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Afrique en dialogue, Afrique en auto-questionnement: universalisme ou provincialisme? "Compromis d'Atlanta" ou initiative historique?

África em diálogo, África em autoquestionamento: universalismo ou provincialismo? "Acomodação de Atlanta" ou iniciativa histórica?

Africa in dialogue, Africa in self-questioning: universalism or provincialism? "Atlanta Accommodation" or historical initiative?

Abstracts

L'article analyse la relation entre l'Europe et l'Afrique, en discutant comment la condition (post) coloniale maintient une tension entre deux différentes interprétations de cette relation. Dans un premier temps il indique comment des affirmations contemporaines dans lesquelles l'Afrique n'a pas d'histoire, a des racines profondes dans l'interprétation de savants européens que se posent des questions à propos du degré d'humanité du Noir (Kant, Hume, Voltaire, Montesquieu, Condorcet), au sujet des Africains et de l'Afrique. Dans ça démarche le texte fait une analyse critique des théories d'existence de l'âme noire. L'analyse nous amène à la discussion de comment la "question nationale" comme remplaçante de la "question sociale" a contribué à l'organisation d'une culture du servilisme qui maintient le colonisateur éloigné des conditions objectives de la citoyenneté moderne. La conclusion de l'article est que "une ancienne question n'as pas été réglée, celle de l'unité négative ou de la polarisation du monde. Les philosophes de la libération concevaient nettement la suppression de cette contradiction comme le Centre capitaliste. Cette approche implique-t-elle le retourne de l'initiative historique à la Périphérie, selon la perspective d'Aime Césaire, Kwame Nkrumah, Marcien Towa, Samir Amin. L'idée de scission, de séparation du corps de l'Empire, visait un objectif transcendant qui est l'intégration des individus et des nations de l'Afrique et du Sud dans un grand projet universel commun, dans l'indépendance, dans l'égalité et dans la réciprocité".

Afrique; colonialisme; philosophie africaine


O artigo analisa a relação entre Europa e África, discutindo como a condição (pós-)colonial mantém uma tensão entre duas diferentes interpretações dessa relação. Num primeiro momento, aponta que afirmações contemporâneas de que a África não tem história têm raízes profundas em interpretações de pensadores europeus que se indagam sobre o grau de humanidade do negro (Kant, Hume, Voltaire, Montesquieu, Condorcet), sobre africanos e sobre a África. Nas seções seguintes, o texto faz uma análise crítica das teorias de existência de uma alma negra. A análise recai na discussão sobre como a "questão nacional" como substituta da "questão social" operou para a organização de uma cultura do servilismo que mantém o colonizado afastado das condições objetivas da cidadania moderna. A conclusão do artigo é que "uma antiga questão não foi resolvida, a da unidade negativa ou da polarização do mundo. Os filósofos da libertação encaravam claramente a supressão dessa contradição fundamental pela desconexão, a saída do Império, a ruptura dos laços de servidão com o centro capitalista. Essa abordagem implicava a retomada da iniciativa histórica pela periferia, segundo a perspectiva de Aimé Césaire, Kwame Nkrumah, Marcien Towa, Samir Amin. A ideia de cisão, de separação do corpo do Império, visava a um objetivo transcendente que é a integração dos indivíduos e das nações da África e do Sul em um grande projeto universal comum, na independência, na igualdade e na reciprocidade".

África; colonialismo; filosofia africana


The article analyzes the relationship between Europe and Africa, discussing how the (post) colonial condition maintain a tension between two different interpretations of this relationship. At first it points as contemporary statements that Africa has no history has deep roots in interpretations of European thinkers who ask about the degree of Negro humanity (Kant, Hume, Voltaire, Montesquieu, Condorcet), about Africans and about Africa. In the following text sessions, it presents a critical analysis of the existence theories of a black soul. The analysis rests on the discussion of how the "national question" as a substitute for the "social question" operated for the organization of a culture of sycophancy that keeps the colonized away from the objective conditions of modern citizenship. The conclusion of the article is that "an old issue has not been resolved, the unit or the negative polarization of the world. The philosophers of the release clearly regarded the suppression of this fundamental contradiction by disconnecting the output of the Empire, the rupture of the bonds of servitude to the capitalist center. This approach involved the recovery of historical initiative by Periphery, from the perspective of Aimé Césaire, Kwame Nkrumah, Marcien Towa, Samir Amin. The idea of "division, separation of the body of the Empire, sought a transcendent goal which is the integration of individuals and nations in Africa and South America on a big universal joint project, independence, equality and reciprocity".

Africa; colonialism; African philosophy


TRADUÇÃO

Afrique en dialogue, Afrique en auto-questionnement: universalisme ou provincialisme? "Compromis d'Atlanta" ou initiative historique?

África em diálogo, África em autoquestionamento: universalismo ou provincialismo? "Acomodação de Atlanta" ou iniciativa histórica?1 1 Tradução de Roberto Jardim da Silva.

Africa in dialogue, Africa in self-questioning: universalism or provincialism? "Atlanta Accommodation" or historical initiative?

Nkolo Foé

Coordonnateur local de l'Atelier Méthodologique Régional du Conseil pour le Développement des Sciences Sociales en Afrique (CODESRIA); Collaborateur expert scientifique de l'Agence universitaire de la Francophonie; Chef du Département de Philosophie, Ecole normale supérieure, Université de Yaoundé. Camarões. E-mail: nkolofoe@hotmail.com

RÉSUMÉ

L'article analyse la relation entre l'Europe et l'Afrique, en discutant comment la condition (post) coloniale maintient une tension entre deux différentes interprétations de cette relation. Dans un premier temps il indique comment des affirmations contemporaines dans lesquelles l'Afrique n'a pas d'histoire, a des racines profondes dans l'interprétation de savants européens que se posent des questions à propos du degré d'humanité du Noir (Kant, Hume, Voltaire, Montesquieu, Condorcet), au sujet des Africains et de l'Afrique. Dans ça démarche le texte fait une analyse critique des théories d'existence de l'âme noire. L'analyse nous amène à la discussion de comment la "question nationale" comme remplaçante de la "question sociale" a contribué à l'organisation d'une culture du servilisme qui maintient le colonisateur éloigné des conditions objectives de la citoyenneté moderne. La conclusion de l'article est que "une ancienne question n'as pas été réglée, celle de l'unité négative ou de la polarisation du monde. Les philosophes de la libération concevaient nettement la suppression de cette contradiction comme le Centre capitaliste. Cette approche implique-t-elle le retourne de l'initiative historique à la Périphérie, selon la perspective d'Aime Césaire, Kwame Nkrumah, Marcien Towa, Samir Amin. L'idée de scission, de séparation du corps de l'Empire, visait un objectif transcendant qui est l'intégration des individus et des nations de l'Afrique et du Sud dans un grand projet universel commun, dans l'indépendance, dans l'égalité et dans la réciprocité".

Mots-clés: Afrique; colonialisme; philosophie africaine.

RESUMO

O artigo analisa a relação entre Europa e África, discutindo como a condição (pós-)colonial mantém uma tensão entre duas diferentes interpretações dessa relação. Num primeiro momento, aponta que afirmações contemporâneas de que a África não tem história têm raízes profundas em interpretações de pensadores europeus que se indagam sobre o grau de humanidade do negro (Kant, Hume, Voltaire, Montesquieu, Condorcet), sobre africanos e sobre a África. Nas seções seguintes, o texto faz uma análise crítica das teorias de existência de uma alma negra. A análise recai na discussão sobre como a "questão nacional" como substituta da "questão social" operou para a organização de uma cultura do servilismo que mantém o colonizado afastado das condições objetivas da cidadania moderna. A conclusão do artigo é que "uma antiga questão não foi resolvida, a da unidade negativa ou da polarização do mundo. Os filósofos da libertação encaravam claramente a supressão dessa contradição fundamental pela desconexão, a saída do Império, a ruptura dos laços de servidão com o centro capitalista. Essa abordagem implicava a retomada da iniciativa histórica pela periferia, segundo a perspectiva de Aimé Césaire, Kwame Nkrumah, Marcien Towa, Samir Amin. A ideia de cisão, de separação do corpo do Império, visava a um objetivo transcendente que é a integração dos indivíduos e das nações da África e do Sul em um grande projeto universal comum, na independência, na igualdade e na reciprocidade".

Palavras-chave: África; colonialismo; filosofia africana.

ABSTRACT

The article analyzes the relationship between Europe and Africa, discussing how the (post) colonial condition maintain a tension between two different interpretations of this relationship. At first it points as contemporary statements that Africa has no history has deep roots in interpretations of European thinkers who ask about the degree of Negro humanity (Kant, Hume, Voltaire, Montesquieu, Condorcet), about Africans and about Africa. In the following text sessions, it presents a critical analysis of the existence theories of a black soul. The analysis rests on the discussion of how the "national question" as a substitute for the "social question" operated for the organization of a culture of sycophancy that keeps the colonized away from the objective conditions of modern citizenship. The conclusion of the article is that "an old issue has not been resolved, the unit or the negative polarization of the world. The philosophers of the release clearly regarded the suppression of this fundamental contradiction by disconnecting the output of the Empire, the rupture of the bonds of servitude to the capitalist center. This approach involved the recovery of historical initiative by Periphery, from the perspective of Aimé Césaire, Kwame Nkrumah, Marcien Towa, Samir Amin. The idea of "division, separation of the body of the Empire, sought a transcendent goal which is the integration of individuals and nations in Africa and South America on a big universal joint project, independence, equality and reciprocity".

Keywords: Africa; colonialism; African philosophy.

Apresentação da problemática: o equívoco de um diálogo

Nós evocamos nesse trabalho o difícil diálogo entre a Europa (Ocidente) e a África (com suas diásporas). Desde cinco séculos de fato, os dois continentes vizinhos só parecem dialogar sobre o modo da violência e da opressão, do insulto e da estigmatização, do ódio e do desprezo. O discurso do ex-presidente da República francesa, Sr. Nicolas Sarkozy, na Universidade de Dakar, no dia 26 de julho de 2007, administrou uma prova disso. Ele declara então:

O drama da África é que o homem africano não entrou totalmente na história. O camponês africano, que desde milhares de anos vive conforme as estações, cujo ideal de vida é estar em harmonia com a natureza, só conhece o eterno recomeço do tempo ritmado pela repetição sem fim dos mesmos gestos e das mesmas palavras. Nesse imaginário onde tudo recomeça sempre, não há lugar nem para a aventura humana, nem para a ideia de progresso. Nesse universo onde a natureza comanda tudo, o homem escapa à inquietude da história que inquieta o homem moderno. Mas o homem permanece imóvel no meio de uma ordem imutável, onde tudo parece ser escrito antes. Nunca ele se lança em direção ao futuro. Nunca não lhe vem à ideia de sair da repetição para se inventar um destino.2 2 "Discours de M. Nicolas Sarkozy, Président de la République française, le 26 juillet 2007 à Dakar. Contexte, enjeux et non-dits". In: Sarkozy, la controverse de Dakar, Cours Nouveau. Revue Trimestrielle de Stratégie et de Prospectrive, Revisiting Iussues, Repensar a África Hoje, n. 1-2, maio-oct. 2008, p. 80-81.

Na sua relação com a África, a permanência da Europa está aqui, no equívoco, mas, sobretudo, na estigmatização. O próprio Victor Hugo não escapou a isso. O "Discurso sobre a África", pronunciado em 18 de maio de 1879, durante um banquete comemorativo da abolição da escravatura, pode ser visto não só como um vibrante apelo em favor do diálogo entre as duas margens do Mediterrâneo, mas também como um apelo apaixonado para a dominação desse continente.

Primeiramente, o diálogo com a África. Hugo apresenta de fato o Mediterrâneo como um lago de civilização. Mas ele constata que esse lago é ao mesmo tempo uma fronteira. Com efeito, existe "em uma de suas margens o velho universo e na outra o universo ignorado, ou seja, de um lado toda a civilização e do outro a barbárie". Hugo chama então as nações europeias a cooperarem-se para "ir ao Sul", enfrentar essa "barreira" que está "em frente de vocês, esse bloco de areia e de cinza, esse pedaço inerte e passivo que, desde seis mil anos, se colocou como obstáculo ao desenvolvimento universal, esse monstruoso Cam que deixa imobilizado Sem por sua enormidade – a África".

A palavra que incomoda é pronunciada: a marcha da civilização. Pois, essa civilização é justamente a da Europa e do Ocidente! Ora, Hugo define a África com uma palavra severa: a África é um continente sem história! Ele diz mais precisamente: "A Ásia tem sua história, a América tem sua história, a Austrália ela própria tem sua história; a África não tem história".

Hugo está convencido que um "tipo de lenda vasta e obscura envolve" a África. Ele cita a Roma antiga, que entrou em contato com África para suprimi-la; e, quando a Roma pensou que estava livre da África, ela jogou sobre essa "morte imensa" um desses epítetos que não se traduzem: – África portentosa!

Confrontado com essa "assustadora", esse "horror", esses "mistérios insondáveis", Hegel já expressou sua surpresa. Ele afirmava: "Aquele que quer conhecer as manifestações assustadoras da natureza humana pode encontrá-las na África [esse continente] do homem em estado bruto [...] no estado de selvageria e de barbárie [e onde] todos os homens são feiticeiros" (HEGEL, 2009, p. 269).

Depois de ter decretado que esse continente "não tem uma história propriamente dita", Hegel decide que aqui ele deixa a África para não mais fazer menção a ela mais tarde. Pois ela não faz parte do mundo histórico; ela não mostra nem movimento, nem desenvolvimento. Tudo o que aconteceu no Norte deste continente releva diretamente dos mundos asiático e europeu. Cartago foi certamente um elemento importante, mas passageiro. Para Hegel, Cartago pertencia à Ásia e era uma colônia fenícia (HEGEL, 2009, p. 269). Então, para Hegel, a Europa não tem nenhum interesse em dialogar com esse continente do assustador e sem futuro: "África portentosa!".

Mas entre Hegel e Hugo existe uma diferença importante. Hegel conta a história do mundo, enquanto Hugo tenta inventar novos mundos. Então, Hugo zomba dos covardes, que acreditam que "ver a África é ser cegado". Os mesmos recuam diante de que "um excesso de sol é um excesso de noite". Hugo louva então os esforços de "dois povos colonizadores, que são dois grandes povos livres, a França e a Inglaterra", que empunham a África, um pelo oeste e pelo norte (a França), outro pelo leste e pelo sul (a Inglaterra). Ele felicita a iniciativa da Itália, que "aceita sua parte nesse trabalho colossal", e a da "América [que] une seus esforços aos nossos". Com certeza, "a unidade dos povos se revela em tudo" e "a África é importante para o universo, [pois] tal supressão de movimento e de circulação é um entrave para a vida universal, e o desenvolvimento humano não pode se acomodar mais muito tempo porque um quinto do globo está paralisado", e é bom que "esse universo que assustava os romanos atrai os franceses". Hugo saúda a "grande caminhada tranquila em direção à harmonia, à fraternidade e à paz" universais; ele saúda, sobretudo, a obra civilizatória da Europa branca. Pois, para ele, a história reterá que "no século XIX, o branco fez do negro um homem; no século XX, a Europa fará da África um mundo". A tarefa essencial do futuro é então imensa, pois o problema crucial a ser resolvido pela Europa é o de "refazer uma África nova", isso significa abrir essa "velha África à civilização".

Tal tarefa exige um grito de agrupamento para incentivar os povos da Europa a tomar esse continente que não pertence a ninguém e que Deus, ele mesmo, coloca à disposição do mundo civilizado:

Vão povos! Se apropriem dessa terra. Tomem-na-la. A quem? A ninguém. Tomem essa terra a Deus. Deus dá a terra aos homens, Deus oferece a África à Europa. Tomem-na-la. Onde os reis levariam a guerra, levem a concórdia. Tomem-na-la, não pelos canhões, mas pelo arado; não pela espada, mas pelo comércio; não pela batalha, mas pela indústria; não pela conquista, mas pela fraternidade.

Mas, apesar da fraternidade proclamada, Hugo termina seu discurso com uma revelação significativa em relação à solução da questão social na Europa: a colonização permitirá à Europa resolver seus próprios problemas de desemprego. Para ele, a Europa deve despejar sua sobra de população desempregada na África. Mas, há mais: na África, é possível transformar os proletários europeus em proprietários. A ideia de Hugo consiste em expulsar a Igreja e o Estado para estabelecer os donos, os empresários e os comerciantes, que constituem, para Hugo, a melhor garantia de paz e de liberdade: "Vão, façam! Façam estradas, façam portos, façam cidades; cruzem, cultivem, colonizem, multipliquem; e que, nessa terra cada vez mais libertada de sacerdotes e de príncipes, o Espírito divino se afirma pela paz e o Espírito humano pela liberdade!"

Desde cinco séculos, discursos deste tipo se expressam com nuanças, mas, quanto a sua essência, eles não variam muito. Pois, bem instalada sobre o duplo trono da Grécia e de Roma, a Europa pretende encarnar o Universal, a Razão, a Ideia.

Essa pretensão de um continente particular ao universal sempre colocou um enigma insondável aos povos oprimidos que contestam a dominação política, econômica e cultural do Ocidente. Para a África, o dilema é então o seguinte: afirmar-se a si mesmo como sujeito histórico universal ou afirmar sua essência, seu provincianismo e opor esses últimos à essência e ao provincianismo da Europa. Nesse caso, e em nome da "democracia cultural", da igual dignidade de todos os povos e de todas as culturas, a Europa não seria mais que uma província cultural entre outras, em um mundo étnica e culturalmente fragmentado (CHAKRABARTY, 2009). Todos os debates atuais que giram em torno da alteridade e da diversidade, do multiculturalismo, do hibridismo, do diferente e do choque das civilizações relevam deste princípio fundamental. Durante os anos de lutas nacionais da libertação até aqueles que se seguiram imediatamente às independências políticas dos anos 1960, esses debates foram muito vivos na África. O contexto e a história o exigiam: uma resposta teórica e ideológica era necessária à negação da humanidade negra.

Nos tempos modernos, a África é de fato o continente que viu suas crianças reduzidas a escravos e deportados, seus territórios ocupados e colonizados, suas religiões e suas línguas destruídas e substituídas. Hoje, toda a África negra é muçulmana ou cristã; ela se comunica em francês, em inglês, em português, em espanhol e às vezes em alemão e em italiano, línguas da Europa imperial. O mundo veio para África e a dominou; então, a África devia pensar esse mundo para compreendê-lo: compreender seu espírito, suas intenções, inclusive seu comportamento. O comportamento da Europa!

Pois, todos os povos vencidos pela Europa desde o século XV estavam mais ou menos na situação do Inca, surpreendido pelo estranho comportamento de Pizarro. Com confiança, o Inca pensava acolher um amigo, mas ele descobriu com espanto e terror que ele estava lidando com um ladrão criminoso.3 3 Chegando ao Peru, F. Pizarro e suas tropas não pareciam representar uma ameaça. Pelo contrário, a lenda local dizia que o deus Viracocha voltaria sobre a terra pelo mar para trazer a paz e a prosperidade depois de décadas de sofrimento. Atahualpa tem Pizarro como um deus mítico. É, então, de um encontro que deveria ser amigável que os Incas foram capturados. Atahualpa expressa seu espanto, mas o Imperador ignorava os objetivos estúpidos do Espanhol. Ele foi executado. É assim que o Ocidente se proíbe todo diálogo com os vencidos, pela violência e o desprezo. É essa atitude que a filosofia ibero-americana, apesar de suas nuanças, teoriza desde pelo menos o século XVIII.

Sobre a África, por exemplo, os filósofos se interrogam sobre a humanidade – ou o grau de humanidade – do Negro. Essa questão é significativa, pois a defesa ou a condenação da escravidão, a legitimidade ou a ilegitimidade do racismo, a tolerância ou a negação do princípio de reciprocidade entre os povos, dependem da inclusão ou da exclusão do Negro na humanidade comum, a aceitação ou a rejeição do Negro como irmão em humanidade.

A humanidade africana posta em questão

A questão da humanidade dos povos vencidos pela Europa desde o século XV aparece como uma terrível repetição dos dramas sagrados da mitologia antiga. O que caracteriza de fato as narrativas de fundação das sociedades fundadas seja sobre o genocídio seja sobre a escravidão é a permanência de temas agonísticos.

Esses últimos contam os dramas sagrados característicos dos tempos primordiais. As cosmogonias e os mitos de autoctonia falam de lutas violentas entre o cosmos e o caos primitivo, a ordem e a desordem, a justiça (dikè) e a desmedida (hybris). De um ponto de vista teogônico, esses dramas são o reflexo da contradição irredutível entre os antigos deuses vencidos e a jovem geração de deuses. O aspecto propriamente político – de inspiração colonial – dessa contradição fundamental é em relação às façanhas e à ação civilizadora de um herói vindo seja do estrangeiro seja do céu, e que toma posse do território e o "cosmiza". A cosmização ou a civilização dos países conquistados acaba simbolicamente pela captura, pela matança ou pela escravidão do indígena, que toma então a figura do monstro ou do dragão.

É em termos parecidos que se inaugurou a história trágica dos povos vencidos pelo Ocidente nos tempos modernos. Pierre Quillet (1976) destaca um paradoxo estranho entre os apologistas da escravidão negra. A barbárie e a selvageria da qual falam esses últimos não indicam a desumanidade, a violência e os crimes dos assassinos (os negreiros), mas, pelo contrário, o baixo nível de civilização, de cultura, de moralidade e de humanidade das vítimas (os negros) (QUILLET, 1976, p. 58). A conduta estranha de Pizarro é emblemática de uma visão do mundo que faz com que o Ocidente pareça incapaz de ir ao encontro dos outros povos como um amigo, mas como um conquistador; raramente como um aliado, mas constantemente como um adversário; jamais como um parceiro, mas sempre como um mestre. O Ocidente se recusa a dialogar com os outros povos porque ele não gosta muito do princípio da igualdade e da reciprocidade com os vencidos. O Ocidente se proíbe tal diálogo porque ele decreta a inferioridade congênita do Outro ou do vencido. Esse decreto explica a exclusão do negro da humanidade comum e sua transformação em coisa.

A descoberta da Razão e do Universal poderia ter justificado a revogação desse decreto. Mas o problema foi que a Razão e o Universal formulados surgiram no coração de um regime econômico e social fundado sobre a produção e a reprodução das desigualdades. A Europa dos tempos modernos não redescobre então a escravidão antiga por acaso. Quer dizer que a proclamação teórica do reino universal da Razão colide com a realidade concreta do capitalismo. A crítica hoje do Iluminismo, em uma impaciência cômica e um estilo exagerado,4 4 Ver, sobre esse assunto, as observações de Jean-Paul Doguet sobre os trabalhos de Louis-Sala Molins, Les Misères des Lumières. Paris: Robert Laffont, 1992; e de Christian Delacampagne, Une Histoire de l´esclavage. Paris: Le Livre de Poche, 2002. Jean-Paul Doguet, in Condorcet, Réflexions sur l´esclavage des Nègres, "Présentation", p. 10-11. evita essas questões tão essenciais para Marx e que remetem, na verdade, aos segredos da acumulação primitiva. Trata-se: da descoberta das terras ricas em ouro e em prata da América; da redução dos indígenas em escravos, de seu enterro nas minas ou de sua exterminação; da conquista e da pilhagem dos índios; da transformação da África em um tipo de lugar de reserva comercial para a caça das peles negras; da criação de monopólios de direito (exemplo clássico da Companhia das Índias Orientais); de matérias-primas fornecidas às manufaturas da Europa etc. O que importa então, se os ideólogos da supremacia ocidental moderna contestem o que era tão evidente para os próprios homens da época da qual se trata?5 5 Ver, por exemplo, Raymond Aron, Plaidoyer pour l´Europe décadente. Paris: Robert Laffont, 1977; Jacques Marseille, Empire colonial et capitalisme français. Histoire d´un divorce. Paris: Albin Michel, 2005.

Seguindo a linha de Marx, é fácil perceber que a questão do estatuto servil do Negro se inscreva em um conjunto mais vasto de questões em relação à preocupação de conhecer a origem das desigualdades entre os homens e as sociedades. Grotius, Locke, Rousseau, Hume, Hobbes abordam essas questões essenciais porque eles têm uma tripla experiência das desigualdades: primeiro, as desigualdades próprias ao antigo regime dominado pela nobreza; em seguida, as desigualdades induzidas pelas novas relações capitais; e, enfim, as desigualdades originadas da escravidão.

É necessário considerar esse debate em sua globalidade, porque ele concerne tanto às sociedades europeias em si como às sociedades dominadas pela Europa.6 6 Cf. El Hadj Ibrahima Diop. Lieux d'écritures et compréhension différenciées de l'Afrique dans l'anthropologie de Kant et de G. Forster. Ethiopiques, n. 80, 1er semestre 2008. A maior falha do Iluminismo é ter sido incapaz de articular todas essas questões. E Marx explica a razão dessa incapacidade pelos fatos da história econômica e política: em particular, o domínio das relações capitalistas fez com que a igualdade com a nobreza reivindicada pela burguesia não podia implicar automaticamente a igualdade nem com a classe trabalhadora dominante na Europa nem com os povos subjugados nas colônias.

Vemos aqui os caminhos pelos quais os imperativos da produção e da reprodução das relações capitalistas inclinaram muitos filósofos em direção à linha filosófica aberta, por exemplo, por Aristóteles. As coisas se passaram como se a redescoberta da escravidão antiga não pudesse funcionar sem a revitalização das doutrinas que legitimavam essa prática. Aristóteles explica as desigualdades entre os homens não pela causalidade histórica, mas pelo determinismo natural. A política ensina, com efeito, a identidade das relações entre o homem e os outros animais; ela insiste sobre o fato de que os animais domésticos são de uma natureza bem melhor que os animais selvagens. Aristóteles exige a submissão de todos à autoridade do homem. Da mesma maneira, ele quer que a relação entre o macho e a fêmea seja por natureza uma relação entre o mais forte e o mais fraco, quer dizer, entre aquele que comanda e aquele que obedece. O mesmo tipo de relação existe necessariamente entre todos os homens.

A consequência lógica que Aristóteles tira desse pensamento é que todos aqueles que ocupam uma posição inferior à de homens livres (exatamente como o corpo ocupa uma posição inferior à da alma7 7 É o destino normal dos homens cuja atividade essencial baseia-se no uso de seus corpos para o benefício de outra pessoa. ) são por natureza escravos. Ele especifica que, é por natureza escravo aquele que é destinado a pertencer a outro e que só tem a razão em partilha na medida em que a percebe nos outros homens, mas que não a possui por si mesmo. Aristóteles reconhece certamente que, contrariamente à escravidão humana, os animais não percebem nem mesmo a razão, mas ele afirma que no uso concreto, existem poucas diferenças entre os escravos e os animais domésticos, dado que todos executam as mesmas tarefas físicas comandadas pelo homem livre. Sem nuanças, tal definição o inclina a excluir o escravo da humanidade comum.

As mesmas razões econômicas e políticas explicam por que essa teoria assimétrica comanda, consciente ou inconscientemente, as concepções das figuras marcantes do Iluminismo sobre a África. Tomemos, por exemplo, a antropologia filosófica de Hume e de Kant. Os dois estão convencidos da inferioridade congênita dos Negros.

Em seu tratado Sobre as características nacionais, Hume afirma que os Negros são, por natureza, inferiores aos Brancos. A prova é que nunca existiu uma nação civilizada, nem indivíduo ilustrado por suas ações ou por sua capacidade de reflexão, dessa cor; a manufatura, a arte e a ciência lhes são desconhecidas e, em nenhuma parte entre os Negros escravos, não se pôde detectar o menor traço de inteligência: "I am apt to suspect the Negroes naturally inferior to the Whites. There scarcely ever was a civilized nation of that complexion, nor ever any individual, eminent either in action or speculation. No ingenious manufactures amongst them, no arts no science".

Para convencer, Hume compara a barbárie do Negro mais evoluído com a do Branco mais grosseiro. Dessa comparação, que revela a existência de um potencial de progresso entre esses últimos, ele conclui que tal diferença constante e invariável – no tempo e no espaço – não teria sido possível sem a intervenção da própria natureza, preocupada em distinguir radicalmente as diferentes raças de homens. Hume rejeita, de antemão, o argumento histórico-social que tentaria explicar o déficit intelectual dos Negros por sua servidão. Ele cita então o caso de antigos escravos libertados nas colônias e na Europa e que não teriam nunca conseguido sair de sua condição inicial, contrariamente aos mais modestos dos Brancos que, por seu esforço pessoal, são capazes de se distinguir nas suas profissões mais diversas.

Alguém fala a ele de um Negro de talento versado nos estudos na Jamaica? Hume responde que as pessoas indulgentes podem admirar esse indivíduo só por algumas obras medíocres que esse indivíduo produz; mas, de toda maneira, o Negro não é diferente do papagaio que se contenta em balbuciar algumas palavras aprendidas (HUME, s/d., p. 213).

A antropologia de Kant é de um caráter patético. A razão é que Kant parece perceber a dificuldade em escolher entre os princípios que remetem à "antropologia fisiológica", por um lado, e aqueles que se relacionam à "antropologia pragmática", por outro. O primeiro trata dos processos de transformação do homem pela natureza enquanto o segundo nos fala dos meios que se dá o homem para transformar sua própria natureza. É aqui que intervém o conceito de liberdade como o núcleo dessa antropologia.

Os problemas de Kant começam a partir da sua decisão de excluir a questão da raça da antropologia pragmática. Ele admite a unidade do gênero natural; ele explica a diversidade das raças pelas necessidades de adaptação (que é a condição de sobrevida da espécie). A anatomia e a climatologia lhe permitem, com efeito, afirmar que possivelmente os Negros e os Brancos pertencem à mesma espécie de homens, mas que a diversidade do solo e do clima teria causado uma diferenciação de linhagens. Por exemplo, um clima quente e úmido era favorável à aparição de uma espécie com nariz arrebitado, com lábios grossos, com a pele oleosa (para frear a evaporação, mas também para impedir a absorção da umidade e dos venenos do ar).

Mas a teoria do clima não pode tudo explicar. Por exemplo, a coexistência, no mesmo homem, de agilidade do corpo, da fraqueza e da frivolidade do caráter. A antropologia nascente é uma "tentativa de conhecer o outro, o outro estranhamente diferente, a corporeidade do outro e sua estranheza extrema" (DIOP, 2008). Era uma armadilha viciosa. Kant foi incapaz de evitar essa armadilha. É porque ele convoca de maneira ignóbil a autoridade de Hume para declamar seus julgamentos categóricos sobre os Negros. Por exemplo: os negros da África não possuem, por natureza, nenhum sentimento que se eleve acima do ridículo. Ele continua dizendo que Hume desafia que alguém cite um negro que provou ter alguns talentos. Segundo Hume, com efeito, dentre o grande número de homens de cor preta que foram conduzidos na Europa e aos quais se deu a liberdade, não se encontrou um único sequer que se destacou particularmente nas ciências ou na arte ou em quaisquer outras qualidades morais. Por Hume, a diferença entre o branco e o negro é muito grande e real de um ponto de vista das disposições naturais. Com esse ensino, Kant pôde reduzir a religião dos Negros a fetiches e à idolatria: uma pena de pássaro, um chifre de vaca, uma concha ou qualquer coisa ordinária, logo que alguma palavra os consagrar, tornam-se objetos de adoração e invocação sob juramento. Kant conclui que os Negros são muito vaidosos, mas à sua própria maneira e tão palradores que é necessário que se deva dispersá-los a pauladas! (KANT, 1823, p. 184-186).

A referência ao chicote nos permite compreender que o pano de fundo dessas imbecilidades sobre o estatuto equívoco do Negro na hierarquia dos vivos são, afinal de contas, a escravidão em si e a questão colonial. Voltaire e Montesquieu abordam essas questões de maneira frontal e sem muito escrúpulo.

O caso de Voltaire

Ele começa por uma questão simples: a afirmação do amor para a ordem como "uma das molas da natureza [na origem do] código das nações" (VOLTAIRE, 1963, p. 808). Mas, segundo ele, a existência desse código não impede de qualquer maneira a afirmação da unicidade da natureza humana. Voltaire chega mesmo a dizer que tudo que pertence intimamente a essa natureza é semelhante de um lado ao outro do universo; que todas as raças da terra, todos os povos, obedecem aos mesmos princípios de base e todos têm as "leis estabelecidas para a conservação da família etc."; que "existe em todo lugar um freio imposto ao poder arbitrário pelas leis, pelos usos ou pelos costumes"; que "a religião ensina a moral a todos os povos do mundo sem exceção" etc. (VOLTAIRE, 1963, p. 808-809).

Sobre a diversidade das culturas e das civilizações, Voltaire dá prova de sagacidade quando ele mostra que só o costume pode explicar essa diversidade e não a natureza. O costume introduz a diversidade no fundo comum e único da natureza humana, porque seu império,

mais vasto que o da natureza [...] se estende sobre todos os hábitos, sobre todos os usos; ele espalha a variedade no espaço do mundo inteiro. Isso significa que a natureza espalha sobre ele a unidade; ela estabelece em toda parte um pequeno número de princípios invariáveis: assim o fundo é o mesmo em toda parte e a cultura produz frutos muito diversos (VOLTAIRE, 1963, p. 810).

Partindo do princípio de unicidade da natureza humana e do direito de todos os homens à cidadania universal, Voltaire critica a perseguição de certas nações por outras, porque tal perseguição transgrede os princípios de base do código das nações. Assim, ele julga severamente os traficantes de escravos, vistos como "uma tropa de ladrões".

Vigorosamente, Voltaire interpela a consciência da Europa, cúmplice da barbárie desses "heróis do banditismo" que forçam os Negros a trabalhar duramente "nas fábricas de açúcar, nas plantações de índigo, de cacau". Assim, os Negros "abreviam suas vidas para satisfazer nossos novos apetites" (VOLTAIRE, 1963, p. 379). Dirigindo-se diretamente aos traficantes, ele escreve:

Nós os dizemos [aos Negros] que eles são homens como nós, que eles são redimidos pelo sangue de um Deus morto por eles [mas] nós os fazemos trabalhar como animais de carga: nós os alimentamos [...] mal; se eles querem fugir, cortamos-lhes uma perna, e os fazemos girar com os braços os moinhos de açúcar. Depois disso, nós ousamos falar dos direitos dos homens! (VOLTAIRE, 1963, p. 380).

Essa condenação da escravidão é muito firme, mas, ao mesmo tempo e inexplicavelmente, o autor dessa condenação solene afirma:

Compramos escravos domésticos só no país dos negros. Nós somos criticados por esse comércio: um povo que vende seus filhos é bem mais condenável que o comprador; esse negócio demonstra nossa superioridade; aquele que se dá a um mestre nasceu para ter um mestre (VOLTAIRE, 1963, p. 380).

Mas o pior é que Voltaire insiste sobre a inferioridade dos Negros para legitimar sua servidão. A prova para ele é a existência da diferença e da permanência das características das nações que mudam raramente. Isto explica o fato de que "os Negros são os escravos dos outros homens. Nós os compramos nas costas da África como animais". Voltaire detalha os motivos dessa inferioridade que é, antes de tudo, física: os Negros têm os olhos arredondados, o nariz achatado, os lábios sempre grossos, as orelhas diferentemente desenhadas, a lã sobre a cabeça etc. A inferioridade é também intelectual. Segundo Voltaire, a medida de sua inteligência mostra as diferenças prodigiosas entre os Negros e outras espécies de homens. Ele reconhece que a inteligência dos Negros não é de uma natureza diferente em relação ao entendimento do branco, mas, ele sublinha sua inferioridade. Por exemplo, os Negros

não são capazes de uma grande atenção, eles calculam pouco e não parecem feitos nem para as vantagens, nem para os abusos de nossa filosofia. Eles são originários dessa parte da África como os elefantes e os macacos; eles acreditam que nasceram em Guiné para serem vendidos aos Brancos e para servi-los.

O caso de Montesquieu

Entre os outros pensadores equivocados desse mesmo período, o caso de Montesquieu é também muito patético e seu ponto de vista sobre a escravidão dos Negros é, pelos menos, ambíguo.

Existe atualmente uma viva polêmica sobre a questão de saber se Montesquieu era racista ou não, antiescravista ou não. Abordar o problema sob esse ângulo é abordá-lo mal. O que importa para mim é o espírito da época, que é o reflexo das contradições históricas de um regime econômico e social hesitando entre a sede de liberdade – deixada a si própria, a liberdade produz necessariamente as diferenças e as desigualdades – e a exigência de fraternidade e de igualdade universais. Insistir sobre o imperativo de fraternidade e de igualdade em um regime de liberdade é lembrar a todos que não estamos livres de explorar ou de oprimir o irmão; que não temos o direito de tomá-lo como um inferior, por causa de sua fraqueza ou de sua inaptidão suposta.

A contradição maior da filosofia dessa época vem então do fato que o cursor da balança pende em favor da liberdade, em detrimento da igualdade e da fraternidade. Então, O espírito das leis não nos surpreende mais, porque Montesquieu reproduz simplesmente os preconceitos da época, seja para aprová-los, seja para recusá-los de maneira equivocada. O simples fato da existência do texto que se segue é então em si mesmo significante:

Se eu tivesse que defender o direito que tivemos de escravizar os negros, eis o que diria: tendo os povos da Europa exterminado os da América, tiveram que escravizar os da África a fim de utilizá-los no desbravamento de tantas terras. O açúcar seria muito caro, se não se cultivasse a planta que o produz pelos escravos. Aqueles a que nos referimos são negros da cabeça aos pés e têm o nariz tão achatado que é quase impossível lamentá-los. Não podemos aceitar a ideia de que Deus, que é um ser muito sábio, tenha colocado uma alma, sobretudo uma alma boa, em um corpo negro. É tão natural pensar que é a cor que constitui a essência da humanidade que os povos da Ásia que fazem eunucos privam sempre os negros da relação que eles têm conosco de uma maneira mais acentuada. Pode-se julgar a cor da pele pela dos cabelos, que entre os Egípcios, os melhores filósofos do mundo, eram de uma tão grande importância que eles matavam todos os homens ruivos que lhes caíam nas mãos. Uma prova de que os negros não têm o senso comum é que eles dão mais atenção a um colar de vidro do que de ouro, fato que, entre as nações civilizadas, é de uma tão grande consequência. É impossível que nós suponhamos que essas gentes sejam homens, porque, se nós os supusermos homens, começaríamos a acreditar que nós próprios não somos nem mesmo cristãos. Os espíritos mesquinhos exageram muito a injustiça que se faz aos Africanos. Pois, se ela fosse tal como eles dizem, não teria ocorrido aos príncipes da Europa, que fazem entre eles tantas convenções inúteis, de fazer uma convenção general em favor da misericórdia e da piedade? (MONTESQUIEU, 1979, p. 393).

Incontestavelmente, esse texto é muito equivocado e é difícil dizer se ele constitui uma crítica irônica da escravidão – como o pretende, por exemplo, a enciclopédia livre on-line Wikipédia – ou então se ele reflete verdadeiramente os preconceitos raciais do autor. Mas, para se ter uma opinião sobre essa questão delicada, é bom se referir a outras passagens de O espírito das leis, onde as afirmações parecem menos irônicas e menos equivocadas.

Montesquieu afirma, por exemplo, que "a maioria das pessoas das costas da África são selvagens ou bárbaros", "eles não possuem indústria" nem arte. A prova da estupidez deles é que os negros nunca souberam tirar proveito dos metais preciosos recebidos em abundância da natureza. Pelo contrário, os povos civilizados sabem como tirar proveito do negócio com eles. Astuciosamente, os brancos persuadem os negros a valorizar muitas coisas de nenhum valor; isto lhes permite receber mercadorias de ótimos preços.

A atitude equivocada em Montesquieu nos revela a contradição profunda que anima a história intelectual dessa época. A dificuldade é a que conhece toda filosofia para pensar ou para se projetar para além do sistema econômico e social que ela traduz ideologicamente. Mesmo defensores mais sinceros da causa dos Negros experimentam essa dificuldades. É o caso de Condorcet, no século XVIII.

O caso de Condorcet

Na sua crítica da escravidão dos Negros e da colonização, Condorcet tem em vista dois objetivos principais: em primeiro lugar, os procuradores, espécies de homens que buscam fazer fortuna fora da Europa porque todos os caminhos honestos de enriquecimento nos seus países estão fechados para eles ou porque sua ganância insaciável não pôde se contentar com uma fortuna moderada. Ora então, constata Condorcet, é a ralé das nações já corrompidas que os negros enfrentam (CONDORCET, 2009, p. 122). Em segundo lugar, Condorcet tem em mira a elite da Europa que legitima os crimes dos bandidos ou que se preocupa só com o destino dos negociantes, no caso da abolição do comércio vergonhoso. Porque o sentido moral dessa elite parece embotado, Condorcet decide acordá-la com rudez. Pois, em nome de qual direito devemos sacrificar "a liberdade e a vida do Negro" para a baixa venalidade do traficante? Para Condorcet, isto é inaceitável. A razão é que não podemos trocar a vida e a liberdade dos negros contra "algumas toneladas de ouro". Em nome de qual moral devemos colocar na balança "o sangue do inocente [...] com a avareza do culpado" (CONDORCET, 2009, p. 123)? Então, Condorcet convida os defensores da servidão dos Negros a se representarem a si mesmos na situação de inocentes condenados abusivamente; ele convida os "doces apologistas da escravidão dos Negros" a imaginar-se escravizados ou privados abusivamente de seus bens: "que pensariam vocês se eu colocasse em princípio que vocês devem ficar sempre acorrentados, mesmo que inocentes, porque não podemos fazê-lo sair disso sem me arruinar?" (CONDORCET, 2009, p. 123).

Mas o pensamento de Condorcet não é nem tão retilíneo nem tão coerente que se possa deixar supor uma leitura superficial de sua obra. Pois, como o sublinha Jean-Paul Doguet (2009, p. 47-48), existem em Condorcet duas posições, que refletem sem dúvida duas personalidades em conflito. Primeiro, um anticolonialismo intelectual próprio ao economista liberal, para quem o monopólio colonial constitui um freio ao crescimento; em seguida, um antiescravismo visceral e filantrópico, que compreende que a persistência de uma ligação colonial constitui a melhor garantia de uma emancipação sem violência de Negros.

Doguet tem razão, pois as vistas enunciadas por Condorcet no 10º período do Esboço de um quadro histórico dos progressos do espírito humano são sem equívoco. Nesse texto, Condorcet critica em primeiro lugar "nosso monopólio de comércio, nossas traições, nosso desprezo sanguinário pelos homens de outra cor ou de outra crença"; ele continua indexando "a insolência de nossas usurpações; o extravagante proselitismo ou as intrigas de nossos sacerdotes" que destroem "esse sentimento de respeito e de benevolência que a superioridade de nosso Iluminismo e as vantagens de nosso comércio haviam a princípio obtido". Em seguida, Condorcet imagina a nova era onde, cessando de lhes mostrar só os corruptos e os tiranos que vêm da Europa, nós nos tornaremos por eles instrumentos úteis, ou generosos libertadores. Ele sublinha então os benefícios de uma colonização econômica civilizadora. Ele afirma que a cultura do açúcar se estabelecendo, por exemplo, no imenso continente da África é capaz de contribuir a destruir "a vergonhosa pilhagem" que corrompe este continente e o despovoa desde dois séculos. Se contendo com um comércio livre, e "muito esclarecidos sobre seus próprios direitos para desprezar os de outros povos, os Europeus respeitarão [então] a independência que eles até aqui violaram com tanta audácia". Em vez de estarem ocupadas pelos protegidos dos governos e aventureiros, as fábricas da Europa na África "se povoarão de homens industriosos". "Assim então, esses negócios de criminosos se tornarão colônias de cidadãos que propagarão na África e na Ásia os princípios e o exemplo da liberdade, a iluminação da razão da Europa".

Condorcet sublinha em seguida, os benefícios de uma colonização espiritual e cultural civilizadora. Aos monges que, nesses países, só traziam vergonhosas superstições, devem suceder homens ocupados em propagar, entre essas nações, as verdades úteis à sua felicidade e capazes de esclarecê-los tanto sobre seus interesses quanto sobre seus direitos.

Para terminar, Condorcet insiste sobre os benefícios da colonização política civilizadora. Ele está bem convencido de que, "para se civilizarem", esses povos esperam "receber da Europa os meios" e "encontrar nos Europeus irmãos, para tornarem-se seus amigos e seus discípulos".

É interessante ver como Condorcet anuncia, desde o século XVIII, o "direito de intervenção humanitária". Pois é o dever moral e político da Europa ajudar as nações escravizadas sob déspotas sagrados ou conquistadores estúpidos. Depois de séculos, esses povos escravizados esperam libertadores. Outro dever da Europa é ajudar as "tribos quase selvagens [privadas] das doçuras de uma civilização aperfeiçoada".

Eis então traçadas as grandes linhas ideológicas da "missão civilizadora", sistematizadas mais tarde, no século XIX. Ora, essa ideologia coexistiu com a antropologia racista a mais ignóbil, dominante nos meios intelectuais. Pois, o objetivo de homens como Gobineau (1967) e de todos os teóricos da antropologia física era acompanhar ideologicamente o movimento de expansão colonial. É assim que a antropologia e a etnologia se tornaram as ciências auxiliares do colonialismo. É por isso que essa orientação da antropologia não escapa à vigilância epistemológica do militante haitiano pelos direitos dos Negros Joseph Antenor Firmin. Conhecemos sua virulenta resposta contra a antropologia de Gobineau: "A toda essa falange arrogante que proclama que o homem negro está destinado a servir de estribo ao poder do homem branco, a essa antropologia mentirosa, eu terei o direito de dizer: Não, você não é uma ciência (1885)".

A causalidade histórica, a questão social e a servidão

A condenação vigorosa é certamente legítima, mas ela não nos instrui suficientemente sobre as causas do mal que corrói os escravagistas e os antiescravagistas, os racistas e os amigos dos Negros. Ora, dois grandes espíritos do século XVIII, invisíveis nos livros de história das ideias, detinham a chave da solução.

A contribuição excepcional de Olympe de Gouges

O primeiro desses belos espíritos é uma energética jovem mulher, Olympe de Gouges, mártir da Revolução francesa – ela foi guilhotinada em 1774 – e autora de dois livros interessantes: A escravidão dos Negros ou o feliz naufrágio (1786)8 8 Olympe de Gouges, L'esclavage des Noirs ou l´heureux naufrage (1786). In: Francophe Slavery. Disponível em: < http://www.uga.edu/slavery/texts/literary_works/eslavage.pdf. e as Reflexões sobre os homens negros (1788).9 9 Olympe de Gouges. In: Francophone Slavery, "Réflexions sur les hommes nègres" (1788). Disponível em: < http://www.uga.edu/slavery/texts/literary_works/olympe_de_gouges_reflexions.pdf.

É interessante notar que esses textos foram publicados no período em que o Código Negro estava ainda em vigor. Nesse último texto, Olympe de Gouges critica diretamente os "Europeus ávidos de sangue e desse metal que a ganância nomeou ouro [e que] mudaram a natureza nesses climas felizes". Por exemplo, é a ganância "que empurrou os homens a vender outros homens ao mercado como bois". Olympe de Gouges se indigna: "Um comércio de homens!... Grande Deus!"; e diante deste crime, "a Natureza não teme!".

Esse grito de horror basta para expressar todo o desgosto que inspira o tráfico. Mas admitamos então que os Negros sejam animais, "não somos como eles? E em que os Brancos diferem dessa espécie?". De Gouges reconhece que a cor faz a diferença entre os Brancos e os Negros, mas para ela, essa diferença é superficial e normal: é o símbolo da diversidade da natureza ela mesma. Assim, "a cor do homem tem vários matizes, como em todos os animais que a Natureza produziu, bem com as plantas e os minerais". Ora, na vida, "tudo é variado" e a "beleza da Natureza" está nesta variedade. Então, por que destruir a obra da Natureza? Alguns ideólogos tratam os negros como brutos ou como seres amaldiçoados pelo Céu; Olympe de Gouges responde que só a força e o preconceito condenaram esse povo à horrível escravidão, que a Natureza não tem nada a ver com isso, e que a injustiça e o forte interesse dos brancos explicam tudo.

Olympe de Gouges introduz aqui algo de verdadeiramente novo. A escravidão dos Negros era justificada pela inferioridade natural desses últimos. Mesmo os amigos dos Negros duvidavam da plena humanidade deles. Ora, Olympe de Gouges inverte a ordem das causalidades, explicando a selvageria dos Negros pelo preconceito e, sobretudo, pela opressão e pela servidão, e não pelo inverso. Insistindo sobre a causalidade histórica, ela especifica que a natureza não explica nada e que a injustiça que sofrem os Negros explica tudo.

Os legados de Victor Schoelcher e George Forster

Essa posição que explica o "atrasado" econômico e cultural da África pela história e não pela natureza é capital. Ela será retomada mais tarde por Victor Schoelcher. Esse último quer retomar a questão

de saber se os africanos, em vez de ser um povo ainda na infância, não seriam pelo contrário um povo em decadência; se os negros, depois de terem sido a origem de toda a humanidade civilizada, não teriam visto... o cetro do mundo passar para mãos de outros, como desde a história conhecida, vimos a Índia, o Egito, a Arábia, a Grécia, outrora tão luminosas, se obscurecer, se apagar e deixar a nós outros, bárbaros do Ocidente, a tarefa do futuro (SCHOELCHER, 1948, p. 74-75).

A ação que consiste em soldar étnica, intelectual e espiritualmente a África negra às brilhantes civilizações do Egito e da Etiópia antiga se justifica assim. As teses que Cheikh Anta Diop desenvolveu mais tarde sobre a anterioridade das civilizações negras já estão presentes em Schoelcher. Pois, para argumentar o pertencimento do Egito faraônico à África Negra, ele estabelece a "anterioridade da civilização etiopiana" (SCHOELCHER, 1948, p. 74) e afirma sem rodeios que "os egípcios se pareciam consideravelmente com os Negros" (p. 75).

Sem dúvida, pela primeira vez, a cor negra perde seu opróbrio; assim, a forma do nariz ou dos lábios deixa de ser uma marca de inferioridade física ou os indícios de deficiência intelectual e moral: doravante, eles podem ser religados à primeira grande civilização, instruidora e civilizadora da Europa. Pois, segundo Schoelcher, "a figura das esfinges é o tipo negro; as cabeças das múmias da coleção do Louvre são definitivamente cabeças de negros, lábios grossos, nariz achatado, parte inferior do rosto forte e quadrado" (SCHOELCHER, 1948, p. 76).

Schoelcher vai também se apoiar na autoridade dos antigos, Heródoto e também Diodoro, para reafirmar suas proposições e confundir os negacionistas: e como se Diodoro temesse que os inimigos dos negros quisessem recusar-se hoje a ver seus ancestrais nesses etiopianos tão ambiciosos de toda civilização, ele termina dizendo: "Quase todos os etiopianos têm pele negra, nariz achatado e os cabelos crespos" (SCHOELCHER, 1948, p. 76).

O argumento histórico da decadência dos Negros nos parece decisivo. Ele força a estudar segundo a abordagem do longo prazo e não segundo a do tempo estrutural. Esse argumento torna fúteis e contraprodutivos os debates atuais sobre a barbárie ou não dos Negros. A questão científica e filosófica pertinente não é a da constatação dessa barbárie – que se explica nas situações de opressão –, mas a da razão dessa barbárie.

No seu livro Civilisation ou Barbarie? (Civilizações ou barbárie?), Cheikh Anta Diop, com seu senso de história, nos remete a Juvenal que, no século I de nossa era, notava no Egito algumas práticas do canibalismo, as superstições grotescas, a regressão total ao nível dos costumes, da cultura e da tecnologia (JUVENAL, s/d., p. 130-135). Diop explica essa regressão pela queda do Império, pela perda da soberania, em resumo, pela perda da iniciativa histórica, desde que os persas, os gregos e os romanos se tornaram mestres do Egito (DIOP, 1981, p. 273-274).

Encontramos aqui algumas questões interessantes de um ponto de vista epistemológico, mas também metodológico e mesmo cultural. Essas questões essenciais nos permitem superar os argumentos indolentes e errados sobre a inferioridade congênita dos Negros, ou pelo contrário, os argumentos da permanência da civilização e da cultura no tempo e no espaço.

A aceitação da constatação da barbárie de um povo não implica de qualquer maneira o direito de oprimi-lo. É um dos principais argumentos de Abbé Grégoire. Contra alguns espíritos tortos e perversos – como Abbé Henri Dillon (1814) – que afirmavam, para justificar a servidão, que os negros não têm faculdades intelectuais e morais, Abbé Grégoire responde secamente que os talentos não legitimam os direitos. Pois, de um ponto de vista jurídico, "Newton e seu serviçal são iguais (GRÉGOIRE, 2005, p. 33)".

É aí que George Forster torna-se também interessante. Polemizando com Kant, Forster, no seu livro Outra coisa sobre as raças humanas (1785), compreendeu o verdadeiro problema da questão negra, que ele relacionou explicitamente com a questão da igualdade social.

Para Forster, a questão metafísica da unidade do gênero humano é de pouco interesse. Com efeito, alguns pensadores acreditam que, se nóss consideramos o negro como uma espécie originalmente diferente do branco, corremos o risco de cortar o último laço que une todos os homens da terra. Os mesmos pensadores acreditam também que cortar esse fio significa deixar o último escudo que era capaz de garantir a caridade e a proteção contra a crueldade da Europa. Forster recusa esse argumento porque a afirmação da ideia de que "os Negros são nossos irmãos não já fez cair o chicote do escravismo". Aliás, segundo Forster, as ideias morais de fraternidade e de comum humanidade são insuficientes para impedir o crime. Os mestres que praticam a tortura sabem plenamente que "os negros são de nosso sangue". Essa conclusão é interessante porque Forster relaciona conscientemente a questão da servidão dos negros à questão de opressão e de exploração de classe. Desse ponto de vista, sua constatação é indiscutível:

Os homens de mesma origem, que desfrutam doravante do benefício pouco reconhecido de uma ética pura, não se revelaram mais tolerantes e amáveis uns aos outros. Onde está o laço [...] capaz de impedir o Europeu decadente de reinar despoticamente tanto contra seus próximos brancos como contra os Negros? (FORSTER apud DIOP, 2008).

Esse é o problema real. Quando ele aborda a questão da diversidade, Forster é verdadeiramente interessante. Pois,

sob mais de um aspecto, e mesmo do ponto de vista moral, a diversidade na nossa Terra não é certamente mais notável nem mais rica de coisas a ser meditadas que a unidade eterna, que só se esconde nela, e transparece de novo de tempo em tempo: a riqueza extrema ao lado da pobreza extrema. (FORSTER, apud DIOP, 2008).

Admitindo que a cor constitua uma qualidade secundária pela qual o Negro se distingue do europeu, Forster estabelece, como o sublinha El Hadj Ibrahima Diop, que o verdadeiro problema dos dominadores e dos exploradores é o de manter e de aprofundar as desigualdades entre os povos, entre as raças, entre as classes sociais e entre os Estados. Com esse argumento decisivo, mudamos completamente de registro e a questão torna-se política e social. Essa questão pode assim se formular: uma vez admitida a ideia de que "o talento não é uma propriedade exclusiva de nenhum país, de nenhuma variedade de homens", podemos começar a encarar as consequências da perda de iniciativa histórica em relação com o destino antropológico e cultural dos povos, mas também as condições políticas do renascimento das nações. É possível pensar que Da literatura dos negros (GRÉGOIRE, 1991), de Abbé Grégoire, e o livro de Schoelcher, Escravidão e colonização, visavam implicitamente tal objetivo. É bom lembrar que o Renascimento é só possível a partir das experiências históricas mais significativas dos povos. É porque Victor Schoelcher e Cheikh Anta Diop relacionaram o Renascimento da África ao núcleo histórico central que constituem o Egito antigo e a Etiópia.

A África antiga, da identidade à transcendência10 10 A inspiração desta parte vem do livro de Marcien Towa, Identité et Transcendance. Paris: L'Harmattan, 2011.

É em sua juventude que a aspiração dos povos à transcendência e ao universal parece mais forte. Para utilizar uma imagem própria à psicologia, podemos dizer que essa aspiração à transcendência, à abertura ao mundo, coincide com o desejo urgente de romper com o egocentrismo, característica da infância. A ruptura com esse egocentrismo infantil toma aqui a forma de uma ruptura com a tradição que é a encarnação por excelência do particular e do irracional. Lembremos que se trata aqui de uma das coisas que mais atormentavam um perfeito conservador como Konrad Lorenz.

Com efeito, Lorenz estava convencido de que as civilizações evoluem mais por seleção e conservação das tradições comprovadas do passado do que pela ruptura e transgressão da herança ancestral (LORENZ, 1973, p. 85-100). Ele relaciona o desejo de ruptura e de emancipação à vontade de tudo explicar pela razão. Lorenz pensa que é a pretensão de compreender e de explicar tudo racional e cientificamente que "leva a juventude 'intelectual' a desfazer-se do imenso tesouro de sabedoria e de conhecimentos acumulados contidos sem exceção nas tradições das antigas culturas e nos ensinamentos das grandes religiões do mundo" (LORENZ, 1973, p. 87).

A verdade histórica é que as primeiras civilizações de história mundial não estavam dispostas a seguir esse tipo de conselho, porque as necessidades de emancipação e de racionalização dos aspectos essenciais da vida social e cultural estavam muito urgentes nelas. Isso significa que o misoneísmo conservador de Konrad Lorenz corresponde a uma leitura errada da história universal. Começando a experiência histórica sem referência, sem modelo anterior, sem herança passada a justificar ou a defender, todo esforço dos primeiros povos históricos era direcionado não para a conservação da tradição (que não estava ainda cristalizada), mas para a concepção do novo, à criação do algo que não existia ainda.

Assim, as civilizações antigas aparecem como o universo por excelência da revolução intelectual e espiritual permanente. Com o mundo moderno, essas civilizações aparecem como as mais criativas, as mais inventivas de toda a história da humanidade. A invenção da agricultura, da escritura, da matemática, da filosofia, do calendário, das técnicas de gestão (política, administrativa, econômica e social de grandes grupos humanos) é uma herança do Egito antigo e de Sumer.

A lição que vem do Egito antigo

O Egito antigo faz parte integrante da história da cultura africana. Para nós, ele desempenha mais ou menos o mesmo papel que a Grécia e a Roma desempenham para o Ocidente. Isso é uma evidência conhecida desde os trabalhos de Victor Schoelcher, Cheikh Anta Diop e Théophile Obenga.11 11 Cheikh Anta Diop, Nations nègres et culture. Paris: Présence Africaine, 1954; L'Unité culturelle de l'Afrique noire, (1959), Paris: Présence Africaine, 1982; Civilisation ou barbarie?. Paris: Présence Africaine, 1981. Théophile Obenga, La Philosophie africaine de la période pharaonique. 2780-330 avant notre ère. Paris: L'Harmattan, 1990. A História Geral da África, sob a tutela da UNESCO (1981), reconheceu formalmente o parentesco genético entre o Egito faraônico e a África negra. Esse parentesco é linguístico e cultural. As categorias filosóficas de base são idênticas. As cosmogonias permitem verificar facilmente isso.

Essas últimas nos instruem já amplamente sobre o lugar da alteridade nos sistemas de pensamento e de crenças. Das cosmogonias, com efeito, emergem duas ideias fundamentais que vão para além do quadro estrito da criação: o caos e o cosmos.

Trata-se de dois conceitos cósmicos cujo significado antropológico e cultural é muito grande, já que a barbárie em si aparecia como a expressão por excelência do caos que, incessantemente, ameaçava submergir o mundo organizado, o cosmos.

Na antiguidade, a oposição caos-cosmos era irredutível. Nas cosmogonias, o Nún, oceano cósmico primordial, ameaça o cosmos (mundo dotado de lei e inteligível) com suas ondas. Paralelamente, a civilização enfrenta a ameaça permanente de Apophis, a serpente mítica saída das profundezas do oceano cósmico primordial. Apophis é o inimigo de Ré (o Sol, símbolo da ordem racional do mundo), mil vezes atacado, mas jamais vencido.

No Egito antigo, essas alegorias podiam também servir para dar conta do antagonismo fundamental que opõe o universo cósmico e o mundo caótico, violento e irracional dos bárbaros. De fato, a oposição entre a Ásia bárbara e a África civilizada era um dado permanente da história dessa época. L'enseignement pour Mérikarê (O ensino por Mérikarê) evoca, com efeito, o "vil asiático", saqueador, imoral, vivendo em um "país pobre em água, de acesso difícil" ou em florestas numerosas e misteriosas. Esse ser meio homem, meio animal, corresponde talvez aos Hyksos ou às tribos hebraicas, nômades famintos que percorriam a região em busca de pastos e de comida.

Mesmo a consciência dos "bárbaros" refletia esses antagonismos. A visão da civilização desses últimos era ambígua. Com efeito, se notava neles uma mistura contraditória de atração-repulsão. As narrativas em relação às viagens de pessoas bíblicas para o Faraó são testemunhas disso. Eis o que é atrativo. A narrativa de Caim e Abel propõe uma abordagem diferente, que ilustra a hostilidade dos nômades para a civilização agrícola e urbana. Abel simboliza, com efeito, o etos pastoral, enquanto que Caim figura o etos agrário e urbano.12 12 A Bíblia faz de Caim o ancestre da humanidade dando origem à civilização urbana (Henok), com seus prazeres e suas comodidades. Caim é também o ancestral dos ferreiros especializados no trabalho do cobre e do ferro. Tubal-Caïn, que designa o criador das profissões do forjamento do metal, remete ao nome de um povo do Norte, Tubal, país dos metais (Gn 10-2) e ao ferreiro (Caim). Tubal-Caïn tem uma irmã, Naama (a "linda"), a "mais velha", provável nome dada às "prostitutas", segundo uma versão da Bíblia de Jerusalém. Assim então, as oferendas de Abel, feitas dos primeiros nascidos de seu rebanho, foram agradáveis a Javé que desdenhou os produtos dos campos de Caim. A Bíblia faz desse último um espírito invejoso. Então, o texto bíblico o acusa da morte de seu irmão. Essa história de morte contra um inocente é destinada a legitimar a danação irremediável da exuberante e orgulhosa civilização agrária e urbana, que simboliza, como por acaso, a África.

Mas, como império universal, o Egito não podia se limitar a esse antagonismo primordial. A partir da expansão de Tutmés III (1484-1450) em direção à Ásia, o Egito aprende a afinar o conhecimento que ele teve sobre seus rivais; ao mesmo tempo, ele começa progressivamente a integrar esses últimos na comum humanidade. É assim que o ideal universalista triunfou.

Polo eminente do comércio internacional, a Síria havia sido certamente conquistada de maneira violenta, mas o Império que resultou dessa conquista da Ásia foi o objeto de uma legitimação ideológica fundada em um culto universal: a religião de Amon, deus da monarquia, deus igualmente "de todos seus sujeitos, de toda a terra". Radicalizando de um ponto de vista teológico essa perspectiva, Aménophis IV (Akhnaton) tira daí uma religião mais universal ainda.13 13 Cf. Jacques Pirenne, Les Grands courants de l'histoire universelle. T. 1, Des origines à l'Islam. Paris: Éditions de la Baconnière/Éditions Albin Michel, 1959, p. 65. Cf. também E. Drioton et J. Vandier, Les peuples de l'Orient Méditerranéen. Paris: PUF, 1952. p. 343-346. Esse rei era, com efeito, um espírito cosmopolita, por causa de seu triplo pertencimento à África (Egito pelo seu pai), ao mundo ariano (pela sua mãe) e semita (pela sua avó). A religião de Aton (o espírito solar) era um monoteísmo baseado sobre o misticismo, a liberdade, o individualismo e a igualdade. Deus criou, com efeito, a terra, os homens, os animais, as plantas etc., e mantém vivos todos; seus raios iluminam todos os países da terra; ele definiu a tabela das nações e, para cada povo, ele atribuiu um destino singular.14 14 "Você colocou cada um em seu lugar e você faz o que lhes é necessário; cada um tem seu alimento e seus dias são calculados". Mas se o espírito universal teve o cuidado de diferenciar os povos pela língua e pela pele – "Suas línguas falam diversamente como é diferente seu aspecto; sua pele é diferente, pois, você distinguiu os povos" –, ele assegura a todos, egípcios e os estrangeiros, uma igual proteção. Pois, embora diferentes, todos os homens são parecidos e iguais: "Todos os países distantes, você cuida deles", criando milhões de seres, Deus quis fazer de todos os irmãos, os cidadãos de um mesmo mundo, tão diversos sejam eles. É o sol em si que faz sua unidade, pois "cidades, localidades, campos, caminhos e rios – cada olho te vê de frente enquanto o sol do dia sobre a terra". Cf. Citado por Adolf Erman, O Egito dos faraós, traduzido do alemão por Henri Wild. Paris: Payot, 1939. p. 198-199. Como o Egito do Novo Império, o universo de Aton era uma mistura de seres de todos os tipos, de raças diferentes, de nações diversas. Apesar de sua diversidade, a humanidade – com todas suas componentes raciais, linguísticas, étnicas, nacionais –, é igual defronte a Deus e cada um se beneficia dos mesmos privilégios; cada um se beneficia do mesmo amor e de uma proteção igual.

Sem dúvida, a realidade de um Estado bem organizado e de um Império que reúne e mistura em seu seio uma multiplicidade de povos sugeriu ao Egito a ideia de uma instância metafísica superior, capaz de transcender os indiví­duos, as particularidades familiares, clânicas, raciais, religiosas. A Razão aparece como essa instância que o documento de filosofia de Mênfis coloca diretamente no coração do cosmos. Ptah, o Deus maior de Mênfis, é um deus intelectual; ele simboliza o Logos que vê tudo, entende tudo e pensa. Vemos assim como o Logos vem para coroar um processo de universalização como síntese ideal do ajuntamento humano, territorial, econômico, cultural e político. Com efeito, a pretensão da Razão é sintetizar o mundo na sua diversidade e dotar a variedade de coisas – que o constituem – de uma lei superior comum e universal: uma lei racional e inteligível para todos os homens. Isto explica por que o Egito foi o berço das matemáticas, da filosofia, da cultura sábia.

É no ponto de encontro das coisas universais que os povos dialogam melhor e se fecundam mutuamente. É o que fizeram o Egito e a Grécia na antiguidade. O Egito havia inventado as progressões aritméticas e geométricas, as equações do 1° e do 2° graus, o cálculo da superfície do triângulo, do trapézio, do círculo, do volume do cilindro e do tronco da pirâmide. Temos aqui as dádivas divinas do Egito para Grécia, sua irmã mais jovem.

Nem Tales nem Pitágoras são os autores dos teoremas que os tornaram famosos. A razão é que esses teoremas são egípcios. A começar por Platão, que viveu por 13 anos no Egito, os gregos eram muito orgulhosos desses dons que vieram do Egito. Os indícios das contribuições do Egito são visíveis nas obras de quase todos os pensadores pré-socráticos. No Timeu, Platão compara a antiga ciência (sábio) egípcia, feita de seriedade e de profundidade, à superficialidade do jovem espírito grego, representado por Sólon. A figura maior de Dionísio ocupa também um lugar importante no universo mental e cultural grego. É que, referindo-se a um Deus estranho – Osíris, o nome egípcio de Dionísio – a Grécia, durante a época dos tiranos, encarou, pela primeira vez, a ideia de uma revolução democrática. Por exemplo, como mostra o teatro de Eurípides, Dionísio aparece como o libertador da mulher grega.

Uma ciência erudita e uma cultura sábia e requintada: tal é o nível a partir do qual, durante milênios, a África dialogou com a Europa e a Ásia. Comum a todos os homens, a instância da Razão fornece a todos os povos as ferramentas lógicas apropriadas para facilitar a comunicação e os intercâmbios. Esse diálogo exemplar entre dois continentes a priori antagonistas e a apropriação da herança egípcia pelo Oriente e pelo Ocidente contradizem de maneira clara as tolices pós-modernas e a relação com o diferente, o dissenso, o dissentimento e "a pretendida impossibilidade de se compreender separar as tradições, as culturas, as gerações ou os períodos históricos diferentes" (BOUVERESSE, 1984, p. 139). Paul Feyerabend (1979), J. F. Lyotard (1979) e seus seguidores pós-colonialistas afirmam a universalidade do espírito de discórdia. Eles inventaram o conceito de intercâmbio livre entre as tradições culturais precisamente para mostrar a impossibilidade de um entendimento racional entre as culturas. Eles recusam o "diálogo dirigido", que supõe um diálogo racional, argumentado, a partir da crítica das bases dogmáticas de cada tradição cultural ou religiosa. Proibir um intercâmbio racional entre as tradições significa que os fundamentos dogmáticos dessas últimas não devem ser nem discutidos nem transgredidos. É nesse sentido que Michel Foucault (1966) afirma que o Logos é incapaz de constituir uma ponte válida para a alteridade.

Para se beneficiar dos tesouros espirituais dos "bárbaros", os próprios gregos foram forçados a superar seus piores preconceitos nacionalistas. Por exemplo, na direção do Vale do Nilo, a Grécia se projetou com suas ferramentas lógicas, que lhe permitiram penetrar diretamente no núcleo racional de uma civilização (Egito) que gostava de esconder os preciosos depósitos cognitivos e as brilhantes pérolas científicas e filosóficas sob densas gangas místicas. A qualidade e a força essenciais da Grécia então foram sua habilidade em recuperar o núcleo racional da cultura dos povos que ela havia vencido. Do fundo de sua derrota, esses povos podiam oferecer aos vencedores o melhor de sua essência.

Essa disposição do espírito é estranha tanto à teoria da alma negra (Senghor) quanto à abordagem pós-moderna e pós-colonial, na moda hoje em dia. Essas doutrinas não nos dizem nem como viver com uma distância crítica as culturas herdadas, nem como transgredir os fundamentos dogmáticos de nossas tradições culturais; da mesma maneira, elas são incapazes de nos ensinar como dialogar com o núcleo substancial das tradições culturais estrangeiras que nos são propostas. Tal é, por exemplo, o problema introduzido pela cultura da diferença e pela teoria da alma negra.

A teoria da "alma negra" e o "culto da diferença": significação histórica e social

A negritude e a teoria da "alma negra"

Historicamente, o culto da diferença é um indício de que o povo perdeu a iniciativa histórica e que sua cultura não fala mais do topo da história universal, mas do abismo histórico. Trata-se então aqui de um dos sintomas mais expressivos da derrota histórica de um povo. Esse sintoma significa que, historicamente derrotado, o homem se contenta em balbuciar a partir da estreiteza de sua particularidade e de conversar miseravelmente consigo mesmo, de maneira repetitiva e tautológica. A filosofia de Edward Wilmot Blyden e a de Léopold Sédar Senghor ilustram perfeitamente essa tendência.

Edward Wilmot Blyden e a divinização da alma negra

Blyden nasceu na escravidão em três de agosto de 1832, em Saint Thomas, uma ilha das Antilhas dinamarquesas, talvez de pais originários da Nigéria. Depois de brilhantes estudos primários e secundários, ele chega aos Estados Unidos em 1850. A discriminação racial o impede de seguir seus estudos. Assim, a New York Colonization Society (Sociedade de Colonização nova-iorquina) organiza sua emigração em direção à Libéria. Neste país, Blyden se ilustra como estudante na Presbyterian High School de Monróvia. Poliglota, ele domina perfeitamente o grego, o latim, o hebreu (que ele havia aprendido sozinho), o árabe e o francês. Ele começa então uma rica carreira de professor e de pastor. O governo da Libéria, novamente independente, lhe confia uma missão em 1861: ele deve ir aos Estados Unidos para encorajar a emigração dos ex-escravos para a África. Com Gladston, primeiro-ministro britânico, ele estabelece uma correspondência que ficou famosa. Mais tarde, em 1905, Blyden é Ministro plenipotenciário em Paris. Ele falece em 1912, com 80 anos, deixando uma obra significante: A Voice from Bleeding Africa, Monrovia (1856); A Vindication of the African Race: being a brief examination of the argument in favour of African inferiority, Monrovia (1857); Hope for Africa, African Repository, Monrovia (1861); The Negro in the Ancient History. African Repository, Monrovia (1868); Christianity, Islam and the Negro Race, Edinburgh (1967); African Life and Customs, London (1908).

A princípio imbuído de preconceitos racistas sobre a barbárie dos Negros, Blyden é convencido – como os missionários e os colonos brancos – da urgência de trazer o evangelho e a civilização aos povos pagãos.

Bem cedo, contudo, Blyden vai mudar para a contestação do preconceito em relação à inferioridade congênita do negro. Ele começa então uma longa cruzada identitária que o levará mais tarde a rejeitar massivamente a Europa com tudo o que esta última representa como sociedade, economia, cultura e religião. Ele opõe termo a termo a alma negra ao espírito da Europa. Blyden encara essa alma como algo absoluto, imutável e eterno. Os pontos de vista desenvolvidos no "West Africa Before Europe" são sem equívoco. Para ele, cada raça é dotada de uma alma, de um espírito. As crenças, as instituições, os modos de vida, a língua que cada raça se dá são as manifestações dessa alma. Isso implica que toda agressão contra a alma do povo constitui um ataque contra a raça em si. É esse argumento que permite Blyden rejeitar todas as tentativas de alienação ou de contaminação cultural: a África precisa permanecer na sua essência, pura de toda influência estrangeira.

Mas isso não quer dizer que Blyden recusa toda contribuição cultural exterior. Porque ela pode só servir como catalisador, a ação que a Europa, por exemplo, pode exercer sobre a África não deve incluir nem a natureza nem a essência profunda da civilização. O argumento de Blyden é que o conteúdo da civilização é determinado somente pelos fatores hereditários de cada raça.

Segundo Blyden, o Criador dotou cada povo de dons particulares e específicos; ao mesmo tempo, ele protege a individualidade, a liberdade e a independência de cada nação. Nessa independência, as raças são capazes de emitir sons diferentes, concorrendo assim à sinfonia universal.

Marcien Towa (2011) discerniu no pensamento de Blyden um monismo panteísta que consiste em divinizar tudo: a natureza, a cultura, o espírito dos povos, a civilização etc. Em suas especificidades, as culturas e as civilizações são as manifestações dos diferentes aspectos de Deus. A natureza e a cultura humana constituem a maneira pela qual Deus se revela:

Como no grande movimento da natureza, nós percebemos nas grandes espécies orgânicas, nos movimentos, as mudanças e a ordem dos elementos, a expressão dos vastos pensamentos de Deus, assim como percebemos nos grandes tipos de homens, nas diferentes raças do mundo – como elas são distintas nas suas características como em suas obras –, a vontade, o caráter e a consciência de Deus revelados aos nossos olhos (BLYDEN apud TOWA, 2011, p. 79-80).

A partir do postulado panteísta que pretende que Deus se revela diretamente a nós, os artifícios intelectuais que buscam explicar sua essência tornam-se fúteis. É porque Blyden invalida as pretensões da teologia europeia, que não só deturpa as concepções simples dos povos semitas, mas também veicula a visão do mundo dos povos indo-europeus, em particular a dos Romanos, dos Celtas e dos Teutos. Blyden reafirma assim seu postulado sobre o caráter imutável das culturas.

Sublinhando que a religião africana se ajusta ao espírito geral da civilização africana e à essência da alma negra, ele sacraliza ao mesmo tempo a cultura negra. É assim que ele proíbe toda abordagem transcendental da África. Ao mesmo tempo, Blyden nega aos africanos o direito de transgredir suas tradições culturais próprias, ou, pelo menos, de se interrogar sobre a legitimidade de certos de seus aspectos.

Léopold Sédar Senghor e a biologização da alma negra

Com o martiniquês Aimé Césaire (1913-2008), o senegalês Léopold Sédar Senghor (1906-2001) é uma referência maior da Negritude. Essa doutrina foi desenvolvida na França nos anos 1930 pelos estudantes negros de origem africana, da Martinica e das Antilhas. A teoria da alma negra que nos interessa aqui tem, sobretudo, a marca de Senghor. Este último veicula a Negritude como poeta, ensaísta e político de primeiro plano. Antigo membro da academia francesa, Senghor foi também deputado e ministro na França. Senghor foi o primeiro Presidente da República do Senegal independente. Ele é autor de numerosas publicações. Algumas delas foram reunidas em quatro volumes: Liberdade I, Liberdade II, Liberdade III e Liberdade IV.

Como Blyden, Senghor entende a cultura negra africana como uma essência, esta última visando ao que a coisa é em si, para além da diversidade de suas manifestações, de suas formas simultâneas ou sucessivas. Trata-se, como sublinha Marcien Towa, de um "universal e estável, o idêntico, para além do múltiplo e o móvel" (TOWA, 1978, p. 39). Com Senghor, podemos falar de essencialismo cultural. Encontramos nas suas obras uma proliferação confusa de essências culturais irredutíveis umas às outras e incomensuráveis umas em relação às outras: a alma negra, o gênio branco, a arabidade, a berberidade, a germanidade, a francidade, a lusitanidade, a chinesidade etc.

Senghor segue Gastón Berger para dizer que a natureza humana não é idêntica entre todos os homens; ele insiste sobre a diversidade essencial das naturezas. Mas ele não "pretende estabelecer nenhuma hierarquia" (SENGHOR, 1964, p. 383) entre elas. Senghor vai mais longe: ele biologiza a cultura e faz dela um derivado da raça ou de sua constituição biológica, conformemente à afirmação fundamental da caracterologia étnica que pretende que as determinações fundamentais e derivadas do caráter de um indivíduo ou de um grupo são enunciáveis, em termos estritamente fisiológicos. Ele explica então a diversidade das culturas pela diversidade das raças e pela hereditariedade (SENGHOR, 1964, p. 383). É aí que Senghor encontra os pontos de vista da caracterologia étnica sobre a alma nacional, a mentalidade própria a cada nação (SENGHOR, 1977, p. 122-127). A partir da psicografia dessa doutrina, ele divide a humanidade em perpetuados, extrovertidos, introvertidos e flutuantes.

Alguns pensadores acusam a teoria da alma negra de racismo. A acusação me parece fundada, mas exagerada. A Negritude, é um racismo na medida em que ela biologiza e racializa a cultura; ela é também um racismo porque, como prova hoje em dia a teoria do "choque de civilizações" (HUNTINGTON, 1997), é difícil dividir cultural e religiosamente a humanidade ou estabelecer uma mapa racial e tribal do mundo sem cair no racismo.

Mas, para os teóricos de alma negra, a fragmentação da espécie humana não implicava a recusa do diálogo com a Europa, por exemplo. Senghor acreditava mesmo que afirmar as essências culturais específicas e proclamar a africanidade eram o ponto de partida necessário para um diálogo fecundo das culturas, a finalidade deste diálogo sendo a "civilização do Universal". Esta última aparece como o lugar por excelência do "encontro do dar e do receber". Mas, um problema essencial devia ser resolvido, em relação à escolha do interlocutor da África, numa Europa dividida entre o "intelectualismo do Oeste" e a "mística do Leste". Ora, instintivamente, os teóricos da alma negra escolheram a Europa da mística do Leste. A Alemanha encarnava essa última Europa.

O significado histórico e cultural da rebelião mística contra o Ocidente

É interessante saber por que a África da Negritude escolheu a Alemanha como interlocutora espiritual e cultural. A razão é que tanto a África como a Alemanha do século XIX foram acusadas de nacionalismo e mesmo de racismo.

O racismo aparece sem dúvida como uma questão não só moral, mas também estratégica e ideológica. Mas, num contexto de opressão política ou cultural, precisamos fazer a diferença entre o racismo dos opressores e o racismo dos oprimidos. Os dois racismos não têm o mesmo significado.

As escolhas racistas dos grupos dominantes traduzem o desejo consciente ou inconsciente de segregação racial, política, étnica, cultural, social, econômica com o objetivo distanciar-se da humanidade comum e cortar o laço ontológico entre eles e outros homens. O corte do laço permite legitimar a dominação e a exploração. Pelo contrário, o racismo dos vencidos e dos oprimidos aparece como um grito de sofrimento, um alarme, uma queixa ou um clamor de revolta contra os opressores. A partir de uma posição histórica subalterna, os patriotas dos povos oprimidos são forçados a bramir para serem audíveis. Assim, eles reclamam a separação, seja para impor o reconhecimento de sua humanidade, seja para vingar-se das humilhações sofridas.

Nisso, o racismo nacionalista de Blyden e de Senghor nos lembra estranhamente o racismo nacionalista dos patriotas alemães da época de Herder, Fichte, Strauss e Frobenius. Ernest Renan ironizou esses patriotas afirmando que, para eles, o homem é o escravo de sua raça, de sua cultura, de sua língua, do curso das flores, da direção das cordilheiras.

Certamente, muitos patriotas alemães partilhavam a convicção de um determinismo biológico e geográfico da cultura. Tal convicção levou ao problema mais delicado do destino racial da comunidade política. É claro que Minha luta (Mein Kampf), de Hitler, que coloca estupidamente a questão do desafio "moral" e "político" do sangue, tira sua inspiração do velho fundo corrompido de uma tradição feita de ressentimento e animada pelo espírito de vingança e de desafio. Ora, para explicar a causalidade histórica que está na origem da grandeza e do declínio das civilizações, essa tradição mostra a importância da mistura dos "fatores políticos e morais" com o "fator sangue". Este último fator parece decisivo. É aqui a origem da ideia que pretende que "o sangue comum [só] encontra paz e repouso [num] império comum" (HITLER, 2005, p. 66).15 15 Version portugaise, p. 95.

Desde Renan, é comum opor essa concepção dita alemã à concepção dita francesa. A "concepção alemã" repousa sobre a "política das raças". Destacando a questão social e democrática, a "concepção francesa" tem sua legitimidade da afirmação do direito da nação. A nação aqui não aparece como o produto da raça ou do sangue; pelo contrário, se trata de uma escolha livre ou de uma adesão voluntária de cidadãos conscientes que aceitam seu agrupamento num grande conjunto político. Isso explica a ideia de que a "nação é um plebiscito de cada dia" (HITLER, 2005, p. 170).

Os movimentos nacionalistas na África e no Terceiro Mundo se dividiram sobre essas duas abordagens contraditórias. Com Blyden (implicitamente) e com Senghor (explicitamente), só a concepção alemã prevaleceu. Por exemplo, existe uma ideia fundamental que Blyden partilha com Herder: a ideia de recusa da química das nações. Certamente, essa recusa não implica automaticamente a negação da unidade fundamental da espécie humana, mas os dois pensadores estão de acordo sobre a ideia de uma "conformação original da nação" (HERDER, 1962, p. 129). Com efeito, Herder estava hostil ao agrupamento da humanidade no seio de um grande Estado Universal; pelo contrário, ele julgava que as nações seriam mais felizes separadas umas das outras, com as fronteiras claramente definidas de um ponto de vista natural, cultural e psicológico: climas, montanhas, florestas, rios, desertos, mares, línguas, costumes, temperamentos (HERDER, 1962, p. 129). Como mais tarde Blyden, ele viu na separação da humanidade em raças e em nações a expressão da vontade soberana da providência: Deus quis assim complicar a tarefa dos déspotas ávidos de estender seu jugo buscando "colocar todos os continentes na barriga de um cavalo de madeira" (HERDER, 1962, p. 145). Ora, segundo Herder (1962, p. 147):

[...] até então, nenhum Nemrod conseguiu concentrar em uma mesma cerca, a seu benefício e ao de sua família, os habitantes do universo, e se desde séculos o objetivo da Europa aliada era se tornar o tirano que impõe sua felicidade a todas as nações da terra, essa deusa da felicidade está ainda longe de seu objetivo.

A ideia que se evidencia aqui é a de uma "democracia cultural" ou "racial"; é também a defesa do direito de pessoas e de culturas para seu autodesenvolvimento. Em nome do respeito da especificidade da cada povo, Herder condena, por exemplo, o eurocentrismo e rejeita firmemente o mito da missão civilizadora, causa, segundo ele, de um "orgulho" tolo [que pretende] que os habitantes de todas as partes do mundo deveriam se tornar europeus para atingir a felicidade (HERDER, 1962, p. 137). Para Herder, a brutal intrusão da Europa imperialista na história dos outros continentes aparece só como uma tirania. E, para ele, seria absurdo que o destino dos povos não europeus se desenvolva no seio de um Estado universal dominado pela Europa. Tal pretensão à dominação universal é por essência contranatural. Além disso, afirma Herder, os outros continentes não esperaram a Europa para buscar e encontrar as vias originais para seu desenvolvimento (HERDER, 1962, p. 147). Herder convida então a Europa à modéstia nas suas pretensões hegemônicas. A explicação é que a Europa aproveitou de sua posição favorável de ponto de encontro das civilizações. Ela foi o "resultado de numerosos esforços comuns" (HERDER, 1962, p. 507). O único "mérito" deste continente foi de constituir "a esponja" que teve a sorte de crescer num lugar privilegiado onde ele podia absorver o "suco da ciência" (HERDER, 1962, p. 153) produzido pelas outras nações. Herder sublinha o papel maior da África e da Ásia nessa evolução. Esses "dois e ricos continentes enlaçavam sua irmã mais jovem e mais pobre". A África e a Ásia enviaram as mercadorias e as invenções do fim do mundo em direção a Europa. Os bens vieram de todas as regiões com as mais antigas civilizações. Com essas contribuições diversas, a Europa estimulou sua aplicação técnica e seu próprio dom de invenção (HERDER, s/d., p. 509).16 16 Trad. M. Rouché, Livro XX.

As ideias de Herder sobre a escravidão e a colonização são também radicais. Quando ele evoca a deportação dos Negros, ele sublinha fortemente "a dor e a desesperança de um escravo comprado ou roubado, quando ele diz adeus a seu país natal"17 17 Livre VII, Chap. II., trad. D'Edgar Quinet. (HERDER, s/d., p. 54). Aliás, a crítica da deportação do Negro é conforme a sua teoria do clima e da raça. Ele diz:

Que direito vocês têm, monstros impiedosos, de se aproximarem do país desses infelizes... de tirá-los de sua pátria pela força ou pela artimanha? Durante longos séculos, essa parte do mundo foi a pátria de seus pais, e é a ela que eles pertencem: seus ancestrais a adquiriram pelo preço o mais caro e o mais incontestável, ao preço da forma e da constituição negra; dando-lhe sua marca, o sol os adotou como seus filhos e os marcou com seu próprios carimbos. Em qualquer lugar que vocês os levarem vocês serão vistos como infames, como pilhadores e ladrões de homens (HERDER, s/d., p. 54).18 18 Trad. E. Quinet.

Herder estava convencido da fraternidade de todos os homens. Para ele, a fraternidade aparece como o laço natural e moral que une toda a humanidade. A qualidade de irmão proíbe então a eliminação ou a opressão das outras raças. Isto explica a forte exortação seguinte: "Quanto a você, ó homem, respeite-se [...] Seu irmão [é] de fato o habitante da América e o Negro. Esse último, você não deve o oprimir, o assassinar e o roubar" (HERDER, s/d., p. 127).

Essa exortação basta; um comentário suplementar não me parece necessário para traduzir a generosidade exemplar de Herder. Insistamos pelo contrário sobre uma de suas intuições mais fortes, quase materialistas. Herder explica a colonização, o imperialismo e a escravidão pelo desejo de expansão do mercado mundial. Esse último aparece como um fator maior de desigualdade e de opressão. Herder está convencido de que são a ganância e o gosto pelo lucro que impulsionavam a Europa para a conquista, para a pilhagem e para a devastação dos continentes.19 19 "Ô filhos de Dédale, mensageiro do destino, que instrumentos estão entre suas mãos para espalhar a felicidade sobre a terra, por meios humanos e gloriosos! E quantas vezes o amor insolente e interesseiro pelo ganho não os conduziu nos caminhos opostos!", Livro VII, trad. E. Quinet.

Identificando o capitalismo como o princípio explicativo da unidade negativa do mundo, Herder tem em suas mãos todos os recursos para uma solução dialética da contradição fundamental que ele conseguiu identificar. Inexplicavelmente, ele falha. Mas por quê?

É importante compreender por que, com o conjunto de ferramentas teóricas que eles têm em mãos, os teóricos dos gênios nacionais específicos são incapazes de ir além da afirmação errônea que pretende que "[c]ada povo se apega firmemente as suas próprias representações [porque elas] lhes são verdadeiramente apropriadas [e], convêm à sua terra, ao seu céu; elas derivam de suas maneiras de viver e lhes foram transmitidas de pai para filho, sem interrupção?" (HERDER, s/d., p. 96-97).20 20 Livro VIII, trad. E. Quinet.

Várias hipóteses são possíveis para explicar o fracasso. É necessário examinar algumas delas.

As ciladas de uma concepção intuitiva do diálogo cultural

Essa concepção implica a princípio uma "apreensão intuitiva da especificidade de cada cultura". O objetivo aqui é estabelecer um diálogo entre as essências culturais sem mediação, em seu estado primitivo. O principio básico aqui é que só a justaposição e a confrontação das essências culturais fechadas podem facilitar a emergência do universal. O desafio aqui não é sair de sua particularidade própria, mas apreender o Outro no que ele tem de especifico. É o problema estimulante colocado pela conversa entre a Deutschheit e a Negerheit, a Germanidade e a Negritude, a Alma alemã e a Alma negra.

Quando Leo Frobenius introduz esse diálogo, ele só tenta de reativar a tradição equivocada de tolerância racial e cultural iniciada por Herder. Essa reativação ocorre em um contexto histórico novo, que corresponde à colonização da África pela Alemanha.

Antes de examinar no detalhe os termos do diálogo proposto, coloquemo-nos antes de tudo a questão da pertinência e, mesmo, da lealdade de um diálogo cultural entre uma potência ocupante agressiva (a Alemanha) e um continente submetido pela Europa (a África). A resposta é que nem Leo Frobenius nem seu principal interlocutor africano, Léopold Sédar Senghor, conseguiram encarar tais questões, sem dúvida em razão da orientação espiritualista e da visão mística do mundo que os animavam. Mas, meu ponto de vista é que, por intermédio de um personagem como Leo Frobenius, a Alemanha imperialista buscava um argumento ideológico e cultural de peso para justificar, contra seus rivais franceses e ingleses, sua presença no continente negro.

Para colocar os pés na África, os franceses e os ingleses invocaram a "missão civilizadora". Quanto à Alemanha, todo mundo estava ciente dos perniciosos planos imperialistas de seu envolvimento na África. Contudo, parte da elite alemã não estava à vontade com a pretensão da Europa de "civilizar" outras nações. Sem dúvida, essa elite se lembrava da história recente de Alemanha. Com efeito, durante longos séculos, o "gênio francês", através do universalismo de sua língua, de sua filosofia e de sua literatura, buscou inibir a liberdade de expressão das identidades nacionais dos países da Europa. É a época em que, em plena confusão, a Academia de Berlin se interrogava (1783): "O que fez a língua francesa universal? Por que ela merece essa prerrogativa? Pode-se presumir que ela a conserva?".

Porém, sob uma aparência bondosa de alguns de sua elite, os alemães faziam também um cálculo estratégico: em busca de aliados no contexto confuso da Primeira Guerra Mundial, o argumento ideológico e cultural do parentesco espiritual entre a alma negra e a alma alemã podia servir, na medida em que, inconscientemente, esse argumento se apoiava sobre os fatos que a história podia também ratificar. Por exemplo, para além do fato colonial, para além da diferença evidente dos níveis de desenvolvimento científico, tecnológico e econômico, uma mesma realidade social aproximava a Alemanha "irracional" e a África "pura": seu comum atraso social em relação à evolução burguesa moderna.

Apesar de seus progressos fulgurantes no domínio industrial e tecnológico, a Alemanha dessa época tinha grandes dificuldades em liquidar a herança medieval que paralisava suas estruturas sociais e políticas. O espírito nacional (Deutschheit) que os alemães opunham ao espírito materialista, racionalista, intelectualista do Ocidente (França e Inglaterra), só a tradução metafísica e cultural desse atraso social induziria a recusa da ordem social e política burguesa moderna: a democracia, o progresso social, e enfim, a racionalização das relações sociais (por exemplo, a ideia de igualdade social).

A partir dessa postura retrógrada – que os Alemães celebravam como uma aquisição definitiva ou como uma marca de sua essência e de sua identidade –, era fácil para Frobenius discorrer, ingenuamente, sobre o parentesco espiritual entre a Alemanha e a África. Essa ideia de parentesco conseguiu verdadeiramente se impor no espírito de seu autor depois de uma longa e esgotante polêmica contra o "Ocidente".

Na África, a oposição que ele estabelece entre a "mística do Leste" e o "intelectualismo ocidental" encontra sua correspondência na oposição entre o "Américo" e o "etiópico". Segundo ele,

[O] Ocidente criou o realismo inglês e o racionalismo francês, o Leste criou a mística alemã... A afinidade com as civilizações correspondentes na África é completada. O sentido do fato nas civilizações francesas, inglesas e hamíticas; o sentido do real nas civilizações alemã e etiopiana (FROBENIUS, 1940, p. 31).

Esses pontos de vista estavam em perfeito acordo com o anticapitalismo romântico dessa época. Esse último repousava, lembremo-nos, sobre a crítica da divisão do trabalho capitalista e suas consequências no plano moral. Da mesma maneira, o anticapitalismo romântico idealizava as formas culturais do passado e tentava reabilitar (contra a razão e a modernidade), as velhas formas diretoras da consciência humana: religiosidade, mística, crença etc. Frobenius explica o parentesco espiritual entre a alma alemã e a alma negra a partir de uma etnotipologia fundada na nostalgia, no êxtase, na fé, no maravilhoso. De tipo dionisiano, as civilizações de essência etiópico-teutônica se caracterizariam fundamentalmente pela emoção, pelo dom da comoção e pela intuição mística. Sua metafísica repousaria sobre uma "mística fantasiosa", indiferente à lógica e ao saber conceitual; sua Weltanschauung revela um universo demonico, a "faculdade de estar emocionado pela essência dos fenômenos" (FROBENIUS, 1952, p. 25), o "simbolismo irracional dos números" (FROBENIUS, 1940, p. 148), o "sentimento vital", o "pensamento vegetativo" (FROBENIUS, 1940, p. 87), o "abandono ao outro" etc.

Apesar de seu caráter ingênuo e caricatural, a doutrina de Frobenius consegue fascinar os partidários da Negritude. Senghor foi o primeiro a reconhecer sua dívida com o filósofo alemão. Num texto intitulado "As lições de Frobenius", ele explica que, em 1936, A história da civilização africana foi para ele "um estampido de trovão". A verdade é que, confia ele num outro texto intitulado "Negritude e germanidade II", "todas as ideias difundidas e confusas que circulavam antecipadamente nas nossas cabeças, estudantes, militantes da Negritude, encontraram de repente uma coluna vertebral. As dúvidas que nos habitavam desapareceram instantaneamente" (SENGHOR, 1977, p. 13).

Senghor sempre considerou Frobenius como um reagente, um fermento capaz de ativar o espírito de descoberta ou de acordar e de fortalecer as energias dormentes do homem negro (SENGHOR, 1977, p. 13). É que a visão frobeniosiana de uma "África ainda pura, não contaminada pela influência exterior" (FROBENIUS, 1980, p. 26) aparecia aqui como um alimento capaz de estimular o ardor.

Mas a fascinação que o pensador alemão exerce sobre o poeta da Negritude vem também de uma velha imaginação infantil. É que a imaginação do jovem Senghor era povoada de imagens de heróis germânicos grandes, louros, de olhos azuis mais que os de gauleses. Sem dúvida, esses seres excepcionais eram menos generosos, mas os guerreiros astutos, com coragem audaciosa, encantavam (SENGHOR, 1977, p. 12). No espírito do poeta, a simples evocação do nome "Germano" era suficiente para imaginar a turbulenta tropa de Odin. Vemos aqui que a brutalidade selvagem dos bárbaros seduzia muito o jovem Senghor. Para além disso, o Germânico que fascina tanto Senghor é não só o grosseiro homem das grandes invasões, mas também o homem da ordem, visto que essa qualidade diz respeito à nobreza. Na verdade, Senghor se via como um nobre, um sangue azul!

Há outro traço da alma alemã que atrai o poeta. É a concepção do mundo que inclina para uma "compreensão profunda das coisas" e que fez dos alemães um povo não só de guerreiros, mas também de músicos e de poetas. Sem dúvida, de todos os homens, os alemães são uma das raras nações da terra que conseguiram realizar uma harmoniosa síntese entre a violência mais animalesca e a melodia mais suave, a agressividade selvagem da guerra e a doçura tranquilizante da música.

Ora, Emile Ludwig nos ensina que são as experiências terríveis da vida que permitiram a esses bárbaros conseguir a bela combinação de dois dons antagônicos: o dom da guerra e o dom da música. É, especifica ele, uma vida de riscos que tinha a paz e a doçura como algo desprezível; e "mais tarde, uma existência cujos horrores ultrapassavam a crueldade geral da Idade Média, no meio das aventuras selvagens onde se massacravam os prisioneiros e onde a lei da vingança era exaltada". Tudo isso "ocasionou uma melancolia nostálgica nesses corações 'reprimidos' pela dureza dos chefes e a rigidez do ideal de barbárie" (LUDWIG, 1941, p. 44). Ao final, a música encantadora de Arion conseguiu amolecer o coração dos monstros marinhos, e a lira de Orfeu conseguiu tocar os monstros telúricos. Isso significa que a música e a poesia podiam também afetar "essa nação incurável [...], bárbara, verdadeiramente bestial", "esses porcos e incuráveis imundos meio diabos, meio homens", segundo uma severa apreciação de Luther.

Com Madame de Staël, podemos ir mais longe na descoberta dessa alma romântica, amiga da poesia que fascinava tanto a Negritude. Ela diz que a origem principal da poesia é o terror que inspiram "os fantasmas e os bruxos, resíduos da mitologia nórdica (que) agrada (tanto) não só ao povo, mas também aos homens iluminados" (STAËL, s/d., p. 193). Ora, apesar do rigor imposto pela Inquisição, apesar da repressão das heresias, a poesia, fiel a sua própria natureza, continua a veicular as superstições populares. Aí reside, segundo Madame de Staël, o segredo e a grandeza de toda poesia autêntica. Pois "a poesia não pode ser popular quando ela despreza o que exerce um império irreflexivo sobre a imaginação": os fantasmas, a magia, a bruxaria (STAËL, s/d., p. 193).

Efetivamente, tudo na mística alemã, suas canções, sua poesia nacional, sugere Faust. Nós temos aí a causa última dessa profusão de histórias mágicas, de viagens cósmicas, de astrologia, de sabá de feiticeiros, de luxúria (DABEZIES, 1973, p. 18). Aliás, o cenário cultural e ideológico alemão dessa época mostra uma estreita conjunção entre o romantismo e o mundo dos fantasmas, dos espíritos, das aparições (STIRNER, 1972/1978; BRUNSCHWIG, 1973). É esse mundo encantado que fascinou a "África dos mistérios": uma África que só existia na imaginação dos etnólogos e de seus seguidores da Negritude e da "filosofia banto".

Para voltar a Senghor, podemos dizer com ele mesmo que certamente Napoleão fazia parte também de seus heróis preferidos; mas o poeta não achava o general francês particularmente generoso (SENGHOR, 1977, p. 12). A verdade é que esse "espírito do mundo a cavalo" dos tempos modernos fascinava os cosmopolitas alemães, mas nunca o poeta da Negritude. Abatendo o Sacro Império Germânico – corpo político da alma alem㠖, Napoleão pensava ter realizado, na dor, uma operação de salubridade espiritual e intelectual; ele acreditava ter saído de sua estagnação essa má aluna da Europa que relutava em juntar-se ao grupo das nações civilizadas. Essa violação da alma alemã era insuportável para Senghor. Este homem é certamente o nostálgico dos tempos obscuros, mas ele aparece também como um Negro vingador, que, pela abominação do general francês, quer precisamente mostrar a natureza hedionda do Ocidente da Razão e do Iluminismo que se obstina em destruir o essencial na alma dos povos.

A rebelião mística e a modernização conservadora

Na verdade, Senghor estava em perfeita simbiose com os românticos alemães. Lembremos que esses últimos poderiam aceitar a mecanização radical de seu país; mas a ciência e a técnica os fascinavam, só por razões pragmáticas, estratégicas e militares. É porque, contra os valores espirituais e culturais da modernidade (racionalismo, secularismo, democracia etc.), esses nostálgicos propunham como alternativa o etos pré-moderno. A Alemanha oferece assim uma ilustração perfeita do espírito da modernização conservadora que significa a aceitação da ciência e da tecnologia e a recusa da visão científica do mundo específica à modernidade. Assim não é contraditório para uma nação "irracional" e "eterna" convocar de maneira cínica a razão instrumental para impor suas próprias escolhas espirituais, culturais e políticas – pré-modernas – ao mundo. Assim, a Alemanha do fim do século se prepara ao grande confronto em uma curiosa atmosfera de exuberância tecnológica e industrial e de fervor místico. Com efeito, o país se industrializa e se militariza em ritmo acelerado. Ao mesmo tempo, a Alemanha recusa a modernização social e política através de seus ideólogos como Frobenius.

É interessante ver como essa modernização conservadora influenciou as orientações profundas da Negritude. Pois, o problema da alma negra se colocou num contexto de polêmica contra a linha geral da evolução seguida pelas nações modernas. A afirmação da base dos partidários da Negritude é que as formas antigas e irracionais do ser social e político são só capazes promover uma "mentalidade criadora" e permitir o desenvolvimento do continente negro.

Uma conclusão provisória se impõe aqui: a Deutschheit e a Negerheit coincidem com a conservação de formas caducas e irracionais do ser social. São esses arcaísmos sociais e políticos que glorificam Frobenius e Senghor em suas abordagens da alma negra e da alma alemã.

Quando, na África, se fala de certas formas de "resistência cultural" ao Ocidente, é bom saber a que valores remetem exatamente essa "resistência" e esse "nacionalismo". Geralmente, a "resistência" e o "nacionalismo" correspondem simplesmente à recusa do progresso social e político.

Essa atitude não é inédita na história do continente negro, como mostra o exemplo da defesa do costume, na época de Abomeh, por exemplo. Diante das objurgações dos "amigos do Ocidente" em relação à persistência dos costumes bárbaros (os sacrifícios humanos, por exemplo), a aristocracia escravagista de Abomeh respondeu com um enrijecimento nacionalista e tradicionalista que implicava um retorno ostentatório aos costumes. Ora, esse retorno se traduziu pelas execuções massivas durante os anos 1858-1861. Isso visava a dois objetivos principais: por um lado, ridicularizar a Europa com seus supostos valores de direitos do homem, e, de outro lado, provocar o pavor nos meios dos escravos das plantações e glorificar a monarquia (COQUERY-VIDROVITCH, 1977, p. 166).

As doutrinas da alma negra ou da autenticidade na África contemporânea não sabem como superar esse esquema já clássico na evolução de certos povos que só aceitam os instrumentos técnicos da modernidade e rejeitam seu espírito baseados sobre a razão emancipadora.

Eis então o terreno que os partidos irracionalistas da África e da Alemanha escolheram para dialogar no início e no meio do século XX. A crítica da razão emancipadora é feita sem concessão. Frobenius, por sua parte, faz parte desses ideólogos do Reich, nostálgicos da Idade Média e para quem a República de Weimar, com sua democracia peculiar, constituía um simples "artigo de importação ocidental"; um veneno próprio a destruir o corpo da nação. Para ele, "nossa ideia nacional do Estado desaparece em benefício de uma dominação dos partidos" (FROBENIUS, 1940, p. 26). De todos os "deuses estrangeiros" cuja adoração levou a Alemanha para "pesadas falhas de estilo", o regime de partidos, o parlamentarismo e a república apareciam para Frobenius como os mais abomináveis.

É necessário propor uma explicação global à deriva descrita. Tenho duas hipóteses. A primeira concerne à dificuldade de enfrentar a questão social; a secunda hipótese concerne à cultura da servidão que age a longo prazo.

A questão nacional como substituto à questão social

A África em luta para sua emancipação tinha que resolver ao mesmo tempo muitas questões maiores, umas tão urgentes quanto outras: a questão da libertação nacional, a da unidade nacional e, enfim, as da emancipação social e da afirmação da personalidade cultural. Para fazê-lo, o continente teve dois modelos antagonistas: o modelo alemão e o modelo francês. Ele escolheu instintivamente o modelo que parecia corresponder a sua situação caracterizada pela fragmentação de seus territórios, pela dispersão de suas comunidades humanas e pela diversidade de suas línguas. Impôs-se então à África a ficção tipicamente germânica de uma entidade supraindividual (o espírito do povo, a alma nacional etc.), suscetível de manter juntos os indivíduos e as tribos para construir uma comunidade política orgânica. É dizer que a teoria da alma negra reflete também a forma específica que havia tomado muito cedo a questão nacional.

Mas o que significa em última instância a ficção do espírito do povo ou da alma nacional? Parece-me que o nascimento dessa entidade mística tem algo a ver com a convicção de que a reunião dos homens no seio de uma comunidade política superior não pode ser obtida pela atividade consciente dos indivíduos e pelo trabalho revolucionário das massas populares em movimento, mas imposta de cima por uma força irracional, misteriosa. Georg Lukács já fez este tipo de observação sobre a Alemanha.

Nas nações dominadas, chega-se facilmente a essa mística quando a luta de libertação nacional se afasta de seus objetivos de emancipação social. Sem esses objetivos, a vontade de construir a nação perde sua racionalidade. G. Lukács nos lembra que a racionalidade na qual a história aparece no mundo moderno reflete precisamente a natureza das transformações sociais, políticas e culturais que marcam a evolução de suas nações no contexto de luta pela liberdade e pela unidade nacional; para retomar uma das palavras mais expressivas de Lukács, podemos dizer que as nações democráticas modernas consideram que o Estado, a política do governo é sua obra; nesse sentido, eles exigem a racionalidade de todos os aspectos da vida. Essa racionalidade reflete a razão própria do povo em luta. Pelo contrário, os povos atrasados em termos de modernidade desenvolvem concepções radicalmente opostas. É que a existência da nação é vista como um presente misterioso das forças irracionais e sobrenaturais, ou, pelo menos, do gênio excepcional de alguns homens providenciais.

Já na época da luta de libertação, os futuros Estados africanos adotaram rapidamente a forma de totalidade orgânica para legitimar o reino do partido único, por exemplo. Na África, o pluralismo político e o parlamentarismo eram vistos como os fatores de divisão e de discórdia nacional. Assim, esses Estados nos lembram o órgão descrito por Marx na Crítica do programa de Gotha. Trata-se de um "despotismo militar a armadura burocrática e a blindagem civilizada com um enfeitamento de formas parlamentares, com misturas de elementos feudais e influências burguesas".

A questão nacional como substituto à questão social constitui um impasse absoluto. Ela contradiz a razão emancipadora que repousa sobre a afirmação fundamental segundo a qual é o homem quem faz a história. Autor e ator de sua própria história, o homem não é então escravo nem de sua raça, nem de sua cultura e de sua língua, e menos ainda do curso dos rios, da direção dos canais, de montanhas. Só a questão social permite chegar a essa conclusão que impõe a necessidade de transcendência. Fanon estava plenamente consciente desses problemas.

Falando dos infortúnios da questão nacional (e também do racismo e do tribalismo), Fanon lembrou justamente que as missões fundamentais do combate anticolonialista visavam antes de tudo à abolição do trabalho forçado e dos castigos corporais, o fim das desigualdades salariais e das limitações dos direitos políticos e sociais (FANON, 2002 [1961], p. 146). A chamada razão emancipadora permitia então aos movimentos de libertação ir além do nacionalismo fechado e do chauvinismo para encarar a questão mais global e mais radical da emancipação social e política e, portanto, da democracia. Essa abordagem implicava por consequência que os povos podiam reivindicar o direito absoluto de inovar pela transgressão de suas próprias tradições históricas e culturais (AMIN, 2008, p. 5). Ao contrário da Negritude e da etnofilosofia, a corrente de pensamento que encarnam W. E. B. Du Bois (1999), Césaire (1981, 1989), Fanon (1961), K. Nkrumah (1968) e M. Towa (1971) é baseada sobre a afirmação desse direito fundamental, sinônimo do direito imprescritível de todos os povos à modernidade. Para Marcien Towa, a emancipação sendo o objetivo último dos povos oprimidos, a pior das coisas que estes últimos podem fazer é a restauração da ordem anciã, a conservação de nossa especificidade, o culto da diferença (TOWA, 1971, p. 40). Para este pensador, a única causa do atraso da África reside na sua especificidade, quer dizer, no que diferencia a África da Europa (TOWA, 1971, p. 40). A dupla referência à razão emancipadora e à dialética da história permite Towa encarar o horizonte mais amplo e mais profundo da identidade humana genérica.

Os infortúnios da cultura do servilismo

A questão da cultura do servilismo é muito importante. São o atraso social e econômico e as condições particulares de emergência dos povos colonizados à consciência nacional que complicam, afinal, a realização de um projeto verdadeiramente moderno na África. A tonalidade pré-/antimoderna do pensamento atual dos antigos colonizados é inteligível se nós temos em consideração os problemas cruciais levantados por Albert Memmi (1985 [1957], p. 115); por exemplo, a ideia de que uma das características essenciais do colonialismo consiste em operar a mutilação social e histórica do colonizado. Isto é possível quando o colonialismo afasta o colonizado e o mantém fora das condições objetivas da nacionalidade e da cidadania modernas.

A verdade histórica é que, privado de nação e excluído da cidade, o colonizado não podia nem governar nem votar. Isto foi a razão da carência dos aspectos essenciais da vida social, cívica e nacional. A exclusão da cidadania só podia então se concluir pela vitória da tradição e da religião. Essa vitória implicava: a aglutinação na chocadeira da vida da família, a devoção aos primogênitos do clã, o culto aos espíritos dos ancestrais, o fechamento no círculo cercado de ritos de uma religião formal, o solidarismo, o tribalismo, e, às vezes, o racismo.

A cultura do servilismo proposta por essas estruturas implicava automaticamente o fim do conflito, a repressão da revolta contra a opressão colonial, a desvitalização da luta política. Para os vencidos, só uma vida social mutilada era possível. Essa vida significava a proibição do livre jogo da dinâmica social, o resvalamento do indivíduo nas posições de recuo. O colonizado entorpecido podia então definitivamente inscrever-se no presente e proibir-se de imaginar um horizonte social mais vasto ou de inventar um futuro histórico de liberdade. Então, como um povo entorpecido podia dialogar vigorosamente com os outros povos do mundo?

Ora, discernirmos claramente na Negritude de Senghor a "psicologia do criado pessoal" da qual falava Engels. É essa cultura do servilismo que, no âmbito da teoria da alma negra, foi elevada à dignidade de uma mística social. Para Marcien Towa (1971), o fatalismo da servidão constitui a verdadeira essência do senghorismo. É o irracionalismo (emoção, intuição etc.) que, em Senghor, funda essa moral de criado. Quando ele fala de Negritude, Fanon observa:

[Como] a consciência negra é imanente a si mesma, eu não sou uma potencialidade de algo, eu sou plenamente o que eu sou. Eu não tenho que procurar o universal. Dentro de mim, não existe nenhuma possibilidade. Minha consciência negra não se dá como ausência de algo. Ela é aderente a si mesma (FANON, 1952, p. 109).

Essa consciência imanente, frágil e anêmica que descreve Fanon é o oposto de uma consciência livre. É o resultado de uma longa experiência da servidão. Aristóteles já relacionou a "razão sensitiva" à escravidão. Essa razão castrada e submetida ignora as alturas do universal. É porque ela atola-se nos pântanos do particular. É que, no fundo, o escravo em si é um ser do particular.

Doutrina saída de consciências entravadas, a Negritude recusa toda perspectiva de luta pela emancipação. Ela propõe como únicas saídas possíveis: 1. o combate "do preconceito racial negro contra o preconceito racial branco" (perspectiva de Marcus Garvey);21 21 Sobre esta questão específica, ver. Georges Padmore, Panafricanisme ou Communisme? La prochaine lutte pour l'Afrique. Paris: Présence africaine, 1960. p. 119. 2. a mestiçagem (perspectiva de Senghor e do pós-modernismo/pós-colonialismo); 3. a inserção do negro no Império euro-africano (perspectiva de Senghor que considerava a independência da África como um mito próprio a alimentar um nacionalismo anárquico. Pois, para ele, falar de emancipação ou de independência é "raciocinar com a cabeça para baixo e com os pés no ar": não é raciocinar, segundo o poeta da Negritude, é "colocar um falso problema!"; perspectiva também do pós-colonialismo que só encara a fusão do subalterno no império).

A Negritude teoriza a impotência do homem negro diante das circunstâncias. É nisso que ela antecipa as correntes pós-modernas e pós-colonialistas atuais, em voga na África e nas "Américas negras": Estados Unidos, Brasil, Caribe. Correntes de pensamento específicas da época neoliberal, o pós-modernismo e o pós-colonialismo buscam responder à questão da alteridade, do diálogo das culturas e do lugar da África na globalização.

Mas, para mim, o problema real deve se colocar em termos de alternativa entre, por um lado, o imperativo de desconexão e de retomada da iniciativa histórica, e, por outro lado, a simples adaptação ao mundo que existe e a mestiçagem. Põe-se então na sua brutalidade a questão decisiva, mas raramente abordada, de condições políticas de um diálogo das culturas.

As condições políticas de um diálogo com a Europa: "Acomodação de Atlanta" ou "iniciativa histórica"?

O pós-modernismo e o pós-colonialismo têm um mérito incontestável, o de colocar no centro das suas preocupações a questão essencial das condições políticas do diálogo das culturas através da crítica das grandes narrativas da época moderna: a Razão, o Estado, o progresso, a emancipação etc. Um dos problemas fundamentais que essas doutrinas buscam resolver concerne ao destino cultural das sociedades periféricas na globalização.

A globalização era acusada de uniformizar as culturas. O pós-modernismo e o pós-colonialismo respondem que esse sistema reserva a cada cultura do planeta um destino singular. A globalização era igualmente acusada de consagrar a hegemonia da cultura ocidental. O pós-modernismo e o pós-colonialismo respondem que a nova ordem do mundo multiplica as oportunidades de diálogo entre as tradições culturais.

Mas, uma antiga questão não foi resolvida, a da unidade negativa ou da polarização do mundo. Os filósofos da libertação encaravam claramente a supressão dessa contradição fundamental pela desconexão, a saída do Império, a ruptura dos laços de servidão com o centro capitalista. Essa abordagem implicava a retomada da iniciativa histórica pela periferia, segundo a perspectiva de Aimé Césaire, Kwame Nkrumah, Marcien Towa, Samir Amin. A ideia de cisão, de separação do corpo do Império, visava a um objetivo transcendente, que é a integração dos indivíduos e das nações da África e do Sul em um grande projeto universal comum, na independência, na igualdade e na reciprocidade.

Sublinhemos que o universal aqui visado não trata com a matéria primitiva ou com as essências brutas das culturas. O universal me parece como um químico das culturas que só integra as matérias refinadas, purificadas das tradições. O objeto visado é o núcleo substancial e racional das culturas. Esse núcleo é obtido pelo longo e doloroso trabalho do negativo sobre a substância imediata, primitiva dos costumes, das tradições antigas, dos saberes populares, dos mitos arcaicos, das religiões ancestrais etc.

É o desafio do problema filosófico e cultural da mediação e da transcendência dialética aplicadas à imediatidade das culturas. Ora, a desconexão, a emancipação do corpo do Império implica precisamente um trabalho exigente sobre o si da cultura e da identidade. O objetivo visado é a extração dolorosa do núcleo substancial, que será mais tarde submetido à consciência crítica do Outro e do mundo.

O pós-modernismo e o pós-colonialismo julgam supérfluo esse desvio dialético. Para eles, a peneira dialética aparece como um instrumento perigoso, tirânico. É que, para eles, o trabalho de refinação, de discriminação das tradições culturais dos povos corresponde a um empobrecimento das culturas.

Além disso, o pós-modernismo e o pós-colonialismo são convencidos de que os custos ontológicos e políticos da solução dialética são grandes, porque esta última implica um confronto duplo:

1. a luta violenta contra o Outro. Com efeito, a supressão da unidade negativa do mundo implica um confronto violento com o Outro (o colono, o conquistador);

2. a luta violenta contra o seu. A condição da vitória na luta contra o colono supõe a transgressão de sua própria essência de colonizado e de oprimido. Isso é uma forma de "guerra civil" que opõe a essência de si a si mesmo. Contra essas soluções dolorosas que impõem a luta dialética entre o si e o Outro, o si com o si mesmo, o pós-modernismo e o pós-colonialismo opõem uma abordagem menos contrastante e menos arriscada no duplo plano ontológico e político: a mestiçagem que recebe sua inspiração do velho princípio do compromisso sem mediação.

Este tipo de compromisso imediato com o Outro ocorre sem uma negociação prévia dos termos do acordo. É o sentido último da adaptação das culturas ao vasto mundo e da mestiçagem. Essas questões são bem teorizadas hoje pela antropologia da globalização. O universo imaginado pela "etnografia cosmopolita" ou "macroetnografia"22 22 Cf. Arjun Appadurai, Après le colonialisme. Les conséquences culturelles de la Globalisation. Traduit de l'anglais par Françoise Bouillot. Paris: Payot, 2001. aparece como um universo que já perdeu de sua quebra original; um universo de onde foi suprimido (artificialmente) o antagonismo fundamental entre o Norte opressor e o Sul oprimido, o centro desenvolvido e rico e a periferia subdesenvolvida e pobre; o Ocidente explorador e a África explorada.

O novo mundo fluido, onde as identidades e as culturas circulam livremente, é para os pós-modernistas um campo de oportunidades e um vasto mercado onde identidades, culturas e tradições podem trocar-se como todos os tipos de mercadorias. O pós-modernismo e o pós-colonialismo são uma idealização do universo neoliberal ele mesmo.

Alega-se que, com a livre circulação de homens e de coisas sendo possível nos espaços abertos e infinitos da globalização, o severo constrangimento que pesava anteriormente sobre os povos cai. Segundo o pós-modernismo e o pós-colonialismo, o acesso ao universal e a presença do si no vasto tempo do mundo não exigem mais as identidades e culturas refinadas e purificadas. Diz-se que a identidade e as culturas podem apresentar-se, trocar-se e venderem-se com suas escórias, suas gangas populares, ancestrais, religiosas, míticas. A extração do núcleo substancial e racional não é mais imperativa. A única condição de reconhecimento de uma cultura ou de uma identidade é sua simples existência, na sua imediatidade.

É aqui que a fenomenologia e a hermenêutica desempenham um papel decisivo. Essas doutrinas propõem uma "apreensão intuitiva da especificidade de cada cultura"; essas doutrinas "são convocadas para contestar o universalismo abstrato das regras intemporais dos grandes sistemas" (AMSELLE, 2008, p. 10-11). Estamos aqui na origem de todas as críticas contra a violência do conceito, o terrorismo da razão, o imperialismo da ciência. Rejeitando a mediação do mesmo para outra e aceitando a apreensão intuitiva da especificidade de cada cultura, a globalização aparece como uma imensa feira das essências ou como um gigantesco bazar, com seus objetos heteróclitos, suas culturas barrocas, suas identidades variegadas. Isso explica a multiplicação nos países do mundo das "agências identitárias" (comptoirs identitaires), onde podem se vender e se comprar as matérias-primas de todas as culturas do mundo, reveladas pela etnologia e pelo turismo. É aí o sentido último da diversidade pós-moderna tão celebrada.

Essas questões são muito sutis e exigem um estudo especial. É preciso então nos ater ao essencial, que é a questão das condições políticas do diálogo das culturas que se resume nessa alternativa: 1. a presença e a adaptação ao mundo com todas suas qualidades essenciais, primitivas (a "essência" ou a "identidade" como "Negro", "escravo", "colonizado", "operário", "camponês", "animista" etc.), ou, 2. a resistência ao mundo e a afirmação de seu ser substancial e de sua personalidade histórica, em nome de algumas "verdades tidas por evidentes em si", por exemplo, "que todos os homens foram criados iguais; que eles são dotados por seu criador de certos direitos inalienáveis; que entre estes últimos há a vida, a liberdade e a felicidade".

Essa questão constitui o tema essencial da célebre controvérsia ocorrida no fim do século XIX e no início do século XX entre dois representantes importantes da comunidade negra americana: Booker T. Washington e W. E. B. Du Bois.

Os termos da controvérsia. Um pouco como os partidários da Negritude senghoriana, Book T. Washington acreditava na existência das essências culturais específicas. A partir dessa postura essencialista, ele aceitou a ideia de uma separação racial entre americanos.

Washington nasceu na escravidão em Virgínia de uma mãe negra escrava e de um pai branco, proprietário de escravos. No contexto da guerra civil, os Negros viviam sob a ameaça permanente das organizações terroristas brancas, como o Ku-Klux-Klan.

Convidado a falar em nome de seu povo, Washington produziu muitos tesouros de diplomacia para tranquilizar os liberais brancos e, ao mesmo tempo, evitar dar a impressão de abandonar a causa dos Negros. Durante a abertura da Cotton States Exposição, em 18 de setembro de 1895, em Atlanta, Washington fez um discurso que ficou célebre e que Du Bois batizou de "Acomodação de Atlanta" (DU BOIS, 1999, p. 96).

A mensagem de Washington para tranquilizar os brancos é a seguinte: "Em todas as coisas puramente sociais, podemos ser tão separados quanto os cinco dedos e, no entanto, podemos ser um, como a mão, em todas as coisas essenciais ao progresso mútuo" (DU BOIS, 1999, p. 96).

Essa declaração interveio para completar uma tocante profissão de fé na qual o orador, que falava em nome daqueles de sua raça, jurou fidelidade, prometendo aos mestres lealdade absoluta e disponibilidade indefectível. Segundo as próprias palavras de Washington, os mestres brancos podem estar certos de que, como pelo passado, eles mesmos e suas famílias estarão bem rodeados pelos mais pacientes, mais fiéis e mais honestos cidadãos que o mundo jamais havia visto. Como no passado, esses homens haviam provado sua lealdade aos mestres brancos, ocupando-se de suas crianças, cuidando de seus doentes acamados e acompanhando os falecidos aos seus descansos finais, com as lágrimas nos olhos. Da mesma forma no futuro, o povo negro está pronto para sacrificar sua vida para defender a dos mestres. Washington sublinha enfim a comunidade de interesses econômicos, industriais, comerciais, religiosos, cíveis que ligam as duas raças.

Com foco em questões de raça e de defesa dos interesses econômicos comuns, Washington deslegitima as questões cruciais da igualdade social e da emancipação política. Para ele, tais questões são uma pura loucura porque elas supõem as greves e a revolta dos trabalhadores (WASHINGTON, 2008, p. 190). Segundo Washington: "Os mais sábios entre o meu povo sabem que agitar as questões de igualdade social é a loucura mais extrema. O progresso encarnado pelo desfrute dos privilégios deve resultar de nossos esforços obstinados e não impostos pela força" (WASHINGTON, 2008, p. 192).

Washington preconiza a segregação racial residencial e profissional porque ele está convencido, segundo a palavra de Du Bois, de que a obediência à vontade de uma força majoritária suscitaria pouco a pouco nessa maioridade tal onda de simpatia e tal senso de justiça que os interesses vitais da raça negra seriam satisfeitos em longo prazo.

Washington acredita sinceramente que os interesses vitais das duas raças são inseparáveis e mesmo complementares. A partir dessa lógica, a resistência política e social à opressão torna-se inútil. Aliás, Washington sublinha o perigo de um confronto com os brancos: para os Negros, afirma ele, tal confronto só pode levar a um desastre, dada sua inferioridade numérica. Eis aí por que ele preconiza para eles a acomodação e a cooperação econômica bem mais que a resistência à injustiça e a reivindicação dos direitos políticos.

W. E. B. Du Bois rejeita energicamente a "Acomodação de Atlanta". Ele lembra, antes de tudo, que os pontos de vista de Washington obedecem à velha inclinação negra para a acomodação e para a submissão. Em seguida, ele critica o "economismo" miserável de Washington, que prega aos dominados o evangelho do trabalho e do dinheiro, ignorando assim os objetivos mais nobres da vida e da cidadania. Washington aceita a inferioridade alegada das nações negras, diz Du Bois; além disso, o mesmo Washington recusa aos Negros o direito de reivindicar sua humanidade e sua cidadania, ao mesmo tempo em que ele preconiza uma política de submissão.

Se apoiando nas lições de história dos Estados Unidos dessa época, Du Bois mostra que uma autoestima cheia de coragem é infinitamente melhor que as pequenas vantagens econômicas concedidas aos Negros; para ele, um povo que renuncia à luta não é digno de ser contado entre as nações civilizadas. Para Du Bois, homens como Book T. Washington acreditam que a submissão seja a única condição para a sobrevivência dos Negros; eles exigem que a nação negra renuncie às questões políticas, aos direitos cívicos e à educação universitária para que ela concentre suas energias na educação industrial, na acumulação pessoal dos ricos e no compromisso com os opressores. Du Bois coloca então a questão decisiva:

Será possível e provável que nove milhões de homens possam efetivar um progresso real em termos econômicos, estando privados de direitos políticos, reduzidos a uma casta servil, tendo apenas uma oportunidade extremamente insignificante de desenvolver seus homens excepcionais? Se a história e a razão derem uma resposta clara a tais perguntas, esta será um enfático não (WASHINGTON, 2008, p. 108).

Segundo Du Bois, Washington enfrenta um tríplice paradoxo:

1. Ele está se esforçando nobremente para fazer, de artesãos negros, homens de negócios e proprietários; mas é absolutamente impossível, sob os modernos métodos competitivos, que trabalhadores e proprietários defendam seus direitos e existam sem o direito de voto; 2. Ele insiste na importância da economia e da autoestima, mas, ao mesmo tempo, aconselha uma submissão silenciosa à inferioridade cívica capaz de minar, a longo prazo, o brio de qualquer raça; 3. Ele defende a escolaridade básica e o treinamento industrial, e deprecia instituições de ensino superior; mas nem as escolas públicas nem o próprio Tuskegee poderiam permanecer abertos um só dia se seus professores não tivessem sido instruídos em escolas superiores negras ou preparados por aqueles que ali se formaram (WASHINGTON, 2008, p. 108).

O problema colocado por essa controvérsia esclarecedora é então o da escolha entre dois modos contraditórios de presença no mundo: de um lado, a acomodação ao Outro (no caso da espécie, ao Ocidente opressor) e, de outro lado, a retomada da iniciativa histórica. Hoje, a virada pós-moderna e pós-colonial mostra a atualidade dessa questão, porque, como Booker T. Washington e Léopold Sédar, ele preconiza a acomodação e a submissão, com o objetivo de selar definitivamente a impotência do homem negro. Minha perspectiva – como a de Nkrumah, Fanon, Césaire, Cheikh Anta Diop, Marcien Towa, Charles Romain Mbele etc. – é a retomada da iniciativa histórica e a saída do império para edificar um polo autônomo de potência capaz de dialogar na perfeita igualdade com os outros povos do mundo.

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Texto recebido em 29 de agosto de 2012.

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  • ______. Identité et transcendance Paris: L'Harmattan, 2011.
  • UNESCO. Histoire Générale de l'Afrique. v. 2, Afrique Ancienne. Paris: UNESCO, 1981.
  • VARI-LAVOISIER, I. Une autre guerre de libération. Le Monde Diplomatique, n. 671, février 2010.
  • VOLTAIRE. Essai sur les mœurs et l'esprit des nations et sur les principaux faits de l'histoire depuis Charlemagne jusqu'à Louis XIII. t. 2. Paris: Garnier-Flammarion, 1963.
  • WASHINGTON, Booker T. Up from Slavery: ascension d'un esclave émancipé. Traduit de l'anglais par Jeanne-Marie Vazelle. Paris: Nouveaux Horizons, 2008.
  • WICKRAMASIGHE N. L'histoire en dehors de la nation. In: Diouf, Mamadou. L'Historiographie indienne en débat: colonialisme, nationalisme et sociétés postcoloniales. Paris: Karthala/Amsterdam: Sephis, 1999.
  • 1
    Tradução de Roberto Jardim da Silva.
  • 2
    "Discours de M. Nicolas Sarkozy, Président de la République française, le 26 juillet 2007 à Dakar. Contexte, enjeux et non-dits". In: Sarkozy, la controverse de Dakar, Cours Nouveau.
    Revue Trimestrielle de Stratégie et de Prospectrive, Revisiting Iussues, Repensar a África Hoje, n. 1-2, maio-oct. 2008, p. 80-81.
  • 3
    Chegando ao Peru, F. Pizarro e suas tropas não pareciam representar uma ameaça. Pelo contrário, a lenda local dizia que o deus Viracocha voltaria sobre a terra pelo mar para trazer a paz e a prosperidade depois de décadas de sofrimento. Atahualpa tem Pizarro como um deus mítico. É, então, de um encontro que deveria ser amigável que os Incas foram capturados. Atahualpa expressa seu espanto, mas o Imperador ignorava os objetivos estúpidos do Espanhol. Ele foi executado.
  • 4
    Ver, sobre esse assunto, as observações de Jean-Paul Doguet sobre os trabalhos de Louis-Sala Molins,
    Les Misères des Lumières. Paris: Robert Laffont, 1992; e de Christian Delacampagne,
    Une Histoire de l´esclavage. Paris: Le Livre de Poche, 2002. Jean-Paul Doguet, in Condorcet,
    Réflexions sur l´esclavage des Nègres, "Présentation", p. 10-11.
  • 5
    Ver, por exemplo, Raymond Aron,
    Plaidoyer pour l´Europe décadente. Paris: Robert Laffont, 1977; Jacques Marseille,
    Empire colonial et capitalisme français. Histoire d´un divorce. Paris: Albin Michel, 2005.
  • 6
    Cf. El Hadj Ibrahima Diop. Lieux d'écritures et compréhension différenciées de l'Afrique dans l'anthropologie de Kant et de G. Forster.
    Ethiopiques, n. 80, 1er semestre 2008.
  • 7
    É o destino normal dos homens cuja atividade essencial baseia-se no uso de seus corpos para o benefício de outra pessoa.
  • 8
    Olympe de Gouges,
    L'esclavage des Noirs ou l´heureux naufrage (1786). In: Francophe Slavery. Disponível em: <
  • 9
    Olympe de Gouges. In: Francophone Slavery, "Réflexions sur les hommes nègres" (1788). Disponível em: <
  • 10
    A inspiração desta parte vem do livro de Marcien Towa,
    Identité et Transcendance. Paris: L'Harmattan, 2011.
  • 11
    Cheikh Anta Diop,
    Nations nègres et culture. Paris: Présence Africaine, 1954;
    L'Unité culturelle de l'Afrique noire, (1959), Paris: Présence Africaine, 1982;
    Civilisation ou barbarie?. Paris: Présence Africaine, 1981. Théophile Obenga,
    La Philosophie africaine de la période pharaonique. 2780-330 avant notre ère. Paris: L'Harmattan, 1990.
  • 12
    A Bíblia faz de Caim o ancestre da humanidade dando origem à civilização urbana (Henok), com seus prazeres e suas comodidades. Caim é também o ancestral dos ferreiros especializados no trabalho do cobre e do ferro. Tubal-Caïn, que designa o criador das profissões do forjamento do metal, remete ao nome de um povo do Norte, Tubal, país dos metais (Gn 10-2) e ao ferreiro (Caim). Tubal-Caïn tem uma irmã, Naama (a "linda"), a "mais velha", provável nome dada às "prostitutas", segundo uma versão da
    Bíblia de Jerusalém.
  • 13
    Cf. Jacques Pirenne,
    Les Grands courants de l'histoire universelle. T. 1, Des origines à l'Islam. Paris: Éditions de la Baconnière/Éditions Albin Michel, 1959, p. 65. Cf. também E. Drioton et J. Vandier,
    Les peuples de l'Orient Méditerranéen. Paris: PUF, 1952. p. 343-346.
  • 14
    "Você colocou cada um em seu lugar e você faz o que lhes é necessário; cada um tem seu alimento e seus dias são calculados". Mas se o espírito universal teve o cuidado de diferenciar os povos pela língua e pela pele – "Suas línguas falam diversamente como é diferente seu aspecto; sua pele é diferente, pois, você distinguiu os povos" –, ele assegura a todos, egípcios e os estrangeiros, uma igual proteção. Pois, embora diferentes, todos os homens são parecidos e iguais: "Todos os países distantes, você cuida deles", criando milhões de seres, Deus quis fazer de todos os irmãos, os cidadãos de um mesmo mundo, tão diversos sejam eles. É o sol em si que faz sua unidade, pois "cidades, localidades, campos, caminhos e rios – cada olho te vê de frente enquanto o sol do dia sobre a terra". Cf. Citado por Adolf Erman,
    O Egito dos faraós, traduzido do alemão por Henri Wild. Paris: Payot, 1939. p. 198-199.
  • 15
    Version portugaise, p. 95.
  • 16
    Trad. M. Rouché, Livro XX.
  • 17
    Livre VII, Chap. II., trad. D'Edgar Quinet.
  • 18
    Trad. E. Quinet.
  • 19
    "Ô filhos de Dédale, mensageiro do destino, que instrumentos estão entre suas mãos para espalhar a felicidade sobre a terra, por meios humanos e gloriosos! E quantas vezes o amor insolente e interesseiro pelo ganho não os conduziu nos caminhos opostos!", Livro VII, trad. E. Quinet.
  • 20
    Livro VIII, trad. E. Quinet.
  • 21
    Sobre esta questão específica, ver. Georges Padmore,
    Panafricanisme ou Communisme? La prochaine lutte pour l'Afrique. Paris: Présence africaine, 1960. p. 119.
  • 22
    Cf. Arjun Appadurai,
    Après le colonialisme. Les conséquences culturelles de la Globalisation. Traduit de l'anglais par Françoise Bouillot. Paris: Payot, 2001.
  • Publication Dates

    • Publication in this collection
      11 Apr 2013
    • Date of issue
      Mar 2013

    History

    • Received
      29 Aug 2012
    • Accepted
      28 Sept 2012
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