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Apresentação

O Dossiê Práxis da Avaliação: conflitos, contradições, dicotomias, fragmentos e vozes em busca de sentidos tem uma história que compõe o tecido de vida dos autores e em particular de suas organizadoras, que, desde 2012, quando este começou a ser idealizado, numa parceria acadêmica de estudos e pesquisas entre a Universidade Federal do Paraná e a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, pelo Grupo de Estudos e Pesquisa de Avaliação e Currículo (GEPAC). Todos os autores são conhecedores da luta empreendida pelo espaço de publicação na Educar em Revista, alcançado com a aprovação pelo Comitê Científico e Editor do referido periódico no final de 2014, aos quais todos que juntos participaram desta construção agradecem imensamente.

O trabalho visa questionar as práticas avaliativas do sistema e suas funções, buscando repensá-las nas dimensões teórica, técnica e cognitiva, quanto à transformação social, bem como compreender o estatuto político e epistemológico que dão suporte ao processo de ensinar e de aprender no espaço da escola, na qual a avaliação ocorre com diferentes lógicas e significados, visando tecer reflexões sobre a temática avaliação, prática formalmente organizada e sistematizada, no contexto da escola, realizada segundo objetivos educacionais implícitos e/ou explícitos, valores e normas sociais.

As produções dos educadores, apresentadas nos oito artigos e na resenha, foram tecidas considerando as políticas educativas, atuações pedagógicas, conflitos, contradições, fissuras, fragmentos e vozes, com o objetivo de desvelar novos sentidos à práxis da avaliação, como também tratar as determinações da avaliação no campo de formação do profissional docente, na busca da reconstrução do cotidiano escolar, considerando de suma importância o papel da avaliação nessa redefinição, frente à percepção de suas implicações, numa proposta de avaliação para além das diferentes denominações, visando atender às exigências colocadas pelas características e especificidades dos processos de formação desenvolvidos na universidade.

Tendo como eixo as políticas públicas de avaliação, o primeiro artigo, de Claudia de Oliveira Fernandes, do Departamento de Didática da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO, "Uma breve análise das políticas de avaliação e sua relação com a organização escolar por ciclos: resultados de pesquisa", traz à discussão a polissemia do conceito de qualidade de educação e as diferentes concepções de avaliação presentes nos documentos, como os decretos e portarias, instrumentos de avaliação e propostas curriculares, do período de 2009-2010, contexto efervescente da transição da gestão municipal no Rio de Janeiro, na organização escolar em ciclos. Os resultados apresentados são de uma pesquisa que vem sendo realizada no âmbito do projeto do Observatório das Escolas em ciclos do Estado do Rio de Janeiro, pelo Grupo de Estudo e Pesquisa Avaliação e Currículo - GEPAC, cuja autora é coordenadora. O trabalho apresenta a relação da avaliação externa, dos exames, das avaliações em larga escala, classificatórias e meritocráticas, analisando as implicações dessa política de avaliação adotada nas práticas de avaliação da aprendizagem das escolas, nos projetos pedagógicos e nas práticas em sala de aula, frente a uma proposta de avaliação numa concepção de avaliação continuada, como exige a organização em ciclos.

Dando sequência à discussão, o segundo trabalho, intitulado "Provinha Brasil e avaliação formativa: um diálogo possível?", de autoria de Benigna Maria de Freitas Villas Boas, Professora e Coordenadora do grupo de pesquisa Avaliação e Organização do Trabalho Pedagógico (GEPA), da Universidade de Brasília, e Elisângela Teixeira Gomes Dias, Professora da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEDF), Diretora de Ensino da Faculdade LS, Brasil e integrante do GEPA, apresenta as implicações da utilização da referida avaliação externa no trabalho pedagógico de um grupo de escolas da rede pública de ensino do Distrito Federal, nos anos de 2011 e 2012. Para tanto, as pesquisadoras acompanharam o trabalho desenvolvido pelos gestores da escola, coordenadores e as docentes das quatro turmas de 2º ano do Ensino Fundamental. As análises consideraram o contexto educativo dos professores que aplicaram a referida prova, a interação com os demais profissionais da instituição e com as crianças, em diferentes espaços/atividades: salas de aula, atividades de planejamento, reuniões de conselho de classe, reuniões com os pais ou responsáveis e reuniões ou eventos organizados pelos gestores da SEDF. A investigação crítica revela as ideologias subjacentes ou ocultas expressas nas contradições inerentes ao objeto de pesquisa, que ora é tomado como mecanismo de exclusão, com foco no resultado final do teste, ora tido como um mecanismo de inclusão dentro do espaço escolar, sendo um indicador do processo avaliativo que favorece a tomada de decisão. No estudo empreendido, as autoras partiram do pressuposto de que a Provinha Brasil pode contribuir para a melhoria do processo de ensino-aprendizagem se for compreendida no interior das instituições educacionais e pelas políticas públicas, articuladas com a avaliação da aprendizagem via avaliação institucional, não desconsiderando que as políticas públicas educacionais e as dinâmicas escolares refletem processos sociais constituídos a partir dos interesses vigentes na sociedade.

A análise da política educacional referente à tecnologia pedagógica na avaliação institucional, a partir do Programa de Avaliação Institucional da Educação Básica do Paraná, é objeto de pesquisa do terceiro artigo, intitulado "Avaliação institucional na escola pública: os (des)caminhos de uma política educacional", apresentado pela Professora Mary Ângela Teixeira Brandalise, da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Pesquisadora de Políticas Educacionais e Avaliação da Educação Superior e Educação Básica. O texto está organizado em três partes, sendo que na primeira discute-se o conceito de tecnologia, de avaliação institucional, autoavaliação de escolas e a abordagem do ciclo de políticas formulado por Stephen Ball e seus colaboradores. Na segunda parte a autora apresenta a análise dos documentos políticos do programa de avaliação institucional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná - SEED/PR, caracterizando as formas de implementação da avaliação institucional no interior das escolas, tendo em vista às políticas educacionais que a nortearam na percepção da representação das equipes de gestão das escolas em relação às políticas educacionais e o modo como são vivenciadas no cotidiano escolar. E, por último, faz a análise da política referente à avaliação institucional no contexto escolar a partir da representação de seus gestores, tendo em vista os textos políticos produzidos e as consequências quando eles são vivenciados no contexto da prática, ou seja, os (des)caminhos do ciclo de vida da política educacional.

"A redução da escola: a avaliação externa e o aprisionamento curricular", pesquisa que tem como base de estudos o impacto das políticas de avaliação na formulação das práticas cotidianas de avaliação da aprendizagem, organização do trabalho docente e práticas curriculares, é o quarto artigo do eixo de políticas públicas de avaliação, apresentado pelas Professoras Maria Teresa Esteban, da Universidade Federal Fluminense - UFF, e Andréa Rosana Fetzner, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO. As autoras consideraram os significados para a escola das ideias de qualidade, equidade e eficiência, enunciadas pelo sistema de exames estandardizados, que priorizam a dimensão individual dos resultados, a insuficiência do desempenho dos estudantes, a ineficiência da unidade escolar e a incompetência docente, frequentemente matizada pelo discurso da má formação profissional, num contexto em que os diagnósticos oficiais expõem um grande número de crianças, não revelando uma aprendizagem satisfatória de leitura, escrita e cálculo, tornando o fracasso da escola a centralidade do discurso, e elegendo como percurso de sucesso aquele tecido pelos processos de subalternização, que operam como redutores de possibilidades efetivas de aprendizagem.

O quinto artigo faz uma reflexão com vista à reversão do status quo da avaliação quanto aos aspectos da opção epistemológico-metodológica, à gestão escolar e à formação de professores, e é o grande e último legado que a Professora Isabel Franchi Cappelletti (em memória), que até 2014 foi coordenadora da Linha de Pesquisa Currículo e Avaliação Educacional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, deixou para todos os envolvidos na discussão d'"Os conflitos na relação avaliação e qualidade da educação". A educadora teve como horizonte de pesquisa a racionalidade emancipatória da educação como espaço da crítica histórico-política na construção coletiva do conhecimento, pela libertação humana do homem como agente de transformações sociais, tanto que a problemática envolvendo a relação entre a avaliação e a qualidade da educação é apresentada pela pesquisadora como indissociável e bastante complexa, reinterpretando-a no contexto histórico ela busca desvelar o emaranhado de conceitos, vertentes epistemológicas, políticas e educacionais. Apontando a exigência de busca contínua da compreensão, principalmente por parte dos formadores e pesquisadores, do processo do ensinar e do aprender, do saber planejar procedimentos avaliativos como parte do cotidiano das situações de aprendizagem para que possam ser revistas e recriadas, a professora teve como objetivo principal de sua obra abrir espaço para a revisão e reconstrução do currículo.

O sexto artigo apresenta uma pesquisa descritiva sobre as "Práticas de avaliação de dois professores universitários: pesquisa utilizando observações e narrativas de atividades das aulas", do Professor Domingos Fernandes, da Universidade de Lisboa - UI & DCE, projeto de pesquisa financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) de Portugal, que envolveu investigadores de sete universidades (quatro portuguesas e três brasileiras), no período de 2011 a 2014. O objetivo foi descrever, analisar e interpretar práticas de ensino e de avaliação dos docentes e aspectos relacionados com as aprendizagens dos alunos no contexto de unidades curriculares de quatro grandes áreas do conhecimento: Ciências Sociais, Artes e Humanidades, Ciências da Saúde e Ciências e Tecnologias. O projeto foi desenvolvido em cinco fases relacionadas entre si, sendo: Fase Teórica e Conceitual, Fase da Análise Documental, Fase do Estudo Extensivo, Fase do Estudo Intensivo e Fase da Interação Social e da Reflexão. Foi elaborada uma Matriz da Investigação em que o Ensino, a Avaliação e a Aprendizagem foram os objetos considerados numa diversidade de dimensões. Assim, para o Ensino foram consideradas as dimensões de Planificação e Organização do Ensino, Tarefas e Natureza das Tarefas, Dinâmicas de Sala de Aula e a Natureza, Frequência e Distribuição de Feedback. No processo de Avaliação incluíram-se as dimensões: Tarefas de Avaliação Mais Utilizadas, Funções da Avaliação, Integração ou Articulação dos Processos de Ensino, Aprendizagem e Avaliação e Recurso a Estratégias de Auto e Heteroavaliação. Os resultados dessa pesquisa confirmam que as salas de aula são espaços que podem ser decisivos na introdução de novas e inovadoras formas de organizar e estruturar o ensino e a avaliação, de forma que os alunos possam aprender mais e, sobretudo, melhor, com compreensão e profundidade.

O sétimo artigo apresentado pelas professoras Ana Maria Costa e Silva e Rosalinda Herdeiro, investigadoras do Instituto de Educação da Universidade do Minho em Desenvolvimento Curricular, tem como objeto de pesquisa a "Avaliação do desempenho docente: conflitos, incertezas e busca de sentido(s)", onde buscam revelar o impacto das decisões político-educacionais do governo português na carreira e no desenvolvimento profissional dos docentes do 1º Ciclo do Ensino Básico, identificando os elementos intervenientes no desenvolvimento profissional dos professores em articulação com a carreira docente e as identidades profissionais, frente aos constrangimentos e conflitos, expressos ou implícitos, apontados na origem da desmotivação profissional que emergia e era percebida pelos sentidos atribuídos por eles no cumprimento legal da avaliação do (seu) desempenho, face à exigência de promover aprendizagens de qualidade nos alunos. A análise evidencia o mal-estar docente nas escolas, emergente das reformas educativas, exigindo reflexões sobre a desconfiança, ansiedade e desmotivação, entre outros elementos descompensadores, e reações dos professores. Isso implica, por parte do sistema educativo em geral, investimentos na formação permanente, atenção redobrada à diversidade sociocultural dos alunos, ao trabalho colaborativo e a disponibilidade para uma diversidade de relações profissionais requeridas, desde os pais e encarregados de educação, visando uma mudança na percepção da avaliação do desempenho docente, que até o presente momento remete para a presença de contextos educativos dominados essencialmente pelo individualismo e pela competição profissionais.

O oitavo artigo trata da "Avaliação do curso de formação de professores no contexto da Educação a Distância", de Veronica Branco e Sonia Maria Chaves Haracemiv, Professoras da Universidade Federal do Paraná (UFPR), trabalho que tem como objetivo revelar uma avaliação que priorizou os aspectos qualitativos, colocados pelas exigências legais da parceria com a Universidade Aberta do Brasil com a UFPR, buscando revelar as dificuldades do trabalho docente no campo da avaliação em educação, como também a construção de uma nova cultura avaliativa, levando-se em conta o prescrito nos documentos oficiais, o Projeto Político-Pedagógico do Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, nas dimensões do ensino ministrado a distância (on-line) e presencial (aulas e encontros no Polo), os meios utilizados quanto à adequação à aprendizagem dos envolvidos, em diferentes espaços e tempos de ensinar e aprender, a estrutura e o funcionamento do sistema de comunicação das tecnologias utilizadas considerando a estrutura física e pedagógica da Plataforma Moodle, materiais impressos e mídias interativas. Uma investigação caracterizada como pesquisa-ação, pois, na medida em que a avaliação da intervenção dos professores e tutores era avaliada pelos educandos, nos momentos presenciais e a distância, a mediação e percepção de cada um sobre si e sobre o processo possibilitava a reconstrução do processo e da postura dos protagonistas diante da formação docente na modalidade a distância.

A resenha de Clícia Bührer Martins e Graciete Tozetto Goes, Professoras da Universidade Estadual de Ponta Grossa, é uma homenagem póstuma à orientadora de doutorado, do Programa de Pós-Graduação em Educação e Currículo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e coordenadora da Linha de Pesquisa Currículo e Avaliação Educacional (CED/PUCSP). A obra, "Avaliação da aprendizagem: discussão de caminhos" foi organizada em 2007 pela Professora Isabel Franchi Cappelletti, tratando do significado etimológico de avaliar, via reflexão dos "Fundamentos para uma avaliação educativa" proposta por Alípio Casali no primeiro capítulo. Em seguida o repensar sobre os "Referenciais freireanos para a prática da avaliação" é apresentado por Ana Maria Saul. A organizadora é autora do terceiro capítulo, intitulado "Avaliação a serviço da aprendizagem: um inédito viável". No quarto capítulo o tema abordado é "Avaliação: contribuições para o debate sobre ciclos e progressão continuada", de Mere Abramowicz e Maria Isabel d'Andrade de Souza Moniz. O quinto capítulo, "As práticas de avaliação de aprendizagem como negação do direito à educação", foi elaborado por Sandra Zákia Sousa, e como último texto da obra resenhada se apresenta "O processo de avaliação de docentes e sua implicação na avaliação da aprendizagem no ensino superior", de Mônica Piccione Gomes Rios. A resenha foi elaborada de forma a levar os leitores a refletirem sobre os fundamentos éticos e epistemológicos, questões operacionais e instrumentais da avaliação educativa, visando à compreensão desses fundamentos como questões de base para uma prática avaliativa coerente e crítica.

Este Dossiê representa os percursos de pesquisa dos autores sobre a temática avaliação educacional em diferentes dimensões. As organizadoras esperam que sua leitura venha contribuir para o fortalecimento de relações mais dialógicas, problematizadoras e emancipatórias, concepções avaliativas que devem ser instituídas como política pública para a Educação Básica e Superior.

Claudia de Oliveira FernandesSonia Maria Chaves Haracemiv

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2015
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