fundamentos teóricos

1. A aprendizagem de geometria

O conhecimento matemático é um dos mais valorizados em todo o mundo. Tão importante é este conhecimento em nossas vidas e, no entanto é inacessível para uma boa parte da população.

Para Gomez-Granell (1996), a matemática é uma linguagem formal, diferente das linguagens naturais, caracterizando-se por abstrações, sem qualquer referência ao cotidiano, constituindo-se em uma linguagem algébrica com um alto grau de generalização. E ainda, a linguagem matemática traduz a linguagem natural para uma formalização que permite abstração e rigor.

Aprender uma linguagem não é adquirir regras, mas sim competências comunicativas, permitindo o uso adequado da mesma. O ensino de matemática deve integrar, segundo a autora, os aspectos sintáticos e os semânticos, pois implica tanto o domínio e a manipulação dos símbolos formais como também a associação de tais símbolos a um significado referencial, ou seja, saber aplicá-los em situações reais. Saber manipular símbolos não implica apenas compreensão de regras e do seu significado; por outro lado, ter conhecimento conceitual, a compreensão do conceito, não implica um conhecimento das regras, procedimentos formais e convenções de notação que são próprias do simbolismo matemático; são, portanto, conhecimentos ou habilidades imbricadas.

No entanto, o que temos percebido é que, na maioria das escolas, o ensino se baseia muito mais na manipulação sintática de símbolos e regras do que no significado dos mesmos. Muitos alunos cometem vários erros por não conseguirem compreender a lógica do raciocínio ou, ainda, por não conseguirem manipular os símbolos com determinadas regras. É importante que os alunos entendam ou construam o significado dos conceitos matemáticos, partindo do uso de procedimentos próprios, até mesmo sem caráter formal. O aprendiz deve primeiro construir o significado dos conceitos para depois fazer a tradução desse conhecimento para uma linguagem simbólica. E esta passagem do conceitual para o simbólico não é imediata, requer estruturação do pensamento, reflexão sobre a ação.

Em geometria, temos a possibilidade de contextualizar os conteúdos, uma vez que o aluno pode perceber e valorizar sua presença em elementos da natureza e em criações do homem. Isso pode contribuir para uma maior significação dos conceitos aprendidos.

O pensamento geométrico evolui articulando a intuição e a dedução. Para Van Hiele (PONTE e SERRAZINA, s/d), esse pensamento progride segundo uma seqüência de cinco níveis de compreensão de conceitos. No primeiro nível, as figuras geométricas são entendidas pelos alunos conforme suas aparências – nível da visualização. No segundo nível, os alunos entendem as figuras a partir de suas propriedades – nível de análise. No terceiro nível, há ordenação lógica das propriedades das figuras – nível de ordenação. No quarto nível, a geometria é entendida como sistema dedutivo – nível de dedução. E, finalmente, no quinto nível, diversos sistemas axiomáticos para a geometria são entendidos – nível do rigor. Ainda para Van Hiele, a aprendizagem de geometria depende da escolha de uma abordagem de ensino adaptada ao nível dos alunos, uma vez que não há compreensão quando as propostas de aprendizagem são apresentadas em um nível mais elevado do que o atingido pelo aluno.

Hoje a informática é considerada um potencial recurso metodológico e nos compete indagar: quais as contribuições do computador para favorecer a aprendizagem de conceitos geométricos?

2. O computador no processo de ensinar e aprender

O computador pode causar uma grande revolução no processo de ensino e aprendizagem se for utilizado não para "informatizar" os processos tradicionais, mas se for introduzido na escola numa perspectiva de mudança do paradigma pedagógico vigente. A mudança do paradigma educacional deve ser acompanhada da introdução de novas ferramentas que devem facilitar o processo de expressão do nosso pensamento. E esse é um dos papéis do computador no processo de ensinar e aprender.

Valente (1993) identifica duas abordagens distintas de uso do computador na Educação. Uma primeira, denominada de abordagem instrucionista, que refere-se à introdução do computador no ensino, sem alterar ou alterando muito pouco a prática pedagógica do professor. Em uma segunda abordagem, o aluno constrói o seu conhecimento por meio do fazer algo, do seu interesse, no computador. Essa abordagem foi denominada por Papert (VALENTE, 1993) de construcionismo.

Quando o aluno resolve um problema utilizando o computador, ele começa pensando na solução do problema e procura descrevê-la por meio de uma linguagem de programação. O computador, então, executa a idéia inicial e fornece um resultado. Ao observar o resultado, o aluno realiza uma reflexão, e caso o feedback dado não esteja de acordo com o que esperava, o aluno tenta identificar os erros cometidos na descrição, para possíveis correções, depurando, assim, o problema. A ação de resolver um problema utilizando o computador foi mapeada por Valente (1993) por meio do ciclo descrição-execução-reflexão-depuração.

O computador pode, dessa forma, auxiliar a construção do conhecimento e a compreensão de conceitos. Existem softwares que contribuem mais (ou menos) para essa compreensão (software aberto ou fechado). No entanto, a criação de um ambiente de aprendizagem que favoreça a construção do conhecimento e o desenvolvimento de habilidades de pensar, necessárias ao cidadão atual, não depende somente do software escolhido, mas sim do professor e da metodologia utilizada por ele.

O desenvolvimento de projetos de trabalho utilizando o computador se apresenta como uma possibilidade metodológica para a criação de ambientes construcionistas de aprendizagem, uma vez que permite uma aprendizagem por meio da participação ativa dos alunos. Permite ainda, a vivência de situações-problema, a reflexão sobre elas e a tomada de decisão. Ao educador compete resgatar as experiências do aluno, auxiliá-lo na identificação de problemas, nas reflexões e na caracterização dessas reflexões em ações. Para Hernández (1998), a finalidade dos projetos em educação é favorecer o ensino para a compreensão. Desta forma, espera-se que o aluno seja capaz de aprender a aprender, de realizar aprendizagem significativa de conceitos geométricos, desenvolvendo autonomia para o aprendizado.

O desenvolvimento da pesquisa

A pesquisa apresentada neste trabalho foi desenvolvida com 30 alunos do terceiro ano do CEFAM de Presidente Prudente – SP, futuros professores de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental. Teve por objetivos identificar o nível de conhecimento sobre os conceitos de ponto, reta, plano, ângulos, polígonos e circunferências e verificar quais as contribuições e os impactos das novas tecnologias para a aprendizagem da geometria plana do futuro formador de conceitos geométricos.

O grau de conhecimento em geometria foi obtido por meio de uma prova diagnóstica com conteúdos que abordavam: a descrição, a interpretação e a representação de diferentes posições com a utilização de um mapa real da cidade de Presidente Prudente/SP; a definição e classificação de curvas abertas ou fechadas, simples e não simples; a identificação, classificação e definição de polígonos; a identificação, classificação e definição de ângulos; a decomposição de figuras planas (quadrados, triângulos, losangos, trapézios e todas as figuras compostas por estes elementos) para o cálculo de áreas e perímetros; e a explicitação de um algoritmo para se calcular o perímetro de uma circunferência.

Além disto, a prova diagnóstica respeitou todos os conteúdos exigidos para as quatro primeiras séries iniciais do Ensino Fundamental, expressos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998). No entanto, buscamos uma maior abrangência na abordagem dos mesmos, já que o professor deve ter um conhecimento mais aprofundado sobre os conteúdos que irá ministrar, para melhor promover a aprendizagem.

A tabela 1 apresenta o percentual de sucesso em relação aos principais conteúdos abordados na prova diagnóstica e evidencia que os alunos dos CEFAM de Presidente Prudente não possuíam maturidade quanto ao domínio dos conceitos exigidos. A partir desta constatação, momentos de aprendizagem foram vivenciados, buscando superar as dificuldades quanto aos saberes geométricos. Para isso, o computador foi utilizado como ferramenta potencializadora deste processo.

Analisando os resultados obtidos na prova diagnóstica quanto à aprendizagem de conceitos, segundo os níveis de Van Hiele, notamos que os alunos encontravam-se entre o segundo e terceiro nível. Quando diferentes níveis de Van Hiele são observados em um mesmo aluno, há indicações que ele não está preparado para a aquisição do conteúdo abordado, uma vez que a solução correta de uma questão muitas vezes não significa que o aluno aprendeu o conteúdo. Para se verificar isto, ele deve ser capaz de aplicar este conteúdo em outros contextos (outras situações diferentes daquela realizada em seu aprendizado). Na correção da prova diagnóstica, foi possível observar que os alunos sabiam as fórmulas para a realização dos cálculos, mas se confundiam quando, em um mesmo exercício, precisavam utilizá-las para a realização da atividade proposta.

Segundo Van Hiele (PONTE; SERRAZINA, s/d), para que haja uma boa promoção da aprendizagem, o professor deve saber em que nível estão seus alunos para então planejar suas ações pedagógicas.

As ações de formação do futuro professor

A partir do diagnóstico das dificuldades dos alunos, iniciamos o desenvolvimento da aprendizagem dos conceitos de geometria. Essas ações de formação ocorreram semanalmente, nas dependências do Laboratório de Informática do CEFAM/Presidente Prudente/SP, em momentos denominados de Oficina de Geometria. Cabe salientar que tanto os softwares de geometria utilizados, bem como as atividades e projetos de trabalhos desenvolvidos, foram definidos a partir do levantamento e análise das dificuldades.

Inicialmente, desenvolvemos os conceitos de curvas planas abertas e fechadas, utilizando o software de desenho Paint, da Microsoft. Com atividades de construção de curvas e depois com o preenchimento das mesmas com tintas, foi possível que os alunos compreendessem a diferença entre curvas abertas e fechadas. E ainda, trabalhando com um software de desenho, os alunos do CEFAM puderam compreender que é possível o lúdico catalisar uma aprendizagem mais significativa. Já para abordar os conceitos de ângulos, figuras poligonais e circunferências, foram desenvolvidos projetos de trabalho, utilizando a linguagem de programação Logo, por meio do software SLogoW, cuja temática foi "a construção da planta baixa da casa do aluno". Inicialmente, os alunos desenharam a planta baixa num papel, e depois a construíram no computador. Isto possibilitou o trabalho com a idéia de unidade de medida e transformações. E ainda, ao desenvolver estes projetos de trabalho no computador, os alunos exercitaram habilidades de pensamento e de solução de problemas, tendo a oportunidade de elaborar hipóteses e testá-las.

O estudo dos conceitos de áreas e perímetros foi iniciado com uma idéia intuitiva, realizando uma atividade com recortes de cartolinas. Os alunos utilizaram uma unidade de medida construída por eles em cartolina e procuraram medir as áreas das carteiras, das paredes, das portas e de outros objetos que estavam ao alcance deles. Após esta atividade, foi formalizado o conceito de área e, também, realizada a construção e aplicação das fórmulas das áreas dos quadrados, dos paralelogramos, dos triângulos, dos losangos e dos trapézios. Depois da realização de vários exercícios, os alunos retomaram a planta baixa já construída por eles no software SLogoW e puderam, então, calcular a área de suas casas.

Para realizar a formalização do conceito de ângulo e estudar suas propriedades, classificações, representações e sua relação com o paralelismo entre retas, utilizamos, além do software SLogoW, os recursos do software Factory.

O Factory é um software que simula a linha de montagem de uma fábrica, que constrói figuras planas. Mais especificamente, constrói quadrados com traços e furos. Para reproduzir a figura dada, o aluno deve colocar em seqüência as máquinas que furam, riscam ou giram o objeto. Trabalhando com as ferramentas do Factory, os alunos tiveram que vencer os obstáculos cognitivos para construir, investigar e testar suas conjecturas sobre inúmeras peças. E ainda, com o Factory, tivemos a possibilidade de estimular um novo meio de interação com a geometria, a oportunidade de instigar a investigação de propriedades pelos alunos e ativar o desenvolvimento de atividades concretas que permitem um melhor acompanhamento da aprendizagem.

Para estudar a congruência de triângulos, utilizamos o software Cabri-Géomètre II. Neste momento, tivemos a oportunidade de abordar também os conceitos primitivos de geometria, a saber, ponto, reta e semi-reta.

Com o Cabri-Géomètre, os alunos puderam criar várias figuras geométricas, entendendo que os conceitos primitivos são necessários e presentes na construção de qualquer figura plana. Como este software faz medições de ângulos e segmentos, desenvolvemos atividades para estudar também os casos de congruência de triângulos.

O trabalho com o Cabri-Géomètre foi bem estimulante, já que ele é um software de Geometria Dinâmica e possibilita a movimentação das figuras, mantendo suas propriedades. Isto possibilitou ao aluno comprovar, experimentalmente, a construção das figuras geométricas, a formulação e a validação de suas hipóteses e conjecturas.

Todas as atividades foram programadas e executadas tendo como fundamento a abordagem construcionista. Aplicada em diversas perspectivas e utilizando diferentes tipos de softwares, esta abordagem fez com que os alunos do CEFAM de Presidente Prudente adotassem uma postura mais séria perante os conceitos de geometria e refletissem como a abordagem construcionista proporcionou uma forma mais atraente e interessante de promover o ensino.

Analisando os resultados obtidos

Para avaliar se a metodologia utilizada na Oficina de Geometria promoveu uma aprendizagem mais significativa dos conceitos de geometria, aplicamos novamente a prova diagnóstica e o resultado foi surpreendente, como pode ser observado na tabela abaixo.

Observando a Tabela 2, notamos que as questões que se referiam a áreas, polígonos e circunferência não tiveram 100% de acertos, mas é interessante destacar que estas questões exigiram muito mais estratégias e investigações para a sua resolução do que as outras.

Os exercícios em geometria exigem articulações e domínio da simbologia matemática, e essas conexões oferecem sempre um pouco de dificuldade para os alunos. Acreditamos que essas constatações é que tenham contribuído para a pequena porcentagem de erros ou abstinência por parte dos alunos nestes itens.

Comparando estes resultados com os obtidos no levantamento das dificuldades (tabela 1) e tendo por parâmetro de análise o modelo de Van Hiele, pudemos perceber que os alunos avançaram. Aqueles que inicialmente encontravam-se nos níveis dois e três, que envolviam a compreensão das propriedades e a ordenação lógica das mesmas, agora podem ser classificados nos níveis três e quatro, este último referindo-se à compreensão da geometria como sistema dedutivo. Aqueles alunos que ainda permaneceram no nível três tiveram certa dificuldade em resolver as questões que exigiam a habilidade de fazer deduções, evidenciada na tabela 2 pela incidência de erros e não resposta.

Estes resultados mostram que o computador, utilizado como ferramenta para enfrentar as dificuldades, foi um grande agente facilitador de aprendizagem, já que, por meio dele, o aluno pôde descrever suas idéias, testá-las, refletir sobre as mesmas e depurá-las.

Esperamos que, além da construção dos conceitos geométricos, o aluno do CEFAM, por meio da vivência em um ambiente de aprendizagem, utilizando projetos de trabalho e novas tecnologias, possa refletir sobre uma nova prática pedagógica, favorecendo assim sua formação enquanto futuro professor do ensino fundamental.

Conclusão

Ao vivenciarmos momentos de formação em geometria, buscamos a criação de um ambiente de aprendizagem baseado na resolução de problemas e no desenvolvimento de projetos, fundamentado na abordagem construcionista. Com isto, procuramos proporcionar aos futuros professores uma aprendizagem mais significativa e contextualizada e a aquisição de habilidades e competências para o exercício de uma prática docente diferenciada e inovadora.

Os softwares que implementaram os conteúdos trabalhados na Oficina foram escolhidos a partir das necessidades dos alunos e dos objetivos da ação educativa. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) ressaltam que o professor deve repensar o processo de ensino-aprendizagem de matemática com a introdução das novas tecnologias, possibilitando ao aluno o interesse pela realização de projetos e atividades de investigação e exploração como parte fundamental da aprendizagem.

É importante salientar que muitos conteúdos específicos de informática foram sendo desenvolvidos na medida em que os conceitos geométricos eram estudados. Muito significativa foi esta vivência para os alunos do CEFAM. Esta conclusão foi possível pelo constante diálogo estabelecido e pelos depoimentos registrados no final da Oficina. Constatamos, assim, que a Oficina de Geometria incentivou os futuros professores a refletir sobre o uso de novas metodologias no ensino e, em especial, o uso do computador. Percebemos que a vivência é a melhor maneira de sensibilizar e preparar os futuros professores para a promoção de ambientes de aprendizagem.

O computador, utilizado no desenvolvimento desse projeto, foi fundamental para o desenvolvimento do pensamento lógico e geométrico, uma vez que, por meio dele, os alunos puderam conjecturar, representar idéias, estabelecer relações, comunicar-se, argumentar e validar suas hipóteses.

O ambiente construcionista vivenciado fez com que os alunos do CEFAM de Presidente Prudente/SP adotassem uma postura mais séria perante os conceitos de geometria e refletissem como esta abordagem proporcionou uma forma mais atraente e interessante de promover a aprendizagem.

Para Ponte e Serrazina (s/d), as novas tecnologias proporcionam novas formas de representação matemática, mudam a forma com que os alunos a representam, bem como ampliam o conjunto das representações com que eles podem trabalhar.

O professor que conhece geometria e compreende o papel da Matemática no mundo atual tem uma melhor predisposição para procurar e explorar padrões geométricos e uma melhor aptidão para as investigações matemáticas, pois tal processo é característico da atividade matemática e deve possuir uma forte presença no processo de ensino e aprendizagem do futuro formador de conceitos matemáticos.

Esperamos que o futuro professor de matemática das séries iniciais do Ensino Fundamental utilize a experiência vivenciada nesta Oficina em sua futura atuação profissional. Almejamos ainda que ele procure conhecer profundamente a geometria, compreendendo-a como um sistema dedutivo, que oportuniza uma aprendizagem lógica e uma melhor organização do conhecimento.

Texto recebido em 17 set. 2005

Texto aprovado em 09 nov. 2005

Pesquisa financiada pela FAPESP.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2007
  • Data do Fascículo
    Dez 2006

Histórico

  • Recebido
    17 Set 2005
  • Aceito
    09 Nov 2005
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