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A escola ensino ou discrimina?

ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

A escola ensino ou discrimina? (*)

Lauro da Silva Becker

Doutor em Ciência da Educação. Professor Adjundo do Dep. de Métodos e Técnicas da Educação da UFPR

1ª PARTE

ASPECTOS GERAIS DA EDUCAÇÃO E SUA PROBLEMÁTICA SOCIAL, POLÍTICA E ECONÔMICA

Habituado com a relação professor-aluno no cotidiano da sala de aula - situação dinâmica do ato pedagógico em que o diálogo elimina as distâncias e propicia um encontro mais próximo - sentimo-nos hoje mais constrangidos porque, dado o número de participantes, se instaura aqui um processo mais diretivo de comunicação. Isto não é muito profícuo porque o monólogo é mais frio e muito mais distante da realidade ativa dos nossos problemas educacionais.

Se tivéssemos a oportunidade de dialogar diretamente, numa concepção maiêutica, como já fazia Sócrates, poderíamos eliminatr a centralização do conhecimento emitido por um único porta-voz, que não pode se dizer o dono absoluto de verdades. Em segundo lugar, outras barreiras poderiam ser desmistificadas no momento em que o interlocutor tomasse conhecimento do ponto de vista de cada um, para daí construir a ordem do seu raciocínio.

Na relação eu e tu desvendam-se os nistérios da relação nós e mundo. É daí que nasce a imanente relação verdade-contestação-indagação-negação-afirmação.

Para diminuir esta impropriedade didático-pedagógica, dividiremos esta sessão em dois tempos:

1. Primeiramente apresentaremos uma abordagem genérica do problema "a escola ensina ou discrimina". Nesta etapa limitaremos a palavra ao conferencista.

2. Muito mais vivo do que o primeiro tempo, o segundo promoverá uma discussão aberta em torno dos problemas focalizados.

Que objetivos pretendemos atingir nestas duas etapas?

Como não é possível estudarmos a escola fechada em si mesmo e nem a Educação pelos fins relacionados ao processo ensino-aprendizagem, pretendemos:

- provocar uma reflexão profunda sobre as relações escola - sociedade - política educacional - política econômica - formação - condições de escolarização e seus reflexos na vida;

- desafiar o professorado aqui presente a compreender, atuar, analisar e propagar a relação entre formação, educação, profissionalização e bem-estar social;

- discutir as causas e as conseqüências entre a função da escola, do homem, do trabalhador, do pai, do aluno, do empregador e do empregado nas grandes dimensões da sociedade brasileira;

- finalmente, analisar as relações entre ensino - aprendizagem - educação no contexto da questão: a escola ensino ou discrimina?

Para que estes objetivos sejam colimados, é preciso que cada questão seja discutida e analisada à luz de nossa realidade educacional.

Numa ordem lógica de raciocínio, talvez até mesmo de uma forma primária, bruta e controvertida, poderíamos postular, já, de início, que a escola ensina a discriminar.

Assim podemos entendê-la porque esta escola está muito longe de ser uma instituição popular. Voltada para a elite, ela não consegue cumprir o seu propósito teórico tão pregado em discursos políticos, quando na prática ela se esquece daqueles que não têm a mínima chance de ingresso.

Escola ainda de elite porque prepara muito pouco o homem, seja para resolver os seus problemas particulares da vida, seja para uma participação mais ativa no contexto da sociedade moderna. Discrimina porque mostra por meio de estatísticas que a população está se educando, quanto, à margem, nos esquecemos de muitos milhões de analfabetos. Não temos condições de acreditar numa escola que classifica os homens em classes sociais tão distintas. Discrimina porque os próprios professores são, em comparação a outros profissionais, verdadeiros párias da sociedade. São homens que admitem a sua condição de miserabilidade profissional quando gritam em praças públicas o seu salário de fome.

Na realidade, escola, sociedade e vida são ainda aspectos dissociados porque muito poucos são os privilégios que participam e que desfrutam de uma educação vazia, oca e distante de uma sociedade em transformação.

Esta discriminação se acentua ainda mais quando entendermos a ordem de reflexão em torno das diferenças marcantes de uma sociedade que pouco vê as causas e as conseqüências da dilacerada distinção entre ricos - pobres, empregador - empregador, fome - desperdício - riqueza, senhor - escravo.

Escola cega que muito pouco vê além das suas quatro paredes, Escola muda que muito pouco fala e decide em favor da justiça social. Escola surda que pouco ouve e quando ouve ainda não sabe discernir o seu próprio papel. Instituição que se deixa levar muito facilmente para o lado de interesse que não são nossos.

Diante deste contexto, como diz Darcy Ribeiro, nossa escola é uma calamidade1. Nas expressões de Louis Legrand a escola está doente2.

Entretanto, é muito fácil criticarmos a escola como se ela fosse a única responsável pelo fracasso de uma sociedade, cuja raiz e tradição ainda traz em si muitos problemas de ordem organizacional, estrutural, cultural, educacional e política.

Quais seriam as causas desta cruciante situação da escola brasileira? Onde estão situadas?

É óbvio que para se responder a estas questões seria preciso uma análise muito complexa de toda a sociedade brasileira e conseqüentemente um estudo das múltiplas variáveis que interferem como forças restritivas e negativas no grande complexo social, político e econômico, para chegarmos ao cerne das questões educacionais. Adiantamos que um estudo desta natureza implicaria um projeto de grande dimensão do qual deveria participar grande parte da população ao lado de especialistas bem intencionados e preparados.

Entretanto, alguns fatores são primordiais quando se pensa em estudar as condições da Educação Brasileira, inserida na relação economia, política e dinâmica social. Daí emergem as grandes causas que interferem na hedionda situação da discriminação de nosso ensino e da impopularização da nossa escola.

1ª Causa: A dinâmica do complexo econômico, político e social das grandes potências e o suporte das nações mais pobres.

É quase claro, mas muito pouco difundido, analisado e criticado o sistema de intercâmbio e de interligação entre as grandes potências entre si e destas em relação às nações mais pobres.

Estados Unidos, Rússia e alguns países da Europa constituem, sabemos nós, o grande eixo da economia mundial. Estas potências, além de constituírem blocos fechados de interesses próprios, ainda se utilizam da força para impor a sua grandeza e as suas riquezas. Sabemos também que do lado do bloco comunista, é a Rússia a grande ameaça e a grande força que impõe aos países dominados. Do lado capitalista ou do socialismo mascarado, como é o caso de alguns países europeus, a dominação por ordem de grandeza começa com os Estados Unidos, Canadá, Japão, Alemanha, Inglaterra, França, Itália, etc. São estes países os maiores acionistas do capitalismo mundial. É por eles e para eles que as regras do jogo são estabelecidas. Nós, os outros, do Terceiro Mundo, somos os atrelados do sistema. É para aqueles primeiros que plantamos, colhemos, vendemos, damos, trocamos e perdemos. Entra aí em choque o primeiro hiato: exportação - importação. Nesta relação se estabelece a nossa dependência provocada pela discriminação entre patrão - empregado, senhor - escravo, rico - pobre, fartura - miséria.

Ao lado de tudo isso, aparecem aqui, em nossos meios, conflitos de ideologias basicamente mais caracterizadas pelas dissonâncias entre capitalismo e socialismo. Juntamente com isso surgem também as ameaças de guerra, invasão, de apoio, de ajuda... É desta rede de relações que emergem também os fatores de dívida externa, salário-mínimo, prestação da casa própria. Isso constitui uma rede tão bem armada que basta um pequeno circuito para que todo o sistema entre em choque.

No caso brasileiro, por exemplo, a dominação disfarçada e vergonhosamente preparada é imposta mais acentuadamente pelos Estados Unidos. Eles aqui estão, compram por baixo preço o que necessitam, vendem o que não queremos, impõe sua tecnologia e manobram o sistema de multinacionais. Eles são os patrões do nosso Joãozinho! Como a Igreja e a tradição histórica social do Brasil condenam o comunismo, os americanos impõem aqui a sua ideologia, atribuindo os atos de subversão e de imoralidades a terroristas ligados aos seus mais fortes concorrentes. Não acreditamos também que do outro lado do muro as coisas sejam mais fáceis e menos complexas. Seria preciso, aqui, criarmos uma consciência mais profunda de nossa realidade. A partir daí, toda a sociedade precisaria estar preparada para se tornar menos dependente e escravizada.

É dentro deste contexto que a escola brasileira está formando o seu povo. Os pais de nossos alunos são, na maioria deles, empregados de grandes multinacionais que aqui plantam, colhem, vendem, exportam, importam e ainda contribuem para o aumento de nossa dívida.

Nossos carros são todos fabricados aqui e inclusive exportados, mas mantêm uma patente estrangeira, com grandes divisas ao capital que não é nosso. Nossa é a mão-de-obra e a matéria prima, mas o resto é controlado pelo sistema internacional do capital. Neste complexo de desigualdades e de opressão é que a máquina governamental se refere ao trabalho como fonte absoluta do crescimento. Entretanto, o povo já sentiu a duras penas que a luta pelo progresso não depende exclusivamente da exploração da mão-de-obra despreparada e mal paga. É desta forma que, Roger Garaudy3 se expressa:

O crescimento é este crescimento que o Ocidente enxertou em todas as partes do mundo e que o devora. O crescimento é o crescimento dos lucros das multicionais e dos Estados, e da sua sede de poder. Com todas as suas conseqüências: o crescimento dos armamentos e dos seu poder de destruição, este crescimento que custa 450 bilhões de dólares por ano aos países ricos, e 50 milhões de mortos à míngua aos países pobres. Crescimento simultâneo e complementar dos armamentos e da fome.

Este mesmo autor completa o seu pensamento a respeito do crescimento da seguinte forma: "Enfim, o setor privilegiado do "crescimento" continua sendo o do armamento, que, na escala nuclear, já permitiu aos Estados Unidos e à União Soviética acumular o equivalente a ... 300.000 a 400.000 bombas de Hiroshima, que, com seus 15 quilotons, matou 70.000 pessoas".

É neste clima de complexidade que o nosso aluno vai para a escola e que, depois de provar que é pobre, doente e burro, a abandona. É também neste clima de complexidades que os nossos países "amigos" pregam a sua mais alta democracia e os direitos humanos. Além do mais, a concorrência imposta pelas especializações profissionais da nova era de desenvolvimento tecnológico, inculca já na criança o medo do futuro. Seu pai ganha muito pouco, seu tio está sem emprego e o seu irmão não consegue ingressas na universidade. Então, que motivação pode lhe oferecer uma escola falida?

Nesta ordem de crescimento (exploração operária), surgem nossas reformas de ensino com objetivos de profissionalizar o nosso aluno ao término do 2º grau. Poucos perceberam que temos reformas encomendadas no estrangeiro para que:

- O aluno do 2º grau se torne ainda mais marginalizado porque a formação que lhe é concedida não corresponde às necessidades das multinacionais que poderão admití-lo no futuro por um salário de fome, incumbindo-se, a partir daí, a dar-lhe uma especialização em um pequeno ramo de sua profissão.

- a universidade receba alunos com baixo nível de escolaridade, educação e cultura, pois, daí não poderão surgir pessoas mais esclarecidas e mais atrevidas ao poder, fato que somente ao estrangeiro interessaria.

- não surjam grupos mais organizados e procurem um diálogo mais sério com o governo que pouco faz para restabelecer nossa hegemonia social, econômica e política.

Neste jogo de descrédito, de fome, de ignorância, de desinformação e de desformação, os grandes latifundiários e empresários realmente nacionais seguram para si o poder o investem no desenvolvimento da escravatura para que eles sejam cada vez mais fortes, não se preocupando com a humilhação de seus irmãos pelas forças do poder internacional. O governo, por outro lado, muito pouco vê a respeito da miséria e da ignorância, pois, assim ele manterá a sua força e a sua liderança.

2ª Causa: A herança histórica da sociedade brasileira.

A relação entre opressor - oprimido, rico e pobre, explorador e explorado não é uma marca característica do século XX. Para entendermos melhor esta abrupta divisão, basta inquerirmos um pouco o nosso passado histórico. Como se desenvolvia na África e na América a relação social, política e econômica entre países desenvolvidos e suas colônias? Que tipode relação se mantinha entre senhor - escravo, proprietário e índio? Esta base histórica de nossa sociedade não teria influenciado sobremaneira nosso comportamento moderno?

No que concerne à Educação Brasileira, seria bom salientarmos que nossos índios e escravos não tinham o direito de adentrar as portas da escola jesuítica, como acontecia com os filhos dos senhores portugueses. Nossa escola, portanto, já discriminava em sua própria origem histórica. Por outro lado, os professores daquela época era reciprocamente representantes de um saber importado, cuja pedagogia autoritária se desenvolvia em nome do Rei e de um Deus infinitamente bondoso a uma classe de elite. Com um Deus e um Rei aglutinados no coração e na imagem de um professor, estabeleceu-se aí o primeiro princípio de autoridade, obediência e sacrifício. Escravos e índios não eram vistos nesta concepção porque faltavam animais suficientes para o trabalho do engenho. Hoje, esta tradição histórica ainda persiste em nossos meios sociais, políticos, econômicos e educacionais, pois somos, de um lado netos dos senhores de engenho e dos grandes latifundiários e, de outro, parentes próximos dos índios e dos escravos.

Entretanto, com o desenvolvimento de outros países potenciais da América, este sistema de colonização e de imperialismo econômico foi implantado de uma forma mais civilizada e discretamente armada por uma nova corte mais poderosa e mais tecnocrata. Alguns daqueles engenhos continuam a prosperar e a produzir combustível para serem queimados em viaturas pertencentes à classe dos senhores. Empresas mais modernas foram instaladas nos grandes centros, devastando a nossa natureza, poluindo os nossos rios e mantendo em maior número a relação senhor - escravo. Se naquela época histórica os índios e os escravos não tinham direito à Educação, hoje, este número se eleva a quase 40 milhões de analfabetos.

Neste sentido histórico, Darcy Ribeiro diz que "o importante a assinalar nesse retrospecto é que uma sociedade em que o grupo predominante da classe dirigente é constituído de descendentes de senhores e escravos tende, por um lado, a dignificar o papel de seus avós e, por outro lado, a olhar o povo como o que há de mais reles, atribuindo a ela a culpa do próprio atraso".1 Estes aspectos quase não são explorados em nossas escolas porque procuramos enaltecer o nosso passado histórico com acontecimentos dignificantes de nossa sociedade. Para Darcy Ribeiro,1"uma das coisas mais vergonhosas da educação brasileira é que em nossas escolas se ensina a ver o passado com os olhos dos senhores de escravos".1

3ª Causa: Complexidade e desvalorização do sistema educacional brasileiro.

O sistema educacional brasileiro é muito complexo em toda a sua dimensão. Aproximadamente quarenta milhões de pessoas, se contarmos alunos, professores e administradores, estão envolvidas na grande máquina educacional. Este número de pessoas corresponde à população de uma país da Europa. Além do grande número de pessoas envolvidas, a administração educacional é muito precária, com uma burocracia que impede o funcionamento do sistema. Por outro lado, leis, reformas e decretos mudam tão constantemente que nem sequer se esperam os efeitos anteriores para se implantarem novas modificações. Ensino primário, de 1º grau, de 1ª a 4ª série, ensino supletivo, de 5ª a 8ª série, ensino de 2º grau, supletivo, ensino profissionalizante, ensino superior, escolas particulares, públicas, religiosas, são denominações e especificações desta grande complexidade. Por outro lado, o ensino de 2º grau, por exemplo, muito pouco se refere ao ensino superior, pois o exame vestibular é sempre uma surpresa e uma violência às deficiências daquele nível. Se houvesse um aproveitamento dos resultados do 2º grau para o ingresso na Universidade, certamente o aluno deste nível sentir-se-ia mais motivado a preparar-se mais previamente para o nível subseqüente. Como isto não acontece, o 2º grau não forma o aluno para o trabalho nem abre caminhos pata o seu progresso que deveria ser mais natural. O ensino baseado no número de anos em que o aluno se senta nos bancos escolares e não na sua progressão por competências atingidas, cerceia o progresso de uns e impede que outros permaneçam mais tempo na aquisição de certas habilidades e conhecimentos. Assim, os primeiros são obrigados a perder o seu tempo para completar o seu requisito e os segundos a acelerar o seu processe natural de maturidade. Basta compararmos alguns alunos do 2 grau com outros do 1º, para sabermos que existem aí certas inversões de valores. Estas características se acentuam ainda mais quando constatamos que grande parte dos alunos da Universidade não domina certos conteúdos pertinentes ao 2º grau.

A metodologia do ensino também é um outro fator crítico no embaraço do sistema educacional. Alunos adultos do 2º grau noturno não podem se submeter à mesma metodologia de que o professor utiliza para as crianças do 1º grau matutino.

Estas críticas vão ainda mais longe se analisarmos o tipo de relacionamento interpessoal que se utiliza com diferentes clientelas em sala de aula.

4ª Causa: A ineficiência e a ineficácia da escola

A escola brasileira atende apenas a uma classe privilegiada da sociedade. Segundo o censo de 1980, há no Brasil 24 milhões de crianças com mais de 10 anos sem nenhuma escolaridade, quatro e meio milhões com apenas um ano de escola e sete milhões com apenas dois anos de estudos. Das crianças que conseguem entrar na escola apenas um terço delas chegam até a 4ª série do 1º grau. Em matéria de evasão escolar o Brasil atinge índices mais elevados do que o México, Paraguai, Bolívia e Cuba.

Segundo Darcy Ribeiro, o número de analfabetos aumenta em cada década. O quadro abaixo mostra esta evolução do número de analfabetos com mais de 15 anos de idade.1

1950 50,5% 15 milhões

1960 39,3% 16 milhões

1970 33,0% 18 milhões

1980 25,9% 19 milhões

Além do mais, aqueles que conseguem um lugar para ingresso na escola, são submetidos a um tratamento pedagógico relativo a crianças da classe média e alta. Com esta didática inapropriada, as crianças não conseguem aprender em tempo suficiente porque dependem exclusivamente da ajuda da professora, enquanto que outras de classe social mais elevada contam com o apoio dos pais no acompanhamento das tarefas escolares. Com apenas três ou quatro horas diárias de encontro com a professora, as crianças menos privilegiadas acabam abandonando a escola com o complexo de doentes ou de incapacitadas metalmente. Além destes fatores, muitas delas não contam com o material necessário (livro, caderno e lápis) para o acompanhamento normal de sua escolaridade.

A má formação de nossos professores também é um outro fator que contribui significativamente para o fracasso escolar. Com um primeiro e um segundo graus muito fracos, como pode uma professora recém-formada desenvolver um processo complexo de ensino, compreendendo e analisando as dificuldades de crianças que já são consideradas doentes e incapazes? Os cursos de formação de professor a nível universitário são também muito inadequados, pois a formação pedagógica que é oferecida aos licenciandos não passa de uma pequena simulação artificial, distante de uma realidade mais viva e mais complexa.

Se existe uma certa entropia do sistema educacional, é evidente que isto provocará reações negativas no interior deste sistema. Aquilo que acontece em sala de aula é, em grade parte, a conseqüência do mau funcionamento do sistema geral que implícita e explicitamente expele radiações, cujos reflexos atingem a menor partícula de todo o processo educativo. Assim, os conteúdos defasados e amorfos que são apresentados nos programas escolares têm pouco a ver com a nossa realidade social. Eles são dirigidos a uma classe ideal da nossa sociedade, quando os sujeitos de nossa escola representa a realidade nua e crua de nosso atraso cultural, científico e educacional.

Neste sentido, nossa educação está muito distante dos padrões representativos de nossa realidade social. Vale a pena destacar um trecho citado por Carlos Rodrigues Brandão:

Há muitos anos nos Estados Unidos, Virgínia e Maryland assinaram um tratado de paz com os índios das Seis Nações. Ora, como as promessas e os símbolos da educação sempre foram muito adequados a momentos solenes como aquele, logo depois os seus governantes mandaram cartas aos índios para que enviassem alguns de seus jovens às escolas dos brancos. Os chefes responderam, agradecendo e recusando. A carta acabou conhecida porque alguns anos mais tarde Benjamim Franklin adotou o costume de divulgá-la aque e ali.

Eis o trecho que nos interessa:

... Nós estamos convencidos, portanto, que os senhores desejam o bem para nós e agradecemos de todo o coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa idéia de educação não é a mesma que a nossa.

... Muitos de nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para nós, eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportarem o frio e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar o inimigo e construir uma cabana, e falavam a nossa língua muito mal. Eles era, portanto, totalmente inúteis. Não serviam como guerreiros, como caçadores ou como conselheiros. Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores da Virgínia que nos enviem alguns de seus jovens, que lhes ensinaremos tudo do o que sabemos e faremos, deles, home

O exemplo acima cabe perfeitamente á realidade de nossa sociedade e de nossa educação. Estamos tentando colocar uma máscara disfarçada sobre a nossa realidade, e daí, ao invés de prepararmos o homem para o trabalho do campo e para as atividades manuais, pretendemos formar tecnocratas, para servir de escravos nas mãos dos senhores dos "grandes engenhos industriais".

2ª PARTE

A EDUCAÇÃO E OS ASPECTOS ESPECÍFICOS DO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

Na mesma ordem de reflexão focalizada na primeira parte, em que destacamos a relação entre senhor - escravo; dominante - dominador; forte - fraco. agente - paciente; governo - povo; autocracia - democracia, enfatizaremos aqui o professor e os alunos no encontro da relação psicopedagógica.

Da mesma forma que o governo, na relação com o povo, o professor também pode exercer uma função de autoridade, de democracia de diretividade, de apoio e de troca. Nesta ordem, o professor é o governo em relação com o seu povo. É ele que pode deter ou promover seja a democracia, o saber, a integração ou a violência. Pode ser um governo tão forte que consegue até destruir espíritos, desabrochar fracassos, eliminar aptidões.

Pode ser um governo tão bom e tão democrático que consegue até dividir responsabilidades, criar alternativas para que cada um busque em si os grandes valores para toda a vida. É desta troca de experiências contínuas que surgem os grandes cientistas, músicos, etc. É daí que podem surgir os grandes bandidos, os grandes violadores de direitos, os grandes ditadores.

Se nesta escola não houver senhores e nem escravos, se não houver a diferença entre ricos e pobres, nem a exploração do capital humano, esta escola contituirá um grande aparato para a vida. Se em cada ação docente houver também o empenho, o amor, o respeito e a penetração, haverá também sucesso, esperança, recompensa.

Entretanto, difícil é ser escravo do governo, das leis injustas, da sociedade e da vida e não encontrar um pequeno cantinho na escola do povo, paga pelo povo. Difícil é saber que o pai não tem emprego, que a mãe é uma escrava da família, que os irmãos são delinqüentes e que o professor é o porta-voz de verdade absolutas, da sabedoria universal, dos princípios de dominância, do saber artificializado em teorias. Duro não é a ida para a escola, onde os sapatos são difentes, os cadernos são mais grossos, onde se usam brilhantes, onde se ensina e poucos aprendem. Duro é voltar para casa faminto, discriminado, reprovado, evadido e frustrado para a vida.

Diante desta complexidade da escola e do ensino, podemos perguntar?

Quem é o professor?

Quem são os alunos?

O que eles podem fazer em conjunto?

Na relação dinâmica da sala de aula, no jogo de confrontos interpessoais e de compreensões, tanto o aluno como o professor são:

1. Um indivíduo

Na condição de pessoa única e incomparável, o professor e os alunos são apenas seres distintos, com personalidade própria, com defeitos e qualidades inerentes à sua própria individualidade e privatividade. São eles pessoas em toda a dimensão do seu caráter. Cada um é um apenas dentro do seu limite do ser, uma caixinha de segredos onde se escondem os mais profundos mistérios da individualidade. Neste sentido, tanto professor como o aluno podem ser ruins pela sua própria natureza, ou bons, felizes, infelizes. A sua auto-imagem ou a sua carteira de identidade resume em si um conjunto de variáveis que são singulares aquela única pessoa. Nem ela própria descobre todo o seu potencial, qualidades e defeitos, pois cada um é apenas a matriz de si mesmo. Assim como o pedreiro, o médico ou a empregada doméstica, o professor e o aluno são apenas gente, com direitos a erros e aventuras. Têm eles também, da mesma forma que todos os outros seres, o direito de amar, de serem amados, de desamar e de buscar em si a essência da sai própria vida. Querer compará-los, julgá-los, analisá-los ou classificá-los é o mesmo que revelar a fotografia de um, sobre a imagem justaposta de outro.

2. Um ser social

Aqui, eles não são apenas a representação única da sua própria imagem, mas a relação de sim com os outros com os quais convivem. Nesta dinâmica entre o eu e o tu, organiza-se um nós, cuja integração permite que cada um se modifique, transforme e se transforme. Deste fluxo de interação, o professor e os alunos podem exercer o poder de ajuda, de um lado, e o poder de auto e hétero - transformação, de outro.

Em sala de aula, o professor e os alunos são mais que a soma individual ou o retrato exclusivo de si mesmos, mas a verdadeira sociedade em movimento. Se na comunicação com seus alunos, o professor apresenta os traços que lhe são particulares tais como a aparência, a alegria, a cordialidade e o nervosismo, de outro lado, no conjunto destes comportamentos, não escapam aqueles traços que caracterizam a sociedade na qual ele está inserido.

3. Um agente de proução e de desenvolvimento econômico

Além de ser um indivíduo social, um agente modificado e modificador do meio social, qual seria o produto de seu trabalho? Que influências o processo ensino-aprendizagem exerce sobre o desenvolvimento econômico de um país? Qual será a taxa de retorno do homem educado em relação àquele que não contou com este investimento? Do engenheiro, nós veremos o grande viaduto construído, do médico as grandes cirurgias e onde se encontra o produto da educação?

Não existe um país altamente desenvolvido em Educação com um baixo nível econômico, como também não, um país com um potencial econômico alto e com um baixo índice de desenvolvimento educacional. Educação e economia são aspectos indissociáveis. A educação dada em nossas escolas representa, em grande parte, o compromisso com nossa dívida externa. No processo de formação, o homem passa por três etapas.

- Entrada

Nesta situação, o homem é a matéria-prima ou a matéria bruta que deverá receber um tratamento especial que se denomina formação.

- Processo - desenvolvimento ou escolarização

Aqui, tanto o indivíduo como o Estado investem economicamente sobre a formação. Se contarmos o número de horas dispensadas aos bancos escolares, às bibliotecas, ao aluguel do prédio, aos materiais escolares, quanto custaria a formação de um profissional qualificado? Esta formação começa aos cinco ou seis anos e se estende por toda a vida, se considerarmos a formação permanente do indivíduo.

Nesta etapa, o ser em formação constitui uma grande fonte de investimento em capital humano.

- Saída

Ao término de seus estudos univeristários, o aluno recebeu aproximadamente 15 a 20 anos de formação, A partir daí começam as atividades profissionais. Estando formado este indivíduo apresentará o mesmo nível e qualidade profissionais que aquele que não recebeu esta formação?

Supõe-se que a sua taxa de retorno será, portanto, bem mais significativa. Do seu trabalho, da sua produção, da sua taxa de retorno, recomeça um novo ciclo de investimentos sobre novas pessoas que se engajam no processo de formação. Daí resultam: grandes obras, pessoas mais responsáveis e mais educadas, líderes políticos, agentes sociais, educadores, economistas etc. Tudo isso e mais um pouco é obra da Educação, que, muitas vezes, não pode ser palpada e mensurada, dada a magnitude.

4. Um pesquisador

O progresso da ciência, das grandes descobertas da psicologia e do desenvolvimento tecnológico exige do profissional docente o controle mais sistemático do processo ensino-aprendizagem. A pedagogia moderna deve-se preocupar mais científica e metodologicamente com a organização dos conteúdos, seleção de métodos, escolhas de objetivos. Sistematizando suas observações, o professore reunirá informações que necessitam investigações mais aprofundadas. Neste sentido, tanto para os alunos como para os professores, pesquisa significa busca, questionamento e reflexão e não processo de cópia de manuais da biblioteca. Todo processo de aprendizagem se caracteriza pela descoberta e não pela transmissão e assimilação de conteúdos amorfos. Nesta relação, é quase impossível dissociarmos o ensino e a aprendizagem do processo de pesquisa. Se nossos alunos não sabem estudar é porque não lhes foram dados ainda instrumentos necessários e metodológicos pata o desenvolvimento crescente do processo de pesquisa. Se a professora não partir de problemas de pesquisa, ela acabará dando tudo pronto e acabado e os seus alunos não participarão do processo de busca e de reflexão.

5. Um cientista e um artista

Na função de cientista, o professor é aquele profissional que, com base em leis, teorias e postulados é capaz de aplicar, na prática, a ciência do conhecimento. Para isto, ele deverá compreender a estruturta da sua matéria de ensino, estabelecendo relações de causa e efeito e, a partir daí, construir o processo ensino-aprendizagem, dando seqüência lógica e psicológica aos conteúdos apresentados. É por meio da observação dos fenômenos e da experimentação psico-pedagógica que o professor e os alunos desenvolvem um processo-científico de ensino-aprendizagem.

Por outro lado, este mesmo professor e estes alunos, numa relação harmônica e sincronizada, criam alternativas mais agradáveis no seu processo de relacionamento. Mestre e maestro são quase sinônimos. Dirigir uma orquestra ou uma sala de aula implica atitudes que são particulares ao artista. Se na orquestra cada um deverá no conjunto, tocar o seu instrumento de forma melódica, em sala de aula, a orquestra se organiza quando o professor cria situações para que cada um, no conjunto, exerça o seu papel e toque também o seu instrumento.

6. Um líder social e político

Na relação da dinâmica social estabelecida no encontro com pessoas que se preocupam com o desenvolvimento da cultura, da educação e da justiça social, o professor e o aluno são as grandes vigas-mestras deste alicerce. Discutindo, analisando e criticando, o discente e o docente estabelecem relações que desabrocharão expectativas, cujos reflexos provocarão melhor conscientização dos problemas sociais e políticos. É reclamando por seus direitos, é exigindo a justiça e pregando a democracia que emergem grandes forças do poder nacional. Daí surgirão os grandes deputados, senadores e presidentes. Isso é função da escola, caso contrário estaremos formando covardes e inconseqüentes.

7. Um Educador

Não apenas como um técnico, um homem de ciência ou um artista, o professor é também aquele que descobre o mundo pelos olhos dos outros. Educar, neste sentido, implica amor, dom e vocação, para daí começarmos a falar em dedicação, desempenho e resultados. Educar não é apenas instruir ou criar habilidades técnicas, significa dar oportunidades para que cada um descubra a sua própria vida e estabeleça os seus valores e os seus objetivos. Ensinar e educar estão muito próximos, mas a educação não é apenas a aquisição do conteúdo, ela ultrapassa os muros da escola, penetra na família e na sociedade. Educar é reconstruir experiências de vida, acrescentando aí novas descobertas e novos valores. O respeito mútuo que se estabelece na dinâmica do processo de ensino, as relações de ajuda e de integração, são princípios de educação. Criar o poder de discernimento e da crítica é também uma função do ato educativo.

Diante destes papéis ou funções que se estabelecem na relação cotidiana do ato educativo, que bases alicerceiam o processo ensino-aprendizagem?

A relação professor aluno e toda a complexidade do ato pedagógico se apóiam em três aspectos integrativos:

- Saber - este suporte refere-se ao domínio do conteúdo específico de uma determinada disciplina. Aquele que ensina deverá ser um grande especialista do conhecimento e dominar a estrutura básica da sua matéria. Supõe-se que não e de ignorantes que se formam grandes professores. A organização lógica e psicológica dos conteúdos depende do nível do conhecimento da disciplina. Grande número de professores não consegue fazer com que seus alunos aprendam porque eles próprios desconhecem as diferentes vias pelas quais este conteúdo pode ser administrado e ensinado. Brunner, a este respeito diz que qualquer conteúdo pode ser ensinado a qualquer pessoa desde que ele seja apresentado de maneira adequada. Para isto o professor deverá conhecê-lo a fundo.

- Saber-ser. Este suporte refere-se aos princípios psicológicos e afetivos da pessoa que ensina e da pessoa que aprende. Auto-imagem, amor-próprio, vocação, dom e motivação são aspectos fundamentais do saber-ser. Todo aquele que é capaz de saber se amar é também capaz de amar alguém. Este equilíbrio entre os aspectos da personalidade e o ato de ensinar ajudará muito o professor e os alunos a se compreenderem, a se respeitarem e a se integrarem. Qualquer conflito afetivo ou psicológico constitui uma variável negativa ao saber-ser pessoa para depois saber-ser um profissional.

- Saber-fazer. Este suporte engloba os dois anteriores e abre uma nova atitude a ser evidenciada: a prática pedagógica. Saber-fazer está mais intimamente ligado a métodos e técnicas de ensino ou ao como ensinar, para que os alunos aprendam mais adequadamente. Não basta apenas conhecer (saber) a fundo um determinado conte[udo, é preciso saber apresentá-lo de acordo com as dificuldades de cada aluno.

O saber-fazer do ato pedagógico envolve o conhecimento (saber), as condições afetivas da personalidade (saber-ser) e os diferentes estilos de trabalhar em sala de aula. Ensinar as partes de uma planta, levando os alunos a trabalhar na horta escolar é um saber-fazer mais adequado que aquele de se ditar o ponto da disciplina.

Como fazer, então, para equilibrar as diferentes funções do professor em sala de aula, com os aspectos integrativos estudados anteriormente?

O primeiro aspecto que deve ser considerado para que o professor esteja preparado para exercer a sua função docente, integrando e equilibrando as funções anteriormente estudadas, refere-se à formação.

Dentro desta dimensão, podemos considerar duas bases fundamentais:

A formação acadêmica (Matemática ou História ou Letras, conforme o caso), baseada no estudo e aprofundamento de disciplinas e conteúdos específicos à sua formação. Neste primeiro estágio, o estudante deverá compreender e saber aplicar a estrutura básica dos conteúdos, entendendo a dimensão lógica das complexidades.

A segunda etapa ou formação pedagógica refere-se também ao saber alicerçado na formação acadêmica, mas procura aprofundar mais especificamente o saber-ser e o saber-fazer pedagógico. É aí que ele analisará as diversas teorias psicológicas, didáticas e metodológicas do processo ensino-aprendizagem, colocando-as em prática em situações reais de ensino.

Estas duas etapas da formação recebem um caráter mais integrativo e dinâmico quando o estudante se depara com a realidade do seu exercício profissional, que deverá começar, sem dúvidas, na última etapa de sua formação.

Neste sentido, segundo Lhotelhier, a formação é entendida como "um processo de pesquisa de fundamentação, de forma, de verificação que se desenvolve pela interrogração, negação e afirmação de problemas pessoais, situacionais e relacionais. Portanto, a formação é a unidade ativa da experiência, de treinamento e da práxis".5

Este conjunto de fatores que está implícito no conceito acima, assegura à formação um caráter dinâmico, propondo um questionamento constante da realidade profissional em que se situa o estudante e a sua futura clientela. Decorrente do primeiro, o segundo aspecto que caracteriza a integração das funções docentes e discentes, refere-se à conscientização e atuação do professor nas dimensões, pessoais, profissionais, sociais e políticas.

Neste sentido, ser professor não siginifica apenas se fechar nas quatro paredes de uma sala de aula e administrar didaticamente os conteúdos de sua disciplina. Significa atuar no mundo, agindo sobre ele, transformando-o, modificando-o, transformando-se modificando-se.

Na primeira parte, tentamos configurar a Escola Brasileira em relação ao contexto social, político e econômico do País. Daí, chegamos a inferir que a instituição escolar reflete, em grande parte, a imagem dos problemas nacionais. Situação econômica, analfabetismo, dívida externa, salário-mínimo, multinacionais e a relação senhor-escravo, são fatores que influenciam interna e externamente no processo e nos resultados de nossa educação. Em ordem inversa, a educação que está sendo oferecida em nossas escolas também não está respondendo às nossas ansiedades, necessidades e expectativas. Em conseqüência, na condição de pessoa, de ser social, de agente econômico, de artista, de cientista e de educador, o homem brasileiro (seja no papel de aluno, seja no papel de professor) não está conseguindo se situar e se afirmar diante das barreiras que lhe são impostas pela sociedade. A escola não consegue ser um milagre à parte ou um lenitivo que possa amenizar ou curar todos os males do complexo social, político e econômico. Que tipo de pessoas estamos formando? Que ser social, político ou educador daí pode resultar? Que miserável criatura é esta, em um país tão grande e tão rico, que vai à escola para receber como prêmio uma simples tijela de sopa?

A formação, em todas as dimensões, como foi definida nas linhas precedentes, não está sendo efetivamente desenvolvida porque a grande engrenagem social, política e econômica está enferrujada ou melhor, desarticulada. Como resultante, o saber, o saber-ser e o saber-fazer não podem se consolidar na sua totalidade, porque há interesses camuflados no interior do grande sistema. Sobre ele, e em torno dele, outros sistemas maiores se impõem, determinando e agilizando as nossas direções. Que Deus nos acompanhe!

CONCLUSÃO

Enquanto a escola brasileira for uma instituição fechada em si mesma, com os seus olhos vedados para a realidade social, política e econômica, ela será uma grande fonte de promoção e de divulgação da discriminação educacional.

Enquanto sociedade e escola estiverem dissociadas, uma promovendo a escravidão e a diferença de classes; a outra permanecendo muda, cega e surda, estaremos nós, professores, em situação crítica de discriminação e de isolamento das causas e dos efeitos que esta escola e esta sociedade promovem entre si.

Enquanto, não houver uma integração mais íntima entre os fenômenos sociais, políticos e educacionais, a nossa economia estará sempre nas mãos de grupos estrangeiros e nós, professores, estaremos formando o nosso aluno para servir de escravo em empresas multinacionais.

Enquanto as universidades, as escolas de 1º e 2º graus, a igreja e as empresas realmente nacionais não organizarem um trabalho integrativo e participativo, permaneceremos sempre nas dimensões de senhor-escravo; escola de elite-analfabetos; dívida externa; salário mínimo; riqueza-miséria.

NOTAS DE REFERÊNCIAS

(*) Conferência proferida nos Seminários das Áreas Educacionais da Secretaria da Educação.

  • 1 RIBEIRO, Darcy. Nossa escola é uma calamidade Rio de Janeiro, Salamandra, 1984.
  • 2 LEGRAND, Louis. Pour une politique démocratique de l'education Paris, PUF, 1977.
  • 3 GARAUDY, Roger. Ainda é tempo de viver São Paulo, Vozes, 1980.
  • 4 BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação São Paulo, Brasiliense, 1985.
  • 5 LHOTELLIER, A. La formation en question Paris, Payot, 1974.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1985
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